hare krishna hare krishna krishna krishna hare hare hare rama hare rama rama rama hare hare

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

     

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"

(Original Sem "Correções")

de

Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya

      

Volume 2

     

     

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya

Fundador Acharya da Sociedade Internacional
para a Consciência de Krishna

 

Jaya Prabhupada! Jaya Prabhupada! Jaya Prabhupada!

Todas as Glórias à Sua Divina Graça Visvavarenya Om Vishnupada Paramahamsa Parivrajakacharya Ashtottara-shata Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Srila Prabhupada Thakur Mahashaya.

 

     

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Quinze

Explicação do Verso Atmarama no Srimad Bhagavatam

O Senhor Chaitanya em seguida explicou um verso muito famoso conhecido como verso Atmarama, que aparece no Srimad Bhagavatam como se segue:

atmaramas ca munayo
nirgrantha apy urukrame
kurvanty ahaitukim bhaktim
ittham-bhuta-guno harih

Esse verso indica aqueles que são almas liberadas e são plenamente auto-satisfeitos eventualmente se tornarão devotos do Senhor. Essa injunção é destinada especialmente para os impersonalistas, porque os impersonalistas não têm informação sobre a Suprema Personalidade de Deus. Eles tentam permanecer satisfeitos com o Brahman impessoal, mas Krishna é tão atraente e tão poderoso que Ele atrai suas mentes. Esse é o significado desse verso.

Esse verso foi explicado previamente para um grande Vedantista conhecido como Sarvabhauma Bhattacharya. Depois de ter aulas do Senhor Chaitanya, Sanatana Goswami se referiu a esse incidente e rogou ao Senhor para explicar novamente o verso Atmarama. Kaviraja Goswami, o autor do Chaitanya Charitamrita, ao apreciar a explicação do Senhor sobre o verso Atmarama, também glorificou o Senhor Chaitanya em suas preces. Ao cair estendido nos pés do Senhor Chaitanya, Sanatana Goswami pediu-Lhe para explicar o verso que tinha explicado anteriormente para Sarvabhauma Bhattacharya. Sanatana explicou sua ânsia para ouvir a mesma explicação pois poderia ficar iluminado. Assim solicitado por Sanatana, o Senhor respondeu: "Eu não entendo porque Sarvabhauma Bhattacharya apreciou tanto a Minha explicação. Quanto a Mim, Eu nem mesmo lembro o que disse para ele. Mas porque Você Me pediu isso, Eu tentarei, com a ajuda de sua associação, explicar do que Eu possa Me lembrar". Assim o orador e a audiência estão muito intimamente conectados; o orador é iluminado pela presença da audiência. O orador, ou mestre, pode falar muito bem sobre assuntos transcendentais perante uma audiência entendedora; por isso o Senhor Chaitanya disse que Ele não sabia como explicar o verso em sânscrito mas porque Ele estava na associação de Sanatana, Ele tentaria explicá-lo.

O Senhor então continuou a apontar que existem onze itens no verso Atmarama: (1) atmaramah, (2) ca, (3) munayah, (4) nirgranthah, (5) api, (6) urukrame, (7) kurvanti, (8) ahaitukim, (9) bhaktim, (10) ittham-bhuta-gunah, (11) harih. O Senhor então começou a explicar cada e todos esses itens. Sobre a palavra atmarama, o Senhor explicou que a palavra atma é usada para indicar: (1) a Suprema Verdade Absoluta, (2) o corpo, (3) a mente, (4) esforço, (5) convicção, (6) inteligência, e (7) natureza. A palavra arama significa desfrutador; portanto qualquer um que sente prazer no cultivo do conhecimento desses sete itens é conhecido como atmarama. O Senhor então explicou sobre os diferentes tipos de atmaramas, ou transcendentalistas. Sobre a palavra munayah, ou muni, aqueles que são grandes pensadores são chamados munis. Às vezes a palavra muni também é aplicada para uma pessoa que é muito grave. Grandes sábios, grandes pessoas austeras, grandes místicos e intelectuais eruditos também são chamados munis.

A próxima palavra, nirgrantha, indica liberdade do cativeiro da ilusão. Nirgrantha também significa "Aquele que não tem nenhuma conexão com injunções espirituais". Grantha significa escrituras reveladas, e nir é um afixo que é usado para significar "nenhuma conexão", "constrói", e também "proíbe". Existem muitas instruções para realização espiritual, mas pessoas que não têm nenhuma conexão com essas injunções das escrituras também são conhecidas como nirgrantha. Existem muitas pessoas que são insensatas, de baixo nascimento e malcomportadas e que não têm nenhuma entrada dentro das escrituras reveladas e injunções, e por isso são chamadas nirgrantha. Porque grantha também é usada para o propósito de coletar riquezas, a palavra nirgrantha também indica homem pobre, desprovido de todas riquezas, que tenta coletar riquezas.

A palavra urukrama é usada para indicar uma pessoa altamente poderosa. A palavra krama também é usada para indicar o ato de dar passos, e a palavra urukrama indica aquele que pode dar passo em frente muito longe. O maior passo em frente foi dado pelo Senhor Vamanadeva, que cobriu o universo inteiro com dois passos. Assim a palavra urukrama indica o Supremo Senhor Vamanadeva. Esse feito extraordinário do Senhor Vamanadeva é assim explicado no Srimad Bhagavatam (2.7.40).

visnor nu virya-gananam katamo 'rhatiha
yah parthivany api kavir vimane rajamsi
caskambha yah sva-ramhasaskhalata tr-prstham
yasmat tri-samya-sadanad uru-kampayanam

"Ninguém pode estimar as potências inconcebíveis do Senhor Vishnu. Mesmo se alguém conseguir contar o número de combinações atômicas dentro deste mundo material, ele ainda assim não pode contar as diferentes energias do Supremo Senhor. Como Vamanadeva, o Senhor foi tão poderoso que simplesmente por dar um passo em frente Ele cobriu o universo inteiro desde Brahmaloka abaixo até Patalaloka".

As energias inconcebíveis do Senhor estão espalhadas pela criação inteira. Ele é todo-penetrante, e por Sua energia Ele sustenta todos os sistemas planetários, mesmo assim através de Sua potência de prazer Ele permanece situado em Sua morada pessoal conhecida como Goloka. Pela expansão de Sua opulência, Ele está presente em todos planetas Vaikuntha como Narayana. Por expandir Sua energia material, Ele cria inumeráveis universos com inumeráveis planetas dentro deles. Por isso ninguém pode estimar as atividades maravilhosas do Supremo Senhor, e por isso o Supremo Senhor é conhecido como urukrama, o ator maravilhoso. No dicionário Visvaprakasha, a palavra krama é definida como "uma exposição virtuosa de energias", e também "dar passos em frente muito rapidamente".

A palavra kurvanti é usada para significar "trabalhar para outros". Existe uma outra palavra similar a essa que é usada quando as atividades da pessoa são feitas para sua própria satisfação sensual, mas a palavra kurvanti é usada quando atividades são executadas para a satisfação do Supremo. Assim nesse verso a palavra só pode indicar prestar serviço transcendental para o Senhor.

A palavra hetu é usada para indicar a razão ou causa. Geralmente pessoas ficam engajadas em atividades transcendentais por três razões: algumas querem felicidade material, algumas querem perfeição mística e algumas querem liberação do cativeiro material. No que diz respeito a desfrute material, existem tantas variedades que ninguém pode enumerá-las. Sobre perfeições no poder místico, existem dezesseis, e sobre tipos de liberação do cativeiro material, existem cinco. O estado de existência onde todas essas variedades de desfrute são conspícuas por sua ausência se chama ahaituki. A qualificação ahaituki é especialmente mencionada porque pelo serviço ahaituki do Senhor, pode-se alcançar o favor do Senhor.

A palavra bhakti pode ser usada em dez modos diferentes. Desses dez, existe sadhana-bhakti, ou serviço devocional ocupacional. Os outros nove são chamados prema-bhakti, amor do Supremo. Aqueles que estão situados na posição neutra alcançam perfeição até amor do Supremo. Similarmente, aqueles que estão situados na relação de senhor e servo alcançam amor do Supremo até o estágio de apego. Aqueles que estão relacionados em amizade alcançam amor de Deus até o ponto da fraternidade. Aqueles que estão em amor com Deus como Seus pais são elevados até o ponto da emoção transcendental. Mas somente aqueles que estão relacionados com o Supremo em amor conjugal podem experimentar os êxtases mais elevados. Assim existem diferentes significados para a palavra bhakti.

O Senhor depois explicou os diferentes significados de ittham-bhuta-guna. Ittham bhuta indica prazer transcendental pleno perante o qual o prazer transcendental conhecido como brahmananda se torna igual palha. No Hari-bhakti-sudhodaya (14.36), um devoto diz:

tvat-saksat-karanahlada-
visuddhabdhisthitasya me
sukhani gospadayante
brahmany api jagad guro

"Meu Senhor, ó Supremo, simplesmente por entendê-Lo ou vê-Lo, o prazer que nós obtemos é tão grande que o prazer de brahmananda se torna insignificante". Em outras palavras, o prazer derivado por entender Krishna como Ele é - como o todo-atrativo reservatório de todos os prazeres e o reservatório de todo prazer - que dá sabores com todas as qualificações transcendentais - atrai a pessoa a se tornar Seu devoto. Em virtude dessa atração, a pessoa pode abandonar as atividades lucrativas e todos esforços por liberação e pode até mesmo abandonar o desejo intenso de sucesso no poder do yoga místico. A atração de Krishna é tão intensa que se pode perder o respeito por todos os outros meios de auto-realização e simplesmente se render à Suprema Personalidade de Deus.

O Senhor também explicou a palavra guna em todos os seus diferentes significados. Guna indica as qualidades transcendentais ilimitadas de Krishna, primeiramente Sua forma sac-cid-ananda. Em Seu conhecimento bem-aventurado transcendental e eternidade, Ele é plenamente perfeito, e Sua perfeição é incrementada quando Ele é controlado pela atenção de Seu devoto. Deus é tão bom e misericordioso que Ele pode entregar Ele mesmo em troca do serviço devocional do devoto. Suas qualidades transcendentais são tais que a perfeição de Sua beleza, Sua perfeita reciprocidade de amor entre Ele mesmo e Seus devotos, e o sabor de Suas qualidades transcendentais atraem diferentes tipos de transcendentalistas e almas liberadas. Por exemplo, Ele atraiu a mente de Sanaka Kumara simplesmente pelo aroma que emanava das flores oferecidas a Ele. A mente de Shukadeva Goswami foi atraída pelos passatempos transcendentais do Senhor Krishna, e as mentes das donzelas de Vrindavana foram atraídas pela Sua beleza pessoal. A atenção de Rukmini foi atraída pelas Suas características corpóreas e qualidades transcendentais, e a mente da deusa da fortuna foi atraída por Seu tocar de flauta e outras características transcendentais. O Senhor Krishna atrai as mentes de todas meninas jovens e das senhoras idosas por Suas atividades infantis. Ele também atrai a mente de Seus amigos por Suas atividades amigáveis. Quando Ele apareceu em Vrindavana, Ele atraía até mesmo os pássaros, animais selvagens, árvores e plantas. De fato, todos ficaram atraídos em amor e afeição por Krishna.

A palavra hari tem diferentes significados, dos quais dois são principais. Hari significa que Ele leva embora todas as coisas não auspiciosas da vida do devoto e que Ele atrai a mente do devoto por lhe conceder amor transcendental do Supremo. Krishna é tão atraente que qualquer um que pode se lembrar Dele de uma forma ou de outra fica livre dos quatro tipos de misérias materiais. O Senhor dá atenção especial para Seu devoto e bane as várias atividades pecaminosas do devoto, que são pedras no caminho para o avanço do serviço devocional. Isso se chama arrancar pela raiz a influência da ignorância. Simplesmente por ouvir sobre Ele, desenvolve-se amor por Ele. Essa é a dádiva do Senhor. Por um lado Ele leva embora coisas não auspiciosas, e por outro lado Ele concede as coisas mais auspiciosas. Esse é o significado de hari. Quando a pessoa é desenvolvida no amor do Supremo, seu corpo, mente e tudo mais estão atraídos pelas qualidades transcendentais do Senhor. Tal é o poder das atividades misericordiosas e qualidades transcendentais de Krishna. Ele é tão atraente que por causa do apego transcendental, um devoto abandonará todos os quatro princípios da vida espiritual - religiosidade, desenvolvimento econômico, regulação do prazer sensual e salvação.

As palavras api e ca são advérbios e podem ser usadas virtualmente para qualquer propósito. A palavra ca, ou "e", pode render sete leituras diferentes para a construção inteira.

O Senhor assim estabeleceu a importância das onze palavras no verso Atmarama, e então Ele começou a explicar o significado de cada item como se segue. A palavra brahman indica o maior em todos aspectos. O Senhor é o maior em todas as opulências. Ninguém pode excedê-Lo em riqueza, poder, fama, beleza, conhecimento e renúncia. Assim a palavra brahman indica a Suprema Personalidade de Deus, Krishna. No Vishnu Purana (1.12.57) a palavra brahman é dada para indicar o maior de todos; o Supremo Senhor é o maior, e não há limite à Sua expansão como o maior. Alguém pode conceber sobre a grandeza do Brahman, mesmo assim essa grandeza cresce de tal modo que ninguém pode estimar quão grandioso Ele é na realidade.

A Suprema Personalidade de Deus é realizada em três aspectos, mas todos eles são um e o mesmo. A Verdade Absoluta, a Suprema Personalidade, Krishna, é perpétuo. No Srimad Bhagavatam (2.9.33) é dito que Ele existe antes da manifestação deste mundo cósmico, que Ele existe durante sua continuação, e que Ele continua a existir depois de sua aniquilação. Portanto Ele é a alma de tudo grandioso. Ele é todo-penetrante e todo-testemunha, e Ele é a forma suprema de tudo.

Existem três tipos diferentes de processos transcendentais mencionados na literatura Védica pelos quais alguém pode entender e alcançar essa perfeição suprema da Verdade Absoluta. Eles são chamados o processo do conhecimento, o processo do yoga místico, e o processo do serviço devocional. Os seguidores desses três processos realizam a Verdade Absoluta em três aspectos diferentes. Aqueles que seguem o processo do conhecimento O realizam como Brahman impessoal; os que seguem o processo de yoga O realizam como a Superalma localizada; e aqueles que seguem o processo de serviço devocional O realizam como a Suprema Personalidade de Deus, Sri Krishna. Em outras palavras, apesar da palavra Brahman indicar Krishna e ninguém mais, ainda assim, de acordo com o processo que é seguido, o Senhor é realizado em três aspectos diferentes.

No que diz respeito a serviço devocional, existem duas divisões. No começo há vidhi-bhakti, ou serviço devocional com princípios reguladores. No estágio mais elevado há raga-bhakti, ou serviço devocional em amor puro.

A Suprema Personalidade de Deus é Verdade Absoluta, mas Ele é manifestado pelas expansões de Suas diferentes energias também. Aqueles que seguem os princípios reguladores do serviço devocional ultimamente alcançam os planetas Vaikuntha no mundo espiritual, mas aquele que segue os princípios do amor em serviço devocional alcança a morada suprema, o planeta mais elevado no mundo espiritual conhecido como Krishnaloka ou Goloka Vrindavana.

Transcendentalistas podem ser divididos em três categorias. A palavra akama se refere àquele que não tem quaisquer desejos materiais. Moksa-kama se refere àquele que procura liberação das misérias materiais, e sarva-kama se refere àquele que tem o desejo material de desfrutar. O transcendentalista mais inteligente abandona todos os outros processos e se dedica no serviço devocional do Senhor, mesmo embora ele possa ter muitos desejos. Não é por nenhum tipo de atividade transcendental - nem ação lucrativa, nem o cultivo de conhecimento, nem o cultivo de yoga místico - que uma pessoa pode alcançar a perfeição mais elevada sem adicionar um toque de serviço devocional. Todavia para serviço devocional, todos os outros processos transcendentais são justamente iguais a tetas no pescoço de um bode. As tetas no pescoço de um bode podem ser ordenhadas, mas não suprirão leite. Se é para alguém obter perfeição real de seu processo, ele tem que adotar o serviço devocional de Krishna. No Bhagavad-gita está afirmado:

catur-vidha bhajante mam
janah sukrtino 'rjuna
arto jijnasur artharthi
jnani ca bharatarsabha

"Ó melhor dos Bharatas (Arjuna), quatro tipos de pessoas piedosas prestam serviço devocional a Mim; o aflito, o que deseja riqueza, o inquisitivo, e aquele que procura conhecimento do Absoluto" (Bg. 7.16).

Quando esses quatro tipos de pessoas acumulam atividades piedosas, elas vêm para o serviço devocional do Senhor. Dessas quatro, aqueles que estão aflitos e aqueles que desejam riqueza são chamados devotos com desejos, enquanto os outros dois, o inquisitivo e o buscador do conhecimento, são buscadores da liberação. Porque eles adoram Krishna, são considerados muito afortunados. No devido curso do tempo, se eles abandonarem todos desejos e se tornarem devotos puros do Supremo Senhor, podem ser considerados os mais afortunados. Tais iniciantes afortunados podem se desenvolver somente na associação de devotos puros do Senhor Krishna. Quando alguém se associa com devotos puros, ele se torna um devoto puro ele mesmo. Isso é confirmado no Srimad Bhagavatam (1.10.11):

sat-sangan mukta-duhsango
hatum notsahate budhah
kirtyamanam yaso yasya
sakrd akarnya rocanam

"Uma pessoa que é realmente inteligente é capaz - pela associação com devotos puros - de ouvir sobre o Senhor Krishna e Suas atividades". Essas atividades são tão atraentes que quando alguém ouve sobre elas, ele não abandona sua associação com o Senhor.

Se não for pela associação de devotos puros, toda outra associação é kaitava, ou enganação. Isso é confirmado no Primeiro Canto do Srimad Bhagavatam onde está afirmado que todos processos de enganação que obstruem realização transcendental devem ser jogados fora. Pelo Srimad Bhagavatam pode-se entender realidade como ela é, e tal entendimento ajuda a pessoa a transcender os três tipos de misérias materiais. O Srimad Bhagavatam é compilado pelo grande sábio, Vyasadeva, e é uma obra que sai de sua experiência madura. Por entender o Srimad Bhagavatam e prestar serviço devocional, pode-se capturar imediatamente o Supremo Senhor dentro do seu coração.

O Senhor Chaitanya então explicou que a palavra projjhita significa "desejo por liberação". Um grande comentarista explicou que desejo por liberação é o maior obstáculo obstrutivo no caminho da realização de Deus. De uma forma ou de outra, se alguém vem para Krishna e começa a ouvir sobre Ele, Krishna é tão bom que Ele lhe concede Seus pés de lótus como um centro. Por ter um ponto focal assim, um devoto ou transcendentalista esquece tudo e se dedica no serviço devocional do Senhor. Quando alguém vem para o Senhor em serviço devocional, ou em Consciência de Krishna plena, a recompensa é o próprio Senhor Ele mesmo. Uma vez dedicado para o Supremo, a pessoa nunca mais pede por nada, como faz o homem aflito e aquele que deseja posses materiais. O método do serviço devocional, o serviço em si, associação dos devotos puros e a misericórdia sem causa do Senhor tudo age tão maravilhosamente que a pessoa pode abandonar todas atividades e se tornar absorta em Krishna, mesmo se estiver aflita, na falta de posses materiais, inquisitiva ou for realmente uma pessoa sábia que cultiva conhecimento.

Em resumo, Krishna é o significado por trás de todas palavras no verso Atmarama. Até esse ponto o Senhor Chaitanya falou somente a introdução do verso Atmarama. Depois Ele explica sua posição real.

No cultivo do conhecimento existem dois tipos de transcendentalistas. Um deles adora o Brahman impessoal, e o outro deseja liberação. Porque monistas adoram o aspecto impessoal do Brahman, eles são por isso chamados de adoradores do Brahman. Esses adoradores do Brahman são mais ainda divididos em três categorias: o neófito, aquele que está absorto na realização Brahman, e aquele que se realizou realmente como Brahman. Se serviço devocional for adicionado, o conhecedor do Brahman pode então se tornar liberado; caso contrário não existe nenhuma possibilidade de liberação. Qualquer um que está plenamente dedicado no serviço devocional em Consciência de Krishna é entendido como já realizado em Brahman. Serviço devocional é tão poderoso que a pessoa fica atraída por Krishna mesmo da plataforma de adoração do Brahman. O Senhor concede ao devoto a perfeição de um corpo espiritual, e ele se dedica eternamente no serviço transcendental de Krishna. É quando o devoto entende e fica atraído pelas qualidades transcendentais de Krishna que ele sinceramente se dedica no serviço devocional. Por exemplo, os quatro Kumaras e Shukadeva Goswami eram liberados desde o início, mesmo assim em sua vida mais tarde eles ficaram atraídos pelos passatempos de Krishna e se tornaram devotos. Sanaka Kumara ficou atraído pelo aroma das flores oferecidas para Krishna, e os outros Kumaras ficaram atraídos pelas qualidades transcendentais do Senhor e assim se dedicaram no Seu serviço devocional. Os nove místicos mencionados no Décimo Primeiro Canto do Srimad Bhagavatam entende-se que eram transcendentalistas de nascimento em virtude de ouvirem sobre as qualidades transcendentais de Krishna faladas por Brahma, Senhor Shiva e Narada.

Às vezes alguém fica atraído por Krishna e Suas qualidades transcendentais simplesmente por olhar para as belas características de Seu corpo transcendental, nesse caso ele abandona o desejo por liberação e se dedica no Seu serviço devocional. O devoto lamenta sua perda de tempo no assim chamado cultivo do conhecimento e se torna um devoto puro do Senhor.

Existem dois tipos de almas liberadas que têm corpos materiais: a alma liberada por serviço devocional e a alma liberada por cultivo do conhecimento. A alma liberada no serviço devocional, atraída pelas qualidades transcendentais de Krishna, torna-se mais e mais elevada, enquanto as que se dedicam à especulação seca e simplesmente cultivam conhecimento sem devoção caem por causa de suas muitas ofensas. Isso é confirmado no Srimad Bhagavatam (10.2.32) onde está afirmado:

ye 'nye 'ravindaksa vimukta-maninas
tvayy asta-bhavad avisuddha-buddhayah
aruhya krcchrena param padam tatah
patanty adho 'nadrta-yusmad-anghrayah

"Ó Senhor, a inteligência daqueles que se acham liberados mas não têm nenhuma devoção não é pura. Mesmo embora eles se elevem até o ponto mais elevado de liberação por meio de penitências severas e austeridade, eles com certeza cairão novamente dentro desta existência material, porque eles não se abrigam sob Seus pés de lótus". Isso também é confirmado no Bhagavad-gita:

brahma-bhutah prasannatma
na socati na kanksati
samah sarvesu bhutesu
mad-bhaktim labhate param

"A pessoa que está situada transcendentalmente, imediatamente realiza o Brahman Supremo. Ela nunca lamenta nem deseja ter nada; é igualmente disposta com todo ser vivo. Nesse estado, ela alcança serviço devocional puro a Mim" (Bg. 18.54).

Assim aquele que está realmente situado na realização Brahman não tem razão para lamentar ou desejar. Ele é igual para todos e assim é elegível para serviço devocional. Isso também é aceito por Bilvamangala Thakura, que, mais tarde em sua vida, lamentou: "Eu estava situado como um monista a fim de me tornar uno com o Supremo, mas de alguma forma ou outra eu contactei um menino travesso e me tornei Seu eterno servidor". Em outras palavras, aqueles que alcançam auto-realização pela execução do serviço devocional obtêm um corpo transcendental, e, atraídos pelas qualidades transcendentais de Krishna, dedicam-se plenamente no serviço devocional puro.

Qualquer um que não está atraído por Krishna é entendido como ainda sob o encanto da energia ilusória (maya), todavia aquele que tenta ser liberado pelo processo do serviço devocional é realmente liberado do encanto de maya. No Décimo Primeiro Canto do Srimad Bhagavatam há muitos exemplos registrados de devotos que se tornaram liberados nesta vida simplesmente por se dedicarem no serviço devocional.

     

         

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Dezesseis

Conclusão dos Ensinamentos para Sanatana Goswami

Existem aqueles que simplesmente desejam liberação, aqueles que já são liberados, mesmo enquanto nesta existência material, e aqueles que são realmente auto-realizados. Existem muitas pessoas neste mundo que desejam liberação, e às vezes se dedicam no serviço devocional para esse propósito. Está corroborado no Srimad Bhagavatam (1.2.26) aqueles que realmente desejam liberação abandonam adoração dos semideuses, e, sem inveja, concentram suas mentes na adoração de Narayana, a Suprema Personalidade de Deus. Quando essas pessoas entram em contato com um devoto puro, elas se dedicam no serviço devocional de Krishna e abandonam a idéia de liberação. No Hari-bhakti-sudhodaya está afirmado:

aho mahatman bahu-dosa-dusto
'py ekena bhaty esa bhavo gunena
sat-sangam akhyena sukhabahena
krtadya no yena krsa mumuksa

"Ó grande alma, apesar de haver muitas falhas dentro desta vida miserável, ainda assim existe uma glória - a associação de devotos puros. Cultive essa associação. Por ela, nosso desejo por liberação diminui".

No Srimad Bhagavatam (11.2.37) está afirmado que o medo dos seres humanos é devido ao seu conceito material de vida e pelo seu esquecimento do seu relacionamento eterno com o Supremo Senhor. Conseqüentemente ele se encontra a ter somente memórias pervertidas. Isso ocorre devido ao encanto da energia material. Alguém que tem inteligência suficiente se dedicará no serviço devocional pleno e considera o Supremo Senhor como seu mestre espiritual e Deus adorável. A conclusão é que ninguém pode conseguir uma revolução na consciência sem se dedicar no serviço devocional para o Senhor. Quando alguém está realmente livre da contaminação material, ele pode se dedicar plenamente na Consciência de Krishna.

No Srimad Bhagavatam (10.14.4) é novamente dito claramente sobre aquele que se dedica na vida espiritual para entender as coisas como elas são mas carece de todas intenções de se dedicar na Consciência de Krishna, simplesmente consegue problemas para seu empreendimento. Não há substância para sua vida. Todo ser vivo é parte e parcela do Supremo Senhor, e por isso é dever de todo ser vivo servir esse supremo todo. Sem esse serviço, o ser vivo cai dentro da contaminação material.

O Senhor Chaitanya concluiu Seus ensinamentos para Sanatana Goswami por assinalar que os seis tipos de atmaramas se dedicam em algum tipo de serviço devocional para Krishna. Em outras palavras, em algum momento ou outro todos os transcendentalistas ultimamente vêm a entender a necessidade de prestar serviço devocional para Krishna e se tornarem plenamente conscientes de Krishna. Mesmo se alguém for muito erudito ou extravagante, ainda assim ele pode se dedicar no serviço devocional do Senhor.

Os transcendentalistas podem ser categorizados em seis tipos básicos: o transcendentalista neófito, o transcendentalista absorto, aquele que está situado realmente na transcendência, aquele que realmente deseja liberação, aquele que é realmente liberado, e aquele que está realmente dedicado nas atividades da sua posição constitucional. Todos esses são chamados atmarama. Quando uma pessoa se torna atmarama, ou um grande pensador em Consciência de Krishna, ela se dedica plenamente no serviço devocional. De acordo com as regras gramaticais, existem muitos atmaramas, mas um sentido da palavra é suficiente para representar os outros. No sentido coletivo, todos os atmaramas são inclinados a adorar o Supremo Senhor Krishna.

O místico que adora a Superalma dentro de si mesmo também é chamado atmarama. Os yogis atmarama são de dois tipos: sagarbha e nigarbha. Está afirmado no Srimad Bhagavatam (2.2.8): "Alguns yogis meditam dentro de seu coração no Vishnu localizado, que tem quatro mãos e que porta quatro símbolos: búzio, disco, maça e lótus". O yogi que pensa no Vishnu de quatro mãos se torna absorto no êxtase devocional e evidencia os sintomas desse estado. Às vezes ele chora, e às vezes ele sente separação. Dessa forma ele imerge na bem-aventurança transcendental. O resultado de tudo isso é que ele fica capturado igual um peixe.

Os yogis sagarbha e nigarbha podem ser divididos mais ainda em três categorias: o iniciante, o ascendente, e aquele que já alcançou a perfeição. Esses yogis são descritos no Sexto Capítulo do Bhagavad-gita. Aqueles que tentam ascender no caminho do yoga místico são chamados aruruksu. No aruruksu yoga, vários tipos de posturas são praticados, e a mente fica concentrada. Mas quando alguém já ascendeu para o caminho do yoga, meditação e desapego são os objetivos, e quando a pessoa não for mais apegada a trabalhar para o prazer sensual, gradualmente ela fica livre. Nesse momento ela também alcança um estado de êxtase chamado yoga arudha. Se esses yogis místicos de uma forma ou de outra entram em contato com uma pessoa santificada, eles se tornam devotos de Krishna. A palavra urukrama indica o Supremo Senhor. Todos os atmaramas estão dedicados no serviço devocional de Urukrama. Antes de se dedicarem no serviço devocional, esses transcendentalistas são chamados santas, ou devotos pacificados. A palavra atma, ou eu, é às vezes traduzida como "mente". Às vezes especuladores mentais apresentam teorias filosóficas em diferentes modos, mas quando eles entram em contato com pessoas santificadas dedicadas no serviço devocional, eles também se tornam devotos.

O Srimad Bhagavatam (10.87.18) descreve duas classes de yogis (sagarbha e nigarbha) como se segue: "Os yogis começam sua prática de yoga por adorar o abdômen, e eles tentam concentrar sua atenção em seus intestinos. Gradualmente sua meditação se eleva para o coração e se concentra na mente e no coração. Então sua atenção se eleva para o topo da cabeça, e aquele que pode se elevar para essa posição é entendido que se tornou perfeito e não é mais sujeito a nascimento e morte". Mesmo se esses yogis entrarem em contato com devotos puros, eles também prestam serviço devocional sem causa para o Senhor.

A palavra atma também significa "esforçar-se". Em cada prática há algum esforço, e o esforço último é o esforço para alcançar o estágio de perfeição mais elevado do serviço devocional. No Srimad Bhagavatam (1.5.18) está afirmado que se deve tentar atingir o objetivo mais elevado, que não pode ser atingido mesmo nos sistemas planetários superiores ou inferiores. A idéia é que felicidade e miséria materiais estão disponíveis em todos sistemas planetários no devido curso do tempo, mas a conquista mais elevada, serviço devocional, não pode ser conseguida em nenhum lugar sem esforço. Portanto no Brihan-naradiya Purana é dito sobre aquele que é sério sobre compreender o estágio de perfeição mais elevado do serviço devocional pode se tornar bem sucedido em tudo simplesmente pelo seu esforço. Não se pode alcançar o estágio de perfeição mais elevado do serviço devocional sem esforço pessoal. Como Krishna afirma no Bhagavad-gita:

tesam satata-yuktanam
bhajatam priti-purvakam
dadami buddhi-yogam tam
yena mam upayanti te

"Para aqueles que estão constantemente devotados e Me adoram com amor, Eu dou a compreensão com a qual eles podem vir a Mim" (Bg. 10.10).

A palavra atma também significa paciência e perseverança. Com paciência e perseverança pode-se alcançar o estágio mais elevado do serviço devocional.

Sobre a palavra muni, existem significados adicionais. A palavra também se refere a um pássaro e a uma grande abelha preta. Outro significado da palavra nirgrantha é "uma pessoa tola". Assim até mesmo pássaros, abelhas e pessoas tolas se dedicam no serviço devocional do Supremo Senhor quando são favorecidas por um devoto puro. De fato, está afirmado no Srimad Bhagavatam (10.21.14) que os pássaros são devotados ao serviço do Supremo Senhor. Também está afirmado lá (10.15.6) que as abelhas pretas sempre seguem Krishna e Balarama. A respeito disso, Sri Krishna até mesmo descreveu o serviço devocional que as abelhas e vespas prestavam para a Suprema Personalidade de Deus. O Senhor Krishna disse:

ete 'linas tava yaso 'khika-loka-tirtham
gayanta adi purusanupadam bhajante
prayo ami muni-gana bhavadiya-mukhya
gudham vane 'pi na jahaty anaghatma-daivam

"Ó supremamente virtuoso, ó Personalidade de Deus (Balarama), justamente veja como essas abelhas e vespas seguem Você, para glorificar Sua fama transcendental e adorá-Lo. Na realidade essas vespas e abelhas não são o que parecem; elas são grandes sábios que aproveitaram esta oportunidade para adorar a alma suprema. Apesar de Você não ser conhecido por pessoas ordinárias, elas conhecem Você, e elas O seguem e O glorificam". Há um verso similar no Srimad Bhagavatam (10.15.7) que descreve a recepção dada a Balarama e Krishna pelos pavões de Vrindavana. "Ó adorável, justamente veja como os pavões que retornam para seus ninhos recepcionam Você com todo prazer. Esses pavões são iguais às donzelas de Vraja. Os cucos nos galhos das árvores também recepcionam Você de seu próprio jeito. Os residentes de Vrindavana são tão gloriosos que todos estão preparados para prestar serviço devocional para o Senhor". Está afirmado em outro verso do Srimad Bhagavatam (10.35.11): "Ó justamente veja como as garças e cisnes na água cantam as glórias do Senhor! De fato, eles permanecem na água para meditar e adorá-Lo". É dito em outra parte do Srimad Bhagavatam (2.4.18): "Mesmo os aborígines e seres humanos incivilizados tais quais Kiratas, Hunas, Andhra, Pulinda, Pulkasha, Abhira, Shumbha, Yavana e Khasa, e também muitos outros seres humanos em espécies inferiores, todos podem ser purificados simplesmente por se abrigarem nos devotos puros". Assim Shukadeva Goswami ofereceu suas respeitosas reverências ao Senhor Vishnu, cujos devotos podem trabalhar tão maravilhosamente.

Outro significado da palavra dhrti é "realizar-se como elevado". Quando alguém realiza sua própria elevação, ele sente que está livre de todas misérias e está elevado para a plataforma mais elevada de vida. Todos devotos de Krishna em Consciência de Krishna plena estão livres de todos tipos de prazeres e misérias materiais. Eles estão plenamente absortos no serviço do Senhor, e estão sempre contentes em virtude de sua dedicação em Seu serviço transcendental. Eles são pessoas experientes da felicidade. De fato, elas são tão felizes que nem mesmo desejam ser promovidas para os planetas espirituais, porque estão felizes em toda esfera de vida. Por serem plenas no serviço transcendental do Senhor, elas não desejam nem objetos materiais ou prazeres sensuais materiais. Como afirmado pelos Goswamis: "Pessoas cujos sentidos estão fixos no serviço do Supremo Senhor podem ser chamadas tranqüilas".

Assim a palavra atmarama indica que até mesmo pássaros, animais selvagens e tolos - em resumo, todos - podem se tornar atraídos pelas qualidades transcendentais de Krishna, dedicarem-se no Seu serviço e se tornarem liberados.

Ainda assim outro significado de atma é "inteligência". Aquele que tem inteligência especial também é chamado atmarama. Os atmaramas com inteligência especial são de dois tipos. Um é o sábio erudito, e o outro é o tolo sem conhecimento de livro. Esses dois podem ter a oportunidade de se associar com o devoto puro. Mesmo os atmaramas tolos podem abandonar tudo e se dedicarem na Consciência de Krishna no serviço devocional puro. No Srimad Bhagavatam está afirmado que o Senhor é a origem de tudo e que tudo emana Dele. Qualquer um que é realmente inteligente pode entender que o Supremo Senhor Krishna é a fonte de tudo e assim se dedicar no Seu serviço. Como está afirmado no Srimad Bhagavatam (2.7.46): "O que dizer sobre pessoas que são inteligentes o bastante para estudar os Vedas - mesmo pessoas menos inteligentes tais quais mulheres, operários, os Huna, Shabara, e os pássaros e animais selvagens podem alcançar o estágio de perfeição da vida mais elevado". Como citado previamente, Bhagavad-gita (10.10) indica que quando uma pessoa se torna altamente inteligente e se dedica na Consciência de Krishna, Krishna reciproca por lhe dar a inteligência pela qual ela pode ser promovida para a residência do Supremo Senhor.

O Senhor então disse a Sanatana Goswami que a associação de bons devotos, dedicação no serviço transcendental do Senhor, o entendimento do Srimad Bhagavatam, o cantar do santo nome do Senhor, e residir num lugar sagrado como Vrindavana ou Mathura são todos muito importantes para elevação ao plano transcendental. Ninguém precisa alcançar esses cinco itens; se a pessoa for especialista em só um deles, ela irá, sem falha, ser elevada ao estágio de amor do Supremo. Aquele que é realmente inteligente abandona todos desejos materiais e se dedica no serviço transcendental de Krishna. A influência do serviço devocional é tanta que quando uma pessoa se dedica a ele, abandona todos desejos materiais e se torna plenamente apegada a Krishna, inspirada pelas qualidades transcendentais do Senhor. Assim é a beleza do Senhor nos olhos de Seu devoto.

Outro significado da palavra atma é "natureza". Nesse caso a palavra atmarama indica que cada um desfruta a natureza particular que adquiriu. Todavia, a natureza última, ou a natureza perpétua eterna do ser vivo, é servir o Supremo Senhor. Aquele que alcança a perfeição de entender sua natureza real - como servo eterno do Senhor - abandona sua concepção designativa (material, ou corpórea) de vida. Isso é verdadeiro conhecimento. Aqueles que estão em busca de conhecimento e que tiveram a oportunidade de se associar com um devoto puro também se dedicam no serviço devocional do Senhor. Sábios iguais os quatro Kumaras, e também tolos e pássaros, podem se dedicar no serviço transcendental do Senhor. Ao ser favorecido com a misericórdia sem causa de Krishna, qualquer um e todos podem ser elevados à plataforma da Consciência de Krishna.

Quando alguém se torna atraído pelas qualidades transcendentais de Krishna, ele começa seu serviço devocional. O Srimad Bhagavatam (10.15.8) glorifica a terra de Vrindavana deste modo:

dhanyeyam adya dharani trna-virudhas tvat-
pada-sprso druma-latah karajabhimrstah
nadyo 'drayah khaga-mrgah sadayavalokair
gopyo 'ntarena bhujayor api yat-sprha srih

"Esta terra de Vrajabhumi é glorificada pelo toque de Seus pés. Tocados por Seus dedos, os arbustos também glorificam Você. Quando Você olha para as montanhas, rios e animais inferiores, todos estão glorificados, e as gopis abraçadas por Seus braços transcendentais, também são glorificadas". As gopis (meninas pastoras de vacas) glorificam Vrindavana nas seguintes palavras: "Queridas amigas, todos esses habitantes de Vrajabhumi - inclusive pássaros, animais selvagens, e árvores - são glorificados quando vêm o Senhor Krishna que vai para o campo de pastagem com Seus amigos e Balarama".

A palavra atma também significa "este corpo". Os yogis que praticam exercícios físicos, pois consideram o corpo como o eu, também são elevados para o serviço transcendental do Senhor se eles se associarem com devotos puros. Existem muitas pessoas que acreditam que o corpo é o eu, e estão engajadas em muitas atividades lucrativas, inclusive rituais de banho e atividades mundanas ordinárias. Todavia, quando entram em contato com um devoto puro, também se dedicam no serviço transcendental do Senhor.

No Srimad Bhagavatam (1.18.12) está afirmado: "Ó meu querido Suta Goswami, mesmo embora nós ficamos obscurecidos pela fumaça de sacrifício das atividades lucrativas, você nos deu o néctar dos pés de lótus de Krishna". Também está afirmado no Srimad Bhagavatam (4.21.31): "As águas do Ganges fluem da ponta dos pés de lótus de Krishna, e ao se banhar nessa água, todos - inclusive atores lucrativos e todos sábios - podem lavar coisas sujas da mente.

Mesmo aqueles que acreditam que o corpo é o eu, ou aqueles que estão cheios de desejos materiais, também são, num sentido, atmarama. Quando eles se associam com os devotos puros do Senhor, eles abandonam seus desejos materiais e se tornam perfeitos no serviço devocional do Senhor. O melhor exemplo é encontrado no Hari-bhakti-sudhodaya (7.28), onde Dhruva Maharaja diz:

sthanabhilasi tapasi sthito 'ham
tvam praptavan deva-munindra-guhyam
kacam vicinvann api divya-ratnam
svamin krtartho 'smi varam na yace

"Meu querido Senhor, eu vim para adorá-Lo porque eu desejei alguma terra nesta Terra, mas afortunadamente eu obtive Você, que está além da percepção até mesmo de grandes sábios e pessoas santificadas. Eu vim procurar algumas partículas de vidro colorido, mas em vez disso eu encontrei uma jóia muito preciosa igual a Você. Eu estou satisfeito, e não desejo pedir nada de Você". (Cc. Madhya 22.42).

Existe também outro significado para a palavra nirgrantha. A palavra também pode significar "caçador tolo", ou "homem pobre miserável". Existe um acontecimento de um caçador que alcançou salvação e se dedicou no serviço devocional do Senhor simplesmente por se associar com o devoto puro Narada. De fato, o Senhor Chaitanya contou para Sanatana Goswami a seguinte história do encontro do caçador com Narada.

Certa vez havia um caçador na floresta de Prayaga que foi afortunado o bastante para encontrar Narada Muni quando o grande sábio voltava de Vaikuntha depois de visitar o Senhor Narayana. Narada veio para Prayaga para se banhar na confluência do Ganges e Yamuna. Enquanto passava através da floresta, Narada viu um pássaro deitado no chão. O pássaro estava meio morto, traspassado por uma flecha, e chilreava penosamente. Mais adiante, Narada viu um cervo caindo em agonia. Adiante, ele viu que um javali também sofria, e em outro local, ele viu um coelho que se contorcia de dor. Tudo isso o deixou com muita compaixão, e ele começou a pensar, "Quem foi o homem idiota que cometeu esses pecados"? Devotos do Senhor geralmente são compassivos sobre as misérias dos seres vivos, o que dizer do grande sábio Narada? Ele ficou muito chocado com aquela cena, e depois de dar alguns passos, ele viu um caçador engajado em caçar com arco e flechas. A tonalidade do caçador era bem escura, e seus olhos eram vermelhos. Parecia ser perigoso só de vê-lo, em pé ali com seu arco e flechas, que parecia justamente igual um associado de Yamaraja, morte. Ao vê-lo, Narada Muni entrou adentro na floresta para se aproximar dele. Quando Narada Muni passava pela floresta, todos os animais que estavam presos nas armadilhas do caçador escaparam e fugiram. O caçador ficou muito bravo com isso, e já estava para xingar Narada com nomes feios, mas, pela influência santificada de Narada, o caçador não conseguiu pronunciar essas blasfêmias. Ao invés, com comportamento gentil, ele perguntou a Narada: "Meu querido senhor, por que você veio aqui enquanto eu caço? Você se desviou do caminho geral? Porque você veio aqui, todos os animais nas minhas armadilhas fugiram".

"Sim, eu sinto muito", Narada respondeu. "Eu vim até você para encontrar meu próprio caminho e para inquirir de você. Eu vi que há muitos javalis, cervos e coelhos no caminho. Eles estavam caídos no chão da floresta meio mortos e se contorciam. Quem cometeu esses atos pecaminosos"?

"O que você viu está certo", o caçador respondeu. "Isso foi feito por mim".

"Se você caça todos esses pobres animais, por que não os mata de uma vez"? Narada perguntou. "Você quase os mata, e eles sofrem com suas dores da morte. Isso é um grande pecado. Se você quer matar um animal, por que não o mata completamente? Por que você o deixa quase morto e permite que ele morra em agonia"?

"Meu querido Senhor", o caçador respondeu. "Meu nome é Mrigari, inimigo dos animais. Eu simplesmente sigo os ensinamentos do meu pai que me ensinou a quase matar os animais e deixá-los em agonia. Quando um animal quase morto sofre, eu sinto um grande prazer com isso".

"Eu só imploro uma coisa para você", Narada implorou, "Por favor aceite".

"Ó, sim senhor, eu darei para o senhor qualquer coisa que queira", o caçador disse. "Se você quiser algumas peles de animais, venha para minha casa. Eu tenho muitas peles de animais, inclusive tigres e cervos. Eu darei qualquer coisa que desejar".

"Eu não quero essas coisas", Narada respondeu. "Todavia, eu quero uma outra coisa. Se você puder me conceder bondosamente, eu lhe direi. Por favor, daqui em diante a partir de amanhã, sempre que você matar um animal, por favor, mate-o completamente. Não o deixe quase morto".

"Meu querido senhor, o que você me pede? Qual é a diferença entre quase matar um animal e matá-lo completamente"?

"Se você quase mata os animais, eles sofrem uma grande dor", Narada explicou. "E se você causa muita dor para outros seres vivos, você comete um grande pecado. Há uma grande ofensa cometida quando você mata um animal completamente, mas a ofensa é muito maior quando você quase o mata. De fato, a dor que você causa para animais meio mortos terá que ser aceita por você num nascimento futuro".

Apesar do caçador ser muito impiedoso, seu coração amoleceu, e ele ficou com medo dos pecados em virtude da sua associação com um grande devoto igual a Narada. Aqueles que são grosseiramente impiedosos não têm nenhum medo de suas atividades pecaminosas. O caçador então respondeu; "Meu querido senhor, desde a minha infância fui ensinado a matar animais desse modo. Por favor diga-me como posso me livrar de todas essas ofensas e atividades pecaminosas que eu acumulei. Eu me rendo a seus pés. Por favor salve-me de todas as reações de minhas atividades pecaminosas que cometi no passado, e por favor direcione-me para o caminho apropriado no qual eu possa ser livre".

"Se você realmente deseja seguir minhas direções, eu posso dizer o caminho real no qual você pode se livrar de todas reações pecaminosas".

"Eu seguirei qualquer coisa que você disser sem hesitação", o caçador concordou.

Narada então lhe disse para primeiro quebrar seu arco; somente assim ele revelaria o caminho da liberação.

"Você me pede para quebrar meu arco", o caçador protestou, "mas se eu o quebrar, qual será meu meio de subsistência"?

"Não se preocupe com sua subsistência". Narada disse. "Eu mandarei para você grãos suficientes para você viver".

O caçador então quebrou seu arco e caiu aos pés de Narada. Narada o levantou, e o instruiu: "Justamente vá para sua casa e distribua qualquer dinheiro e valores que você tem para os devotos e os brahmanas. Então saia e me siga com apenas um pano de roupa. Construa uma casa de palha na margem do rio e semeie uma planta tulasi nessa casa. Justamente circungire a árvore tulasi, e todo dia saboreie uma folha caída. Acima de tudo, sempre cante Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. No que diz respeito à sua subsistência, eu mandarei grãos para você, mas você só aceitará tantos grãos quanto forem necessários para você mesmo e sua esposa".

Narada então salvou os animais meio mortos, e, livres de sua condição terrível, fugiram. Depois de ver Narada realizar esse milagre, o caçador escuro ficou maravilhado admirado. Depois de levar Narada para sua casa, ele se prostrou novamente a seus pés.

Narada retornou para seu local, e o caçador, depois de retornar para casa, começou a executar as instruções que Narada lhe deu. Nesse meio tempo, a notícia se espalhou por todas as vilas que o caçador tinha se tornado um devoto. Conseqüentemente os residentes das vilas vinham ver o novo Vaishnava. É o costume Védico levar grãos e frutas sempre que alguém vai ver uma pessoa santificada, e porque todos os aldeões viram que o caçador virou um grande devoto, eles traziam comestíveis consigo. Assim todo dia a ele eram oferecidos grãos e frutas, tanto que não menos de dez a vinte pessoas poderiam comer ali. De acordo com as instruções de Narada, ele não aceitou nada mais do que ele e sua esposa requeriam para seu sustento.

Depois que passaram alguns dias, Narada disse a seu amigo Parvata Muni: "Eu tenho um discípulo. Vamos visitá-lo e ver se ele vai bem".

Quando os dois sábios, Narada e Parvata, foram para a casa do caçador, o caçador viu seu mestre espiritual que vinha à distância, e ele começou a se aproximar com grande respeito. No seu caminho para encontrar os grandes sábios, o caçador viu que havia muitas formigas no chão na frente dele e que elas impediam sua passagem. Quando ele alcançou os sábios, tentou se prostrar perante eles, mas ele viu que havia tantas formigas que não poderia se prostar sem esmagá-las. Assim com cuidado ele retirou as formigas do caminho com seu pano. Quando Narada viu que o caçador tentava salvar as vidas das formigas daquele modo, ele se lembrou de um verso do Skanda Purana: "Não é maravilhoso que um devoto do Senhor não é inclinado a causar qualquer tipo de dor para ninguém, nem mesmo uma formiga"?

Apesar do caçador anteriormente sentir grande prazer em deixar animais meio mortos, desde que virou um grande devoto do Senhor, não estava preparado para causar dor nem mesmo para uma formiga. O caçador recebeu os dois grandes sábios em sua casa e ofereceu-lhes um local para sentar, trouxe água, lavou seus pés, deu água para eles beberem, e finalmente ele com sua esposa tocaram a água com suas cabeças. Depois disso, eles começaram a sentir êxtase e começaram a dançar e cantar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Eles levantaram suas mãos e dançaram com suas roupas que esvoaçavam. Quando os dois grandes sábios viram esse êxtase de amor do Supremo manifesto no corpo do caçador, Parvata Muni disse para Narada: "Você é uma pedra filosofal, porque pela sua associação mesmo um grande caçador foi transformado num grande devoto".

Existe um verso no Skanda Purana que afirma: "Meu querido Devarshi (Narada), você é glorioso, e por sua misericórdia, mesmo a criatura mais baixa, um caçador de animais, também se tornou elevado para o caminho da devoção e alcançou apego transcendental por Krishna".

Finalmente, Narada inquiriu do caçador-devoto: "Você recebe seus alimentos regularmente"?

"Você manda tanta gente", respondeu o caçador, "e eles trazem tantos comestíveis que nós não conseguimos começar a comê-los".

"Assim está bem", Narada respondeu. "Qualquer coisa que você obtém está bem. Agora justamente continue seu serviço devocional desse modo".

Depois que Narada falou isso, tanto Narada quanto Parvata Muni desapareceram da casa do caçador. O Senhor Chaitanya recitou essa história a fim de mostrar que até mesmo um caçador pode se dedicar no serviço devocional de Krishna pela influência de devotos puros.

Na continuação da explicação do verso Atmarama, o Senhor Chaitanya assinalou que a palavra atma também indica todas variedades da Personalidade de Deus. Geralmente a Personalidade de Deus Ele mesmo, Krishna, e Suas diferentes expansões são todos conhecidos como a Personalidade de Deus.

Qualquer um que está dedicado no serviço devocional de qualquer forma ou extensão da Suprema Personalidade de Deus também é chamado atmarama. Todos esses devotos se dedicam tanto nos princípios reguladores do serviço devocional ou no serviço devocional em amor transcendental. Esses devotos também são divididos em três categorias: os associados, aqueles perfeitos no serviço devocional, e aqueles recentemente dedicados no serviço devocional. Devotos recentemente dedicados podem ser divididos em dois: aqueles que já alcançaram apego pelo Senhor e aqueles que não alcançaram esse apego. Quando se considera de acordo com as duas divisões do serviço devocional (chamadas reguladora - e apego em amor transcendental) essas classes de devotos chegam a oito em número. Por seguir os princípios reguladores da devoção, os associados perfeitos do Senhor são ainda mais divididos em quatro classes: os servos, os amigos, os superiores paternos-maternos e as noivas.

Justamente como alguns devotos são perfeitos pela execução do serviço devocional, assim alguns deles são eternamente perfeitos. Daqueles que seguem os princípios reguladores do serviço devocional, há os avançados e os iniciantes, e no serviço amoroso transcendental, existem dezesseis tipos de devotos. Assim os atmaramas podem ser considerados a existir em trinta e duas divisões. Se as palavras muni, nirgrantha, ca e api forem aplicadas para as trinta e duas classes, então existem cinqüenta e oito tipos diferentes de devotos. Todos esses devotos podem ser descritos por uma palavra: atmarama. Podem existir diferentes tipos de árvores que estão na floresta, mas a palavra "árvore" descreve todas elas.

Assim o Senhor deu sessenta significados diferentes da palavra atmarama. Em adição, Ele disse que atma significa "o ser vivo, a começar a partir da primeira criatura, Brahma, abaixo até a formiga". Ele citou um verso do Sexto Capítulo do Vishnu Purana no qual está afirmado que todas as energias do Senhor são espirituais. Apesar de ser esse o caso, a energia que é conhecida como a fonte do ser vivo é chamada espiritual, mas a outra energia, que é cheia de ignorância e é manifestada nas atividades materiais, chama-se natureza material. Mesmo na criação material, os seres vivos são inumeráveis. Se por um acaso um ser vivo no mundo material puder se associar com um devoto puro, poderá se dedicar no serviço devocional puro de Krishna. "Anteriormente Eu ensinei sessenta significados diferentes da palavra atmarama", o Senhor disse a Sanatana Goswami, "mas aqui outro significado veio à minha mente por sua associação".

Depois de ouvir as diferentes explanações da palavra atmarama, Sanatana Goswami estava admirado, e ele caiu em devoção aos pés do Senhor Chaitanya, "Eu entendo que Você é pessoalmente a Suprema Personalidade de Deus, Krishna", Sanatana disse, "e com Sua respiração há muitas manifestações da literatura Védica. Você é o professor do Srimad Bhagavatam, e Você conhece melhor os significados dos versos do Srimad Bhagavatam. Não é possível para outros entender os significados confidenciais do Srimad Bhagavatam sem Sua misericórdia".

"Não tente Me elogiar desse modo", o Senhor disse a Sanatana. "Somente tente entender a natureza real do Srimad Bhagavatam. Srimad Bhagavatam é a representação sonora do Supremo Senhor Krishna; portanto Srimad Bhagavatam tem significados ilimitados. Alguém pode entender esses significados por meio da associação de devotos. Então não diga que Bhagavatam é simplesmente uma coleção de respostas para perguntas".

Existem seis questões expostas pelos sábios de Naimisharanya para Suta Goswami, e Suta Goswami explicou ou respondeu as seis questões no Srimad Bhagavatam. Há um verso na literatura Védica no qual o Senhor Shiva diz, "No que diz respeito ao Bhagavatam, eu posso conhecê-lo, ou Shukadeva ou Vyasadeva podem conhecê-lo, ou talvez não o conheçamos - mas na realidade Bhagavatam é para ser entendido pelo serviço devocional e de um devoto, e não por sua própria inteligência ou por comentários acadêmicos". No começo do Srimad Bhagavatam (1.1.23) os sábios de Naimisharanya perguntaram,

bruhi yogesvare krsne
brahmanye dharma-varmani
svam kastham adhunopete
dharmah kam saranam gatah

"Meu querido Senhor, gentilmente nos diga se os princípios da religião foram com o Senhor, depois de Sua partida para Sua própria morada. Como poderemos encontrar esses princípios depois da partida Dele"?

A resposta foi (1.3.43):

krsne sva-dhamopagate
dharma-jñanadibhih saha
kalau nasta-drsam esa
puranarko 'dhunoditah

"Depois que Krishna partiu para Sua morada com todos princípios religiosos, Seu representante, o Srimad Bhagavatam, o Maha-Purana, permanece como o ardente, iluminante Sol".

O Senhor Chaitanya então disse a Sanatana Goswami: "Eu fui justamente igual um louco em descrever esse verso Atmarama de tantos modos. Não repare se Eu disse alguma coisa doida. Mas se alguém se tornar um louco igual a Mim, pode entender o significado real do Srimad Bhagavatam como Eu o expliquei".

Então Sanatana Goswami, com mãos postas, caiu aos pés do Senhor Chaitanya e rogou. "Meu querido Senhor", ele disse, "Você me disse para preparar os princípios reguladores do serviço devocional, mas eu pertenço à classe mais baixa. Eu não tenho conhecimento. Eu não sei como uma tarefa tão importante como essa pode ser finalizada por mim. Se Você gentilmente me der algumas dicas sobre a preparação dum livro desses sobre serviço devocional, assim pode ser que eu fique qualificado para escrevê-lo".

O Senhor o abençoou por dizer, "Qualquer coisa que você escrever, pela graça de Krishna, saíra do seu coração e será aceita como você requisitou. Eu também lhe darei algumas notas que você pode levar. O primeiro e mais importante ponto é que a pessoa deve aceitar um mestre espiritual fidedigno. Esse é o começo da vida espiritual". O Senhor Chaitanya então pediu para Sanatana Goswami escrever os sintomas de um guru verdadeiro e os sintomas de um devoto verdadeiro. Os sintomas de um devoto são descritos no Padma Purana: Uma pessoa que é um brahmana qualificado e ao mesmo tempo tem todos os sintomas de um devoto pode se tornar um mestre espiritual para todas as classes de seres humanos. Tal devoto e mestre espiritual deve ser respeitado como o Próprio Deus. Mesmo se uma pessoa nasceu numa família brahmana muito respeitável, não pode se tornar um mestre espiritual fidedigno se não for um devoto do Senhor. Não se deve pensar erroneamente que um mestre espiritual fidedigno tem que ter nascido numa assim chamada família brahmana. A idéia é que o mestre espiritual tem que ser um brahmana qualificado; isto é, ele deve ser qualificado por suas atividades.

Isso é confirmado no Srimad Bhagavatam quando Narada fala dos diferentes sintomas que caracterizam as quatro divisões da vida social. Narada ali resume que brahmanas, ksatriyas, vaisyas e sudras devem ser selecionados por suas qualificações individuais. Em seu comentário, Shridhara Swami destacou que nascimento numa família de brahmanas não necessariamente significa que a pessoa é um brahmana. A pessoa tem que ser qualificada com os sintomas de um brahmana, da forma como os sintomas são descritos nos sastras. Na sucessão discipular da sampradaya Gaudiya Vaishnava, há dois grandes acaryas (Thakura Narottama e Shyamananda Goswami) que não nasceram em famílias brahmana mas foram aceitos como mestres espirituais por muitos brahmanas de fama, inclusive Ganganarayana, Ramakrishna, etc..

Desse modo existem sintomas que um devoto potencial evidencia, e tanto o discípulo quanto o mestre espiritual devem ver se cada um é elegível para se tornar tanto um mestre espiritual fidedigno quanto um estudante fidedigno. Deve-se então saber que o único objeto de adoração é a Suprema Personalidade de Deus, e deve-se aprender os vários mantras e canções sagrados.

O Senhor então instruiu Sanatana para descrever os sintomas daquelas pessoas que são elegíveis para aceitar mantras e para descrever como os mantras devem ser entendidos e aperfeiçoados por execuções ritualísticas. Depois o Senhor descreveu iniciação, deveres matinais e deveres de higiene pessoal - lavar a face e escovar os dentes - o processo de trabalho e as preces que devem ser recitadas tanto na manhã quanto na noite. O Senhor também descreveu como alguém deve adorar o mestre espiritual e marcar o corpo com gopi-candana. Ele também descreveu como se deve colher as folhas de tulasi e lavar o quarto e o templo do Senhor, e também descreveu como alguém deve despertar Krishna de Seu sono. O Senhor Chaitanya também descreveu diferentes métodos de adoração ao Senhor, que são os métodos com cinco parafernálias e com cinqüenta parafernálias. Ele descreveu como se deve adorar o Senhor por oferecer a Ele arati cinco vezes por dia, e Ele descreveu como se deve oferecer alimento para Krishna e deitá-Lo na cama. O Senhor Chaitanya também falou do efeito de ir a vários lugares de peregrinação que têm diferentes templos do Senhor e ver a forma de Deus no templo. Ele também falou da glorificação do nome transcendental do Senhor e das diferentes ofensas que não podem ser cometidas enquanto na adoração. Na adoração ao Senhor a parafernália certa é usada, tais quais búzio, água, flores fragrantes, preces e hinos, e há circungirar e prestar reverências também. Deve-se seguir os princípios reguladores de purascarana e aceitar Krishna prasada, rejeitar alimentos que não foram oferecidos a Krishna. O Senhor Chaitanya também advertiu que não se deve entregar à difamação de um devoto que tem verdadeiros sintomas de um devoto.

O Senhor Chaitanya também explicou os sintomas de uma pessoa santificada e o processo de satisfazer o sábio e rejeitar a sociedade de pessoas indesejáveis. O Senhor também aconselhou que se deve ouvir o Srimad Bhagavatam constantemente. Também para serem seguidos são deveres do dia e deveres da quinzena, e também jejuar no dia de Ekadashi. Também se deve seguir os deveres do mês e observar cerimônias tais quais o aniversário do Senhor, as três datas específicas de jejum no Ekadashi, Janmashtami, Vamanadwadashi, Sri Ramanavami e Nrisimhachaturdashi. Quando os dias de jejum sobrepõem com outros dias (viddha), são benéficos no avanço do serviço devocional. O Senhor Chaitanya instruiu mais ainda Sanatana Goswami para fornecer evidência documental dos puranas em cada passo. Ele também mencionou como estabelecer templos do Senhor, e Ele descreveu o comportamento geral, sintomas, e deveres e ocupação de um Vaishnava. Assim o Senhor explicou em resumo todos os detalhes que alguém precisa saber ao escrever um livro sobre princípios reguladores Vaishnava.

Sanatana Goswami era um grande devoto do Senhor, e ele foi diretamente instruído para propagar o culto de bhakti por escrever muitos livros. Há uma descrição de Sanatana no Chaitanya-chandrodaya, e é mencionado ali que Sanatana Goswami era uma das personalidades mais importantes no governo do Nawab Hussain. Seu irmão, Rupa Goswami, também era um ministro no governo, mas os dois abandonaram seus cargos lucrativos no governo para se tornarem mendigos e servir o Supremo Senhor. Externamente os irmãos se tornaram justamente iguais a mendigos ordinários, mas seus corações estavam cheios com serviço amoroso transcendental e um grande amor pelo menino pastor de vacas de Vrindavana. De fato, Sanatana Goswami era querido por todos devotos puros do seu tempo.

      

     

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Dezessete

Senhor Chaitanya, a Personalidade de Deus Original

Por seguir os passos do Kaviraja Krishnadasa Goswami, nós oferecemos nossas respeitosas reverências aos pés de lótus do Senhor Chaitanya.

O Senhor Chaitanya é descrito como se segue: O Senhor Chaitanya é o único abrigo para o desesperado, para o mais caído, e Ele é a única esperança para aqueles que são completamente desprovidos de conhecimento espiritual. Vamos tentar discutir a grande contribuição Dele do serviço devocional.

O supremamente poderoso Senhor Krishna é manifesto em cinco potências diferentes. Apesar de Ele ser único e inigualável, a fim de servir cinco propósitos espirituais específicos, Ele é manifesto em cinco modos. Essa diversidade é eterna e bem-aventurada, em contraste ao conceito da unidade monótona. Das literaturas Védicas podemos entender que a Verdade Absoluta, a Suprema Personalidade de Deus, eternamente existe com Suas diversas energias. O Senhor Chaitanya apareceu com energias diversas plenas, e elas são cinco em número; por isso o Senhor Chaitanya é dito ser Krishna com diversas energias.

Não há diferença entre a energia e o energético a respeito do aparecimento do Senhor como Sri Chaitanya Mahaprabhu e Seus quatro associados - Nityananda Prabhu, Adwaita Prabhu, Gadadhara, e Shrivasa. Entre essas cinco manifestações diversas do Supremo Senhor (como o Senhor Ele mesmo e Sua encarnação, expansão e energias) não existe diferença espiritual. Elas são cinco em uma Verdade Absoluta. Com o propósito de apreciar sabores transcendentais na Verdade Absoluta, existem cinco manifestações diversas. Elas são chamadas a forma de um devoto, a identidade de um devoto, a encarnação de um devoto, o devoto puro e energia devocional.

Dessas cinco diversidades na Verdade Absoluta, a forma do Senhor Chaitanya é a da Personalidade de Deus original, Krishna. O Senhor Nityananda é a manifestação da primeira expansão do Supremo Senhor. Similarmente, Adwaita Prabhu é uma encarnação do Supremo Senhor. Esses três - Chaitanya, Nityananda e Adwaita - pertencem à categoria de Visnu-tattva, a Verdade Absoluta Suprema. Shrivasa representa o devoto puro, e Gadadhara representa a energia interna do Senhor para o avanço em devoção pura. Assim Gadadhara e Shrivasa, embora incluídos em Vishnu-tattva, são dependentes, energias diversas do Supremo Senhor. Em outras palavras, eles não são diferentes do energético, mas são manifestos diversamente com o propósito de saborear relacionamentos transcendentais. Todo o processo do serviço devocional envolve uma reciprocidade transcendental no relacionamento entre o adorador e o adorado. Sem esse intercâmbio diverso de sabores transcendentais, serviço devocional não tem nenhum sentido.

Na literatura Védica (Katha Upanishad) está afirmado que o Supremo Senhor é o ser vivo supremo entre todos os seres vivos. Existem inumeráveis seres vivos, mas existe um ser vivo que é a Divindade Absoluta Suprema. A diferença entre o ser vivo singular e os seres vivos plurais é que o ser vivo singular é o Senhor de todos. O Senhor Chaitanya é esse ser vivo supremo, e Ele descende para resgatar inumeráveis seres vivos caídos. Em outras palavras, o propósito específico do advento do Senhor Chaitanya era estabelecer o fato Védico de que existe uma Suprema Personalidade de Deus predominante sobre e mantenedor das inumeráveis personalidades de todos seres vivos. Porque os filósofos impersonalistas (Mayavadi) não podem entender isso, o Senhor Chaitanya adveio Ele mesmo para iluminar as pessoas em geral sobre a verdadeira natureza do relacionamento entre o Supremo e os muitos seres.

No Bhagavad-gita a última instrução de Krishna foi que todos devem abandonar todos os outros compromissos e prestar serviço devocional para Ele. Entretanto, depois do desaparecimento de Krishna, pessoas menos inteligentes O entenderam de modo errado. Elas ficaram contaminadas com a filosofia Mayavadi, a qual produziu tantos especuladores mentais que as pessoas esqueceram a posição real da Verdade Absoluta e do ser vivo. Por isso o Senhor Sri Krishna Ele mesmo, como o Senhor Chaitanya, novamente apareceu para ensinar às almas caídas deste mundo material o caminho para se aproximar do Senhor Krishna. O Bhagavad-gita ensina que se deve abandonar tudo e terminar com este mundo de apego material. Um devoto puro do Senhor Krishna e aquele que segue a filosofia do Senhor Chaitanya são um e o mesmo. A filosofia de Chaitanya é que se deve abandonar tudo e adorar Deus, Krishna. Krishna, como o Supremo Senhor, a Personalidade de Deus, falou as mesmas palavras, que indicavam Ele mesmo ser o Supremo Senhor. Entretanto, os filósofos Mayavadis O interpretaram errado. Por isso o Senhor Chaitanya, para solucionar a situação, reiterou a mensagem do Senhor Krishna: Ninguém deve se declarar ser tão bom quanto Krishna mas deve adorar Krishna como o Supremo Senhor.

Nós cometemos um grande erro se aceitarmos o Senhor Chaitanya como uma alma condicionada. Ele deve ser entendido como a Verdade Absoluta Suprema, a Personalidade de Deus, Sri Krishna Ele mesmo. Assim é dito do Senhor Chaitanya no Chaitanya Charitamrita: "Krishna agora está presente em cinco manifestações diferentes". A menos que alguém esteja situado na bondade incontaminada, é muito difícil entender o Senhor Chaitanya, deve-se seguir os discípulos diretos do Senhor Chaitanya - os seis Goswamis - e especialmente o caminho desenhado por Srila Jiva Goswami.

O fato mais admirável é que o Senhor Chaitanya, embora seja a Suprema Personalidade de Deus, Krishna, nunca Se exibiu como Krishna. Ao invés, sempre que Ele era detectado por devotos inteligentes como o Senhor Krishna e era chamado de Senhor Krishna, Ele negava isso. De fato, Ele às vezes tapava Seus ouvidos com Suas mãos, em protesto que ninguém deve ser chamado de Supremo Senhor. Indiretamente, Ele ensinava os filósofos Mayavadis que não se deve posar falsamente como o Supremo Senhor e assim desviar pessoas. Nem os seguidores devem ser ingênuos o bastante para aceitar qualquer um e todos como a Suprema Personalidade de Deus. Deve-se testar por consultar escrituras e observar as atividades da pessoa em questão. Não se deve, todavia, mal interpretar o Senhor Chaitanya e Suas cinco manifestações diversas como seres humanos ordinários. O Senhor Chaitanya é a Suprema Personalidade de Deus, Krishna Ele mesmo. A beleza do Senhor Chaitanya é que embora Ele seja o Supremo Senhor, Ele veio como um grande devoto para ensinar todas as almas condicionadas como serviço devocional deve ser prestado. Almas condicionadas que estão interessadas em serviço devocional devem seguir os passos exemplares do Senhor Chaitanya a fim de aprenderem como Krishna pode ser alcançado por serviço devocional. Assim o Supremo Senhor Ele mesmo ensina para a alma condicionada como Ele deve ser aproximado no serviço devocional.

Pelo estudo analítico das cinco manifestações diversas do Supremo Senhor, podemos chegar a saber que o Senhor Sri Chaitanya Mahaprabhu é o Supremo Absoluto e que o Senhor Nityananda é uma expansão imediata da Verdade Absoluta Suprema. Nós também podemos chegar a entender que Adwaita Prabhu também está na categoria da Suprema Personalidade de Deus mas é subordinado ao Senhor Chaitanya e Nityananda Prabhu. A Suprema Personalidade de Deus e Suas expansões imediatas subordinadas são adoradas pelos outros dois - chamados a representação da potência interna e a representação da potência marginal. A representação da potência interna, Gadadhara, representa o devoto confidencial, e a representação da potência marginal é o devoto puro. Esses dois são adoradores das outras três categorias, mas todos eles estão dedicados no serviço transcendental da Suprema Personalidade de Deus, Sri Chaitanya Mahaprabhu.

Há uma diferença específica entre o devoto puro e o devoto confidencial. Diferentes potências do Senhor dedicadas em servir o Supremo Senhor em diferentes relacionamentos transcendentais. Eles estão situados em amor conjugal, em afeição maternal paternal, em amizade e em servidão. Ao julgar imparcialmente, descobre-se que as potências internas do Supremo Senhor que estão dedicadas no amor conjugal com o Senhor são as melhores de todos devotos. Assim tanto devotos internos quanto devotos confidenciais estão atraídos pelo amor conjugal da Verdade Absoluta Suprema. Esses são os devotos mais confidenciais do Senhor Chaitanya. Outros devotos puros, que são mais ou menos apegados a Sri Nityananda Prabhu e Adwaita Prabhu, são atraídos por outros relacionamentos transcendentais, como afeição maternal paternal, amizade e servidão. Quando esses devotos ficam atraídos pelas atividades do Senhor Chaitanya, imediatamente se tornam devotos confidenciais em amor conjugal com o Supremo Senhor.

Há uma belíssima canção cantada por Sri Narottama dasa Thakura, um grande devoto e acarya na sucessão discipular do Senhor Chaitanya. Narottama dasa canta: "Quando haverá vibrações transcendentais por todo meu corpo simplesmente por ouvir o nome de Gauranga? Quando lágrimas escorrerão incessantemente dos meus olhos simplesmente por pronunciar os nomes do Senhor? Quando o Senhor Nityananda terá misericórdia por mim, e quando todos os meus desejos por desfrute material se tornarão insignificantes? Quando eu ficarei purificado ao abandonar todas contaminações do desfrute material? E quando eu serei capaz de ver a morada transcendental, Vrindavana? Quando eu estarei ansioso para aceitar os seis Goswamis como minha guia primordial? E quando eu serei capaz de entender o amor conjugal de Krishna"? Ninguém deve ser ávido para entender o amor conjugal de Krishna sem se submeter ao treinamento disciplinar sob os seis Goswamis de Vrindavana.

O movimento sankirtana inaugurado pelo Senhor Chaitanya é um passatempo transcendental do Senhor. "Por isso Eu vivo simultaneamente para pregar e popularizar este movimento no mundo material". Neste movimento sankirtana do Senhor Chaitanya, Nityananda e Adwaita são Suas expansões, e Gadadhara e Shrivasa são Suas potências interna e marginal. Os seres vivos também são chamados de potência marginal porque eles têm, potencialmente, duas atitudes - chamadas a tendência de se render a Krishna e a tendência de se tornar independente Dele. Devido à propensão por desfrute material, o ser vivo se torna contaminado pelo mundo material. Quando um ser vivo é dominado por um desejo de desfrute material e se torna enredado na vida material, ele fica sujeito às misérias triplas da existência material. Ele é igual uma semente semeada na terra. Se a semente for subjugada por muita água, não há possibilidade de frutificar. Similarmente, se uma pessoa for cativada por desfrute material, e mesmo se a semente de tal desfrute estiver dentro do coração da alma condicionada, ela pode ser subjugada por uma inundação de atividades transcendentais realizadas em amor de Deus. Desse modo sua semente potencial não pode frutificar dentro de uma vida condicionada da existência material. Os seres vivos condicionados no mundo material, especialmente na era de Kali, são subjugados pela inundação do amor de Deus inaugurada pelo Senhor Chaitanya e Seus associados.

Nessa conexão há um verso escrito por Sua Santidade Prabodhananda Sarasvati no seu livro Sri Chaitanya-chandramrita o qual afirma que pessoas materialistas são muito entusiasmadas em manter seus membros familiares, esposa e filhos, e que também existem muitos especuladores místicos que estão engajados em especular sobre liberação das misérias da vida material e que por isso se submetem a várias austeridades e penitências. Mas aqueles que descobriram o mais grandioso sabor transcendental no movimento do Senhor Chaitanya Mahaprabhu não têm mais gosto por tais atividades.

Aqueles que estão sob a impressão de que há contaminação material na forma da Suprema Personalidade de Deus e em Seu serviço devocional são chamados Mayavadi. De acordo com a especulação imperfeita deles, o Brahman impessoal é considerado a única existência na manifestação cósmica. Logo que a Suprema Personalidade de Deus é introduzida, eles consideram que Sua personalidade surge de maya, ou a energia material externa. Tais pessoas consideram todas encarnações do Supremo Senhor contaminadas por esta natureza material. De acordo com eles, o corpo material e as atividades da matéria que identificam o ser vivo são todas manifestações materiais. De acordo com eles, liberação significa o fim da identificação individual, ou do ser vivo puro. Em outras palavras, os Mayavadis mantêm que quando um ser vivo é liberado, ele se torna uno com o supremo Brahman impessoal. De acordo com tal filosofia Mayavadi, a Personalidade de Deus, Sua morada, Seu serviço devocional e Seus devotos afetivos estão todos sob o encanto de maya e conseqüentemente estão sujeitos à condição material. Aqueles que esquecem a natureza transcendental do Supremo Senhor, Sua morada, Seu serviço devocional e Seus devotos consideram tudo isso como apenas manifestações da atividade material. Quando alguém pensa que existe a possibilidade de argumentar sobre transcendência, ele é chamado de agnóstico, e quando ele acha que há possibilidade de criticar transcendência, ele é chamado ateu. O Senhor Chaitanya queria aceitar todos os tipos de agnósticos, ateus, céticos, incrédulos e engoli-los todos na inundação do amor de Deus. Por isso Ele aceitou a ordem de vida renunciada a fim de atrair todas essas forças.

O Senhor Chaitanya permaneceu como casado até Seu vigésimo quarto ano, e no vigésimo quinto ano da Sua vida, Ele aceitou a ordem da renúncia. Depois de aceitar a ordem da renúncia (sannyasa), Ele atraiu muitos outros sannyasis. Quando Ele propagou o movimento sankirtana como homem de família, muitos sannyasis Mayavadi não levavam Seu movimento muito a sério, mas depois do Senhor aceitar a ordem de vida sannyasa, Ele liberou estudantes especulativos, ateus e aqueles apegados a atividades lucrativas e criticismo desnecessário. O Senhor era tão bom que Ele aceitou todas essas pessoas e entregou a elas o fator mais importante na vida: amor de Deus.

Para cumprir Sua missão de conceder amor de Deus sobre as almas condicionadas, o Senhor Chaitanya idealizou muitos métodos para atrair essas pessoas desinteressadas no amor de Deus. Depois que Ele aceitou a ordem da renúncia, todos agnósticos, críticos, ateus e especuladores mentais se tornaram Seus alunos e seguidores. Mesmo muitos que não eram Hindus e que não seguiam os princípios Védicos aceitaram o Senhor Chaitanya como o professor supremo. As únicas pessoas que evitaram a misericórdia de Sri Chaitanya Mahaprabhu foram aqueles sannyasis que eram conhecidos como os filósofos Mayavadis de Benares. A condição desses filósofos Mayavadis é descrita por Sri Bhaktisiddhanta Sarasvati Goswami: "Os filósofos Mayavadis de Benares eram menos inteligentes porque queriam medir tudo por percepção direta. Mas tudo que é percebido é calculado por percepção material. A Verdade Absoluta é transcendência, mas de acordo com eles não existe variedade na transcendência, porque eles dizem aquilo que é cheio de variedade é maya".

Durante o tempo de Chaitanya Mahaprabhu também havia outros filósofos impersonalistas conhecidos como os filósofos Mayavadis de Saranatha. Saranatha é um lugar perto de Benares onde os filósofos Budistas costumavam residir, e até hoje existem muitos stupas dos Buddhistas Mayavadi que podem ser vistos. Os filósofos Mayavadis de Saranatha são diferentes dos impersonalistas que acreditam na manifestação impessoal do Brahman. De acordo com os filósofos de Saranatha, não existe nenhuma existência espiritual de nenhum modo. O fato é que tanto os filósofos Mayavadis de Benares quanto os filósofos de Saranatha estão enredados pela natureza material. Nenhum deles conhece realmente a natureza da Transcendência Absoluta. Apesar de superficialmente aceitarem os princípios Védicos e se considerarem transcendentalistas, os filósofos de Benares não aceitam variedade espiritual. Porque eles não têm informação sobre serviço devocional, eles são chamados não devotos, ou aqueles que são contra o serviço devocional do Senhor Krishna.

Os impersonalistas especulam sobre a Suprema Personalidade de Deus e Seus devotos e os sujeitam a testes da percepção direta. Todavia, o Senhor, Seu devoto e Seu serviço devocional não são sujeitos à percepção direta. Em outras palavras, variedade espiritual é desconhecida pela filosofia Mayavadi; por isso todos filósofos e sannyasis Mayavadi criticaram o Senhor Chaitanya quando Ele conduzia Seu movimento sankirtana. Eles ficaram surpresos ao ver o Senhor Chaitanya depois que Ele aceitou Sua ordem sannyasa de Keshava Bharati, porque Keshava Bharati pertencia à escola Mayavadi. Porque o Senhor Chaitanya assim pertencia à seita de sannyasis Mayavadi, os Mayavadis ficaram surpresos ao vê-Lo dedicado em cantar e dançar em vez de ouvir ou ler Vedanta, como é o costume. Os filósofos Mayavadi eram muito apreciadores do Vedanta, e eles o mal interpretam de seu próprio modo. Em vez de entender sua própria posição, eles criticavam o Senhor Chaitanya como um sannyasi desautorizado, e argumentavam porque Ele era um sentimentalista, Ele não era realmente um sannyasi fidedigno.

Todas essas críticas foram levadas para o Senhor Chaitanya quando Ele estava em Benares, e Ele não ficou surpreso com elas. Ele até mesmo riu quando a notícia foi levada a Ele. Ele não Se associou com os sannyasis Mayavadi mas permaneceu sozinho e executou Sua própria missão. Depois de permanecer por alguns dias em Benares, Ele partiu para Mathura.

     

      

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Dezoito

As Conversações com Prakashananda

De acordo com os princípios dos sannyasis Mayavadi, cantar, dançar e tocar instrumentos musicais são estritamente proibidos, porque são consideradas atividades pecaminosas. O sannyasi Mayavadi é simplesmente suposto a se dedicar no estudo do Vedanta. Por isso quando os sannyasis Mayavadi em Benares viram que o Senhor Chaitanya se entregava ao cantar, dançar, tocar instrumentos musicais e sempre cantava Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare, eles concluíram que Ele não era educado e que, por sentimentalismo, Ele desviava Seus seguidores. A regra de Shankaracharya era que um sannyasi devia sempre se dedicar no estudo do Vedanta e que deveria ficar satisfeito em ter apenas uma roupa e nada mais. Porque o Senhor Chaitanya nem estudava Vedanta formalmente nem cessava o cantar e dançar Ele foi criticado por todos os sannyasis em Benares, e também seus seguidores casados.

Quando o Senhor Chaitanya recebeu a notícia dessa crítica de Seus alunos e discípulos, Ele simplesmente sorriu e partiu para Mathura e Vrindavana. Quando Ele retornou novamente para Benares no Seu caminho de Mathura para Jagannatha Puri, Ele ficou na casa de Chandrashekhara, que era considerado um sudra porque era um funcionário público. Apesar disso, o Senhor Chaitanya Mahaprabhu estabeleceu Sua residência na casa dele. O Senhor Chaitanya não fazia distinções entre brahmanas e sudras; Ele aceitava qualquer um que era devotado. Habitualmente, um sannyasi é suposto a se abrigar e comer na casa de um brahmana, mas Chaitanya Mahaprabhu, que é a Suprema Personalidade de Deus independente, usou Seu critério próprio e decidiu ficar na casa de Chandrashekhara.

Naqueles dias, por mal usarem sua herança brahmana, os brahmanas aprovaram uma lei no sentido de que qualquer um não nascido numa família brahmana era considerado um sudra. Assim mesmo os ksatriyas e vaidyas também eram considerados sudras. Porque os vaidyas eram supostos descendentes de pais brahmana e esposas sudra, às vezes eram chamados sudras. Assim Chandrashekhara Acharya, embora nascido numa família vaidya, era chamado de sudra em Benares. Enquanto o Senhor Chaitanya ficou em Benares, Ele permaneceu na casa de Chandrashekhara, e Ele tomava Sua refeição na casa de Tapana Mishra.

Quando Sanatana Goswami encontrou o Senhor Chaitanya em Benares, ele aprendeu o processo e princípios do serviço devocional durante dois meses de ensinamento contínuo. As instruções para Sanatana Goswami foram descritas na primeira parte deste livro. Depois de receber estes ensinamentos, Sanatana Goswami foi autorizado para propagar os princípios do serviço devocional e Srimad Bhagavatam. Foi durante esse período que tanto Tapana Mishra quanto Chandrashekhara Acharia estavam muito tristes por causa das críticas pesadas contra o Senhor Chaitanya Mahaprabhu, e eles vieram juntos e imploraram para o Senhor encontrar os sannyasis Mayavadi.

"Nós ficamos mortificados ao ouvir as críticas desfavoráveis dos sannyasis Mayavadi contra Você", eles informaram o Senhor Chaitanya. "De fato, isso ficou intolerável para nós". Eles pediram para o Senhor fazer alguma coisa para que essas críticas pudessem cessar. Enquanto discutiam esse assunto, um brahmana veio até o Senhor Chaitanya e O convidou para sua casa. Todos os sannyasis foram convidados menos Chaitanya Mahaprabhu, e agora o brahmana veio para convidá-Lo. Ele sabia que o Senhor não Se associava com sannyasis Mayavadi, o brahmana caiu aos pés de Chaitanya Mahaprabhu e implorou a Ele: "Apesar de saber que Você não aceita convites, mesmo assim imploro que Você venha e tome prasada na minha casa com os outros sannyasis. Se Você aceitar este convite, eu considerarei um favor especial".

O Senhor aproveitou essa oportunidade e aceitou o convite do brahmana a fim de encontrar os sannyasis Mayavadi. Na verdade isso foi um arranjo feito pelo Senhor Ele mesmo. Apesar do brahmana que O convidou saber que o Senhor não aceitava nenhum convite, mesmo assim ele ficou muito ansioso para convidá-Lo.

No dia seguinte o Senhor Chaitanya foi para a casa do brahmana e viu que todos os sannyasis Mayavadi estavam sentados lá. Ele ofereceu Seus respeitos para todos os sannyasis como era de costume, e então foi lavar Seus pés. Depois de lavar, Ele sentou ao lado do local de lavar pés, um pouco distante dos outros sannyasis. Sentado ali, os sannyasis viram uma refulgência brilhante que emanava do corpo Dele. Atraídos por essa refulgência brilhante, todos os sannyasis Mayavadi levantaram e mostraram seus respeitos a Ele. Entre eles havia um sannyasi chamado Prakashananda Sarasvati. Ele era o líder entre os sannyasis impersonalistas, e ele se dirigiu ao Senhor Chaitanya com grande humildade, e pediu-Lhe que viesse sentar entre eles.

"Meu querido Senhor, por que Você está sentado nesse lugar imundo" ele perguntou. "Por favor venha e sente conosco".

"Ó, Eu pertenço a uma seita de sannyasis inferior", o Senhor Chaitanya respondeu. "Por isso Eu acho que não devo Me sentar com vocês. Deixe-Me ficar aqui embaixo mesmo".

Prakashananda ficou surpreso ao ouvir isso de um homem intelectual, e ele de fato pegou a mão do Senhor e pediu-Lhe para fazer o favor de vir e sentar com ele. Quando o Senhor Chaitanya finalmente sentou entre eles, Prakashananda Sarasvati disse, "eu acho que Seu nome é Sri Krishna Chaitanya, e eu entendo que Você pertence à nossa seita Mayavadi porque Você aceitou sannyasa de Keshava Bharati, que pertence à sampradaya Shankaracharya".

De acordo com a seita Shankara, existem dez nomes diferentes para sannyasis. Entre eles, três deles - Tirtha, Ashrama e Sarasvati - são dados aos sannyasis considerados os mais iluminados e cultos. Porque o Senhor Chaitanya era um Vaishnava, Ele era naturalmente humilde e pacífico, e Ele queria dar o melhor lugar de assento para Prakashananda, que pertencia à sampradaya Sarasvati. De acordo com os princípios Shankara, um brahmacari da escola Bharatic se chama Chaitanya. Entretanto, apesar de Sri Krishna Chaitanya Mahaprabhu aceitar sannyasa, Ele manteve Seu nome brahmacari e não adotou o título de Bharati.

"Bem, Senhor", Prakashananda Sarasvati continuou, "Você pertence à nossa seita Shankara, e Você vive em Benares - por que Você não Se mistura conosco? Qual é a razão? Outra coisa - Você é um sannyasi e é suposto de se engajar simplesmente no estudo do Vedanta, mas nós vemos que em vez disso Você sempre se engaja em cantar e dançar e tocar música. Qual é a razão? Essas são atividades de pessoas emotivas e sentimentais mas Você é um sannyasi qualificado. Por que não se dedicar ao estudo do Vedanta? Pela Sua refulgência nos parece que Você é justamente igual ao Narayana Supremo, a Personalidade de Deus, mas pelo Seu comportamento, Você parece ser outra coisa. Por isso nós somos inquisitivos para saber por que Você age desse modo".

"Meu querido senhor, Meu mestre espiritual me considerou um grande tolo" (Cc. Adi 7.71), o Senhor Chaitanya respondeu. "Por isso ele mais ou menos Me puniu ao dizer porque Eu sou tão tolo, Eu não tenho capacidade para estudar Vedanta. Assim em troca ele Me deu o cantar de Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Meu mestre espiritual Me disse, 'Justamente continue a cantar esse mantra Hare Krishna: ele O fará todo-perfeito'".

Na realidade o Senhor Chaitanya não era nem tolo nem ignorante dos princípios do Vedanta. Seu propósito foi demonstrar para a sociedade moderna que tolos que não têm histórico de penitência e austeridade não devem tentar estudar Vedanta justamente para algum propósito recreativo. Em Seu Shikshastaka, o Senhor Chaitanya disse que se deve estar num estado mental humilde, deve-se considerar inferior do que a grama na rua, deve-se ser mais tolerante do que uma árvore, e deve-se ser desprovido de todo senso de prestígio e pronto para oferecer todos os tipos de respeitos aos outros. Nesse estado da mente, pode-se cantar a filosofia Vedanta ou o santo nome de Deus constantemente. O Senhor também queria ensinar que um estudante sério da ciência transcendental deve seguir as palavras de seu mestre espiritual. De acordo com os cálculos do mestre espiritual, o Senhor Chaitanya parecia ser um tolo; por isso disse que Ele não devia Se entregar ao estudo do Vedanta mas devia continuar a cantar o mantra Hare Krishna. O Senhor Chaitanya estritamente obedeceu a essa ordem. Em outras palavras, o Senhor Chaitanya gravou nos Mayavadis que as palavras de um mestre espiritual fidedigno devem ser seguidas estritamente. Por segui-las, a pessoa se torna perfeita em todos aspectos.

Vedanta indica que a última palavra do conhecimento Védico é entender Krishna. Vedais ca sarvair aham eva vedyo vedanta-krd veda-vid eva caham: "Por todos os Vedas Eu sou para ser conhecido; de fato, Eu sou o compilador do Vedanta, e Eu sou o conhecedor dos Vedas" (Bg. 15.15). Quando alguém chega a entender o Vedanta realmente, ele chega a conhecer Krishna e sua relação com Krishna. Aquele que entender Krishna, entende tudo. O conhecedor de Krishna está sempre dedicado no serviço amoroso transcendental de Krishna. Isso é confirmado pelo Senhor Ele mesmo no Bhagavad-gita:

aham sarvasya prabhavo
mattah sarvam pravartate
iti matva bhajante mam
budha bhava-samanvitah

"Eu sou a fonte de todos os mundos espiritual e material. Tudo emana de Mim. Os sábios que conhecem isso perfeitamente se dedicam no Meu serviço devocional e Me adoram com todos seus corações" (Bg. 10.8).

Um ser vivo é eternamente relacionado com Krishna na relação de mestre e servo. Uma vez que esse serviço está em falta - ou, em outras palavras, quando alguém não está situado em Consciência de Krishna - deve-se ser entendido que estudo do Vedanta é insuficiente. Quando alguém não entende Krishna ou não se dedica no serviço amoroso transcendental, deve-se entender que ele é adverso para estudar Vedanta e para a compreensão da Suprema Personalidade de Deus. O caminho do estudo do Vedanta mostrado pelo Senhor Chaitanya deve ser seguido por todos. Uma pessoa que é enfatuada por assim chamada educação e que não tem humildade não procura a proteção de um mestre espiritual fidedigno. Ela pensa que não requer um mestre espiritual e que pode alcançar a perfeição máxima pelos seus próprios esforços. Pessoas assim não são elegíveis para estudo do Vedanta-sutra. Aqueles que estão sob o encanto da energia ilusória não seguem as instruções da sucessão discipular mas tentam manufaturar algo por conta própria e assim pisam fora da esfera do estudo do Vedanta. Um mestre espiritual fidedigno deve sempre condenar tais especuladores mentais independentes. Se o mestre espiritual fidedigno diretamente aponta a ingenuidade de um discípulo, não deve ser aceita de outra forma.

Uma pessoa que é completamente ignorante da ciência de Deus não pode ser considerada erudita. Mais ou menos, qualquer um que não esteja em Consciência de Krishna é sujeito à idiotice. Às vezes exibimos nossa ingenuidade por aceitar alguém que é escassamente educado como um mestre espiritual. É nosso dever entender a Suprema Personalidade de Deus, cujos pés de lótus são adorados por todos os Vedas. Aquele que não O compreende e é orgulhoso por um falso entendimento do Vedanta é realmente um idiota. Tentativas mundanas de conhecimento acadêmico são simplesmente outro tipo de idiotice. Enquanto alguém não conseguir entender a manifestação cósmica como uma representação dos três modos da natureza material, deve ser considerado estar na escuridão da embriaguez e preso na dualidade deste mundo material. Uma pessoa que está em conhecimento perfeito do Vedanta se torna um servidor do Supremo Senhor, que é o mantenedor e sustentador da manifestação cósmica inteira. Enquanto alguém não for transcendental para o serviço do limitado, não pode ter conhecimento do Vedanta.

Enquanto alguém estiver dentro da jurisdição limitada das atividades lucrativas ou esteja envolvido com especulação mental, talvez seja elegível para estudar ou ensinar o conhecimento teórico do Vedanta-sutra, mas não pode entender a suprema, eterna, vibração transcendental (completamente liberada) de Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Aquele que alcançou perfeição no cantar da vibração Hare Krishna transcendental não tem que separadamente aprender filosofia do Vedanta-sutra. De acordo com os ensinamentos do Senhor Chaitanya, o mestre espiritual fidedigno, aqueles que não entendem a vibração transcendental como não diferente do Supremo e que tentam se tornar filósofos Mayavadi ou peritos no Vedanta-sutra são todos idiotas. Estudar o Vedanta-sutra por seus próprios esforços (o processo ascendente de conhecimento) é outro sinal de idiotice. Aquele que alcançou um gosto por cantar a vibração transcendental, todavia, realmente alcança a conclusão do Vedanta. Nessa conexão, existem dois versos no Srimad Bhagavatam que são muito instrutivos. O significado do primeiro é que mesmo se uma pessoa de classe baixa estiver engajada em cantar a vibração transcendental, deve-se entender que executou todos os tipos de renúncia, austeridades e sacrifício e estudou todos os Brahma-sutras. Assim a pessoa pode ser capaz de cantar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. O significado do segundo verso é que alguém que canta as duas sílabas Ha-ri deve ser considerado que estudou todos os Vedas: o Rg Veda, Atharva Veda, Yajur Veda e Sama Veda.

Por outro lado, existem tantos assim chamados devotos que acham que o Vedanta não é destinado para devotos. Tais pessoas são ignorantes do fato que Vedanta é a única plataforma dos devotos puros. Todos os grandes acaryas das quatro sampradayas Vaishnava fizeram comentários sobre o Vedanta-sutra, mas os assim chamados devotos conhecidos como prakrta-sahajiya cuidadosamente evitam o estudo do Vedanta-sutra. Os prakrta-sahajiya erroneamente tomam os devotos puros e acaryas Vaishnava como especuladores mentais ou agentes lucrativos. Conseqüentemente eles próprios se tornam Mayavadis e deixam o serviço do Supremo Senhor.

Compreender o Vedanta-sutra por conhecimento acadêmico nunca capacita alguém para entender o valor da vibração transcendental. Pessoas que estão enredadas em conhecimento acadêmico são almas condicionadas confusas sobre os fatos do entendimento de "eu", "me" e "meu". Conseqüentemente elas são incapazes de desapegar suas mentes da energia externa. Quando uma pessoa realmente atinge conhecimento transcendental, ela se torna livre dessa dualidade e se engaja no serviço amoroso transcendental do Supremo Senhor. O serviço do Senhor é o único meio pelo qual alguém pode se tornar desapegado das atividades materiais. Uma pessoa propriamente iniciada por um mestre espiritual fidedigno e dedicada em cantar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare gradualmente se torna livre do conceito de "eu" e "meu" e se torna apegada ao serviço amoroso transcendental do Senhor em um dos cinco relacionamentos. Esse serviço transcendental não é assunto para corpos grosseiro e sutil. Somente quando alguém pode entender que não existe diferença entre o Supremo e Seu nome que ele pode estar situado em Consciência de Krishna. Nesse momento a pessoa não tem mais que fazer ajustes gramaticais. Em vez disso, ela se torna mais interessada em implorar para o Senhor: "Hare Krishna - ó meu Senhor, por favor me ocupe em Seu serviço"!

O Senhor Chaitanya explicou tudo isso para Prakashananda Sarasvati e lhe disse que Ele ouviu tudo isso de Seu mestre espiritual. Ele informou mais ainda Prakashananda Sarasvati que Seu mestre espiritual O ensinou que o Srimad Bhagavatam é o verdadeiro comentário sobre Vedanta-sutra, como afirmado no Srimad Bhagavatam por Vyasadeva, o autor do Vedanta-sutra.

Um estudante é considerado perfeito quando ele entende a identidade do santo nome e o Supremo Senhor. A menos que alguém esteja sob o abrigo de um mestre espiritual realizado, seu entendimento do Supremo é simplesmente tolice. Todavia, pode-se entender plenamente o Senhor transcendental por serviço e devoção. Quando o Senhor Chaitanya cantou o mantra Hare Krishna sem ofensas, Ele declarou que o mantra podia liberar imediatamente uma alma condicionada da contaminação material. Nesta era de Kali não existe alternativa para cantar esse maha-mantra. Está afirmado que a essência de toda a literatura Védica é o cantar desse santo nome de Krishna: Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. O Senhor Chaitanya também disse a Prakashananda Sarasvati, "A fim de Me convencer sobre esse fato essencial do conhecimento Védico, Meu mestre espiritual Me ensinou um verso do Brihan-naradiya Purana (38.126). Harer nama harer nama harer namaiva kevalam / kalau nasty eva nasty eva nasty eva gatir anyatha (Cc. Adi 17.21): Nesta era de briga e hipocrisia, o único meio de liberação é o cantar do santo nome do Senhor. Não existe outro modo. Não existe outro modo. Não existe outro modo".

Em três dos quatro milênios (chamados Satya-yuga, Treta-yuga e Dwapara-yuga) as pessoas tinham a honra de serem capazes para o entendimento da transcendência através do caminho da sucessão discipular. Entretanto, na era presente, pessoas não têm interesse na sucessão discipular. Em vez disso, elas inventaram muitos caminhos de lógica e argumento. Essa tentativa individual de entender a transcendência suprema (chamado processo ascendente) não é aprovada pelos Vedas. A Verdade Absoluta tem que descender da plataforma absoluta. Não é para ser entendida pelo processo ascendente. O santo nome do Senhor - Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare - é uma vibração transcendental porque vem da plataforma transcendental, a morada suprema de Krishna. Porque não existe diferença entre Krishna e Seu nome, o santo nome de Krishna é tão puro, perfeito e liberado quanto Krishna Ele mesmo. Intelectuais acadêmicos não têm entrada por meio de lógica e outro argumento dentro do entendimento da natureza transcendental do santo nome de Deus. O único caminho no entendimento da natureza transcendental de Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare é o cantar desses nomes com fé e aderência. Esse cantar libertará a pessoa das condições designadas que surgem dos corpos grosseiro e sutil.

Nesta era de lógica, argumento e desacordo, o cantar de Hare Krishna é o único meio para auto-realização. Porque essa vibração transcendental sozinha pode liberar a alma condicionada, é considerada a essência do Vedanta-sutra. De acordo com o conceito material, existe dualidade entre nome, forma, qualidade, emoções e atividades de uma pessoa e a pessoa ela própria, mas a respeito da vibração transcendental, não existe limite, porque ela descende do mundo espiritual. No mundo espiritual não existe diferença entre o nome da pessoa e a qualidade da pessoa. Claro que no mundo material existe uma diferença. Porque os filósofos Mayavadi não podem entender isso, eles não podem pronunciar a vibração transcendental.

O Senhor Chaitanya então disse a Prakashananda Sarasvati porque Ele recebeu a ordem de Seu mestre espiritual, Ele cantava constantemente Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. "Como resultado desse cantar", o Senhor disse, "Eu às vezes fico muito impaciente e não consigo Me conter de dançar e rir ou chorar e cantar. De fato, Eu fiquei igual um louco. Quando Eu imaginei primeiro se tinha ficado louco por cantar este Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare, Eu Me aproximei do Meu mestre espiritual e o informei que tinha ficado louco por cantar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Assim Eu perguntei a ele qual era a Minha posição real".

No Narada-pañcharatra está afirmado:

eso vedah sad-angani
chandamsi vividhah surah
sarvam astaksarantahstham
yac canyad api vanmayam
sarva-vedanta-sararthah
samsararnava-taranah

"Todos os rituais, mantras e entendimento Védicos estão comprimidos em oito palavras: Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare". Similarmente, no Kalisantarana Upanishad está afirmado:

hare krsna hare krsna
krsna krsna hare hare
hare rama hare rama
rama rama hare hare
iti sodasakam namnam
kali-kalmasa-nasanam
natah parataropayah
sarva-vedesu drsyate

"As dezesseis palavras - Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare - são especialmente destinadas para neutralizar as contaminações de Kali. Para se salvar das contaminações de Kali, não existe alternativa além do cantar dessas dezesseis palavras".

O Senhor Chaitanya informou Prakashananda Sarasvati que quando Seu mestre espiritual O entendeu, ele disse, "É a natureza transcendental dos santos nomes de Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare transportar uma pessoa para dentro da loucura espiritual. Qualquer um que cante sinceramente esse santo nome muito em breve atinge elevação à plataforma do amor de Deus e se tornar louca por Deus. Essa loucura que surge do amor de Deus é o primeiro estágio de perfeição para um ser humano".

Geralmente um ser humano está interessado em religião, desenvolvimento econômico, prazer sensual e liberação, mas amor de Deus está acima de tudo isso. Um mestre espiritual fidedigno canta os santos nomes - Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare - e a vibração sonora transcendental entra dentro do ouvido do discípulo, e se o discípulo seguir os passos de seu mestre espiritual e cantar o santo nome com respeito similar, ele realmente passa a adorar o nome transcendental. Quando o nome transcendental é adorado pelo devoto, o nome Ele próprio propaga Suas glórias dentro do coração de um devoto. Quando um devoto está perfeitamente qualificado no cantar da vibração transcendental do santo nome, ele fica bem adequado para se tornar um mestre espiritual e liberar todas as pessoas do mundo. O cantar do santo nome é tão poderoso que gradualmente estabelece sua supremacia sobre tudo no mundo. O devoto que o canta se torna situado transcendentalmente em êxtase e às vezes ri, chora e dança em seu êxtase. Às vezes o ininteligente põe obstáculos no caminho do cantar deste maha-mantra, mas aquele que está situado na plataforma do amor do Supremo canta o santo nome alto para todos os interessados. Como resultado, todos se tornam iniciados no cantar dos santos nomes - Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Por cantar e ouvir os santos nomes de Krishna, uma pessoa pode lembrar as formas e qualidades de Krishna.

     

       

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Dezenove

Mais Conversas com Prakashananda

O apego extático transcendental por Krishna que resulta de entender perfeitamente que pessoa Krishna e nome são idênticos se chama bhava. Aquele que atingiu bhava é certamente não contaminado pela natureza material. Ele realmente desfruta prazer transcendental de bhava, e quando bhava é intensificado, ele se chama amor do Supremo. O Senhor Chaitanya disse a Prakashananda Sarasvati que o santo nome de Krishna, chamado o maha-mantra (grande canto), capacita aquele que o canta para obter o estágio de amor do Supremo, ou bhava intensificado. Esse amor do Supremo é a última necessidade humana, porque quando alguém a compara com outras necessidades (chamadas religião, desenvolvimento econômico, prazer sensual e liberação), essas outras assim chamadas necessidades parecem ser as mais insignificantes. Quando alguém está absorto na existência designada temporária, ele anseia por prazer sensual e liberação. Todavia, amor do Supremo é a natureza eterna da alma; é imutável, sem começo e sem fim. Por isso que prazer sensual temporário ou um desejo por liberação não pode se comparar com a natureza transcendental do amor de Deus. Amor de Deus é a quinta dimensão no empreendimento humano. Comparado com o oceano de amor do prazer transcendental, o conceito do Brahman impessoal não é mais significativo do que uma gota de água.

O Senhor Chaitanya depois explicou que Seu mestre espiritual confirmou a validade de Seu êxtase que resultou do Seu cantar do santo nome de Deus e também confirmou que toda a essência de toda a literatura Védica é a obtenção do amor do Supremo. O mestre espiritual do Senhor Chaitanya disse que o Senhor foi afortunado o bastante para atingir amor do Supremo. Por alcançar esse amor transcendental, o coração da pessoa fica muito ansioso para obter contato direto com o Senhor. Com esse sentimento transcendental, a pessoa às vezes ri e às vezes chora, canta e dança feito um louco, e às vezes atravessa aqui e ali. Desse modo existem vários sintomas extáticos evidenciados: chorar, mudar a tonalidade corpórea, loucura, despojamento, silêncio, orgulho, êxtase e gentileza. Freqüentemente a pessoa em amor com Deus dança, e essa dança a coloca no oceano de néctar do amor de Krishna.

O Senhor Chaitanya disse que Seu mestre espiritual Lhe disse: "É muito bom que Você atingiu esse estágio de perfeição do amor do Supremo. Por causa da Sua conquista, eu sou muitíssimo grato a Você". O pai se torna mais animado quando ele vê seu filho avançar além dele mesmo. Similarmente, o mestre espiritual sente mais prazer em ver seu discípulo avançar em vez dele mesmo avançar". Assim o mestre espiritual do Senhor Chaitanya O abençoou, por dizer a Ele "dance, cante, propague este movimento sankirtana, e por instruir as pessoas sobre Krishna, tente libertá-las da ignorância". O mestre espiritual do Senhor Chaitanya também O ensinou o seguinte verso do Srimad Bhagavatam (11.2.40):

evam-vratah sva-priya-nama-kirtya
jatanurago druta-citta uccaih
hasaty atho roditi rauti gayaty
unmada-van nrtyati loka-bahyah

"Uma pessoa que está constantemente dedicada no serviço devocional para Krishna e que canta Seu santo nome se torna tão transcendentalmente apegada pelo cantar que seu coração se torna suavizado sem esforço extrínseco. Quando isso acontece, ela exibe êxtases transcendentais e às vezes ri, às vezes chora, canta e dança - não exatamente de forma artística, mas justamente igual um louco".

O Senhor Chaitanya informou mais ainda Prakashananda Sarasvati: "Porque Eu tenho fé plena nas palavras do Meu mestre espiritual, Eu estou sempre engajado em cantar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Eu não sei exatamente como eu fiquei justamente igual um louco, mas Eu acredito que o nome de Krishna Me induziu. Eu realizo que o prazer transcendental derivado de cantar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare é justamente igual um oceano. Em comparação, todos os outros prazeres, inclusive o prazer da realização impessoal, são como água rasa em canais".

Parece pelas conversas do Senhor Chaitanya, uma pessoa que não mantém sua fé nas palavras do mestre espiritual e que age independentemente não pode atingir o sucesso desejado em cantar Hare Krishna. Nas literaturas Védicas é dito que o significado de toda literatura transcendental é revelado para aquele que tem fé inabalada no Supremo Senhor e em seu mestre espiritual. O Senhor Chaitanya acreditava firmemente nas declarações de Seu mestre espiritual, e Ele nunca negligenciou as instruções de Seu mestre espiritual por parar Seu movimento sankirtana. Assim a potência transcendental do santo nome O encorajou mais e mais a cantar Hare Krishna, o maha-mantra.

O Senhor Chaitanya imediatamente informou Prakashananda que na era moderna pessoas em geral são mais ou menos desprovidas de intelecto espiritual. Quando tais pessoas caem sob a influência da filosofia (impersonalista) Mayavadi de Shankaracharya antes de começar o mais confidencial Vedanta-sutras, sua tendência natural em direção à obediência para o Senhor é impedida. A suprema fonte de tudo é naturalmente respeitada por todos, mas essa tendência natural é dificultada quando alguém aceita os conceitos impersonalistas de Shankara. Por isso o mestre espiritual do Senhor Chaitanya sugeriu que é melhor ninguém estudar o Shariraka-bhashya de Shankaracharya, porque ele é muito prejudicial para pessoas em geral. De fato, a pessoa comum nem mesmo tem a inteligência para penetrar dentro do malabarismo de palavras. Ela é aconselhada a cantar o maha-mantra: Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Nesta era de Kali briguenta não existe nenhuma alternativa para auto-realização.

Depois de ouvir os argumentos e conversas de Chaitanya Mahaprabhu, todos os sannyasis Mayavadi que estavam presentes ficaram tranqüilizados e responderam com palavras doces: "Querido Senhor, o que Você falou é tudo verdade. A pessoa que atinge amor do Supremo é certamente muito afortunada, e indubitavelmente Você é muito afortunado por atingir esse estágio. Mas qual é o problema no Vedanta? É dever de um sannyasi ler e entender Vedanta. Por que Você não o estuda"?

De acordo com os filósofos Mayavadis, Vedanta se refere ao comentário Shariraka de Shankaracharya. Quando os filósofos impersonalistas se referem ao Vedanta e Upanishads, eles na verdade se referem aos comentários de Shankaracharya, o maior professor de filosofia Mayavadi. Depois de Shankaracharya veio Sadananda-yogi, o qual declarou que o Vedanta e Upanishads devem ser entendidos através dos comentários de Shankaracharya. Realmente, isso não é assim. Existem muitos comentários sobre Vedanta e Upanishads feitos pelos acaryas Vaishnava, e esses são preferidos do que os de Shankaracharya. Entretanto, os filósofos Mayavadis influenciados por Shankaracharya não atribuem nenhuma importância para os entendimentos Vaishnava.

Existem quatro seitas de acharyas Vaishnava - a Suddhadwaita, Vashistadwaita, Dwaitadwaita e Achintya-bhedabheda. Todos os acharyas Vaishnava nessas escolas escreveram comentários sobre o Vedanta-sutra, mas os filósofos Mayavadis não os reconhecem. Os Mayavadis distinguem entre Krishna e o corpo de Krishna, e por isso eles não reconhecem a adoração de Krishna pelos filósofos Vaishnava. Por isso quando os sannyasis Mayavadi perguntaram ao Senhor Chaitanya por que Ele não estuda Vedanta-sutra, o Senhor respondeu, "Queridos senhores, vocês perguntaram por que Eu não estudo Vedanta, e em resposta a isso Eu falarei algo, mas temo que vocês ficarão tristes ao ouvir".

"Nós ficaremos muito felizes de ouvi-Lo", todos os sannyasis responderam. "Você apareceu justamente igual Narayana, e Suas falas são tão boas que sentimos grande prazer nelas. Nós somos muitíssimos gratos de vê-Lo e ouvi-Lo. Por isso nós devemos ficar muito felizes de ouvir pacientemente e aceitar qualquer coisa que Você disser".

O Senhor então começou a falar sobre a filosofia Vedanta como se segue: Vedanta-sutra é falado pelo Supremo Senhor Ele mesmo. O Supremo Senhor, em Sua encarnação como Vyasadeva, compilou esse grande tratado filosófico. Porque Vyasadeva é uma encarnação do Supremo Senhor, ele não pode ser comparado a uma pessoa ordinária, que tem os quatro defeitos os quais surgem devido ao contato com a existência material. Os defeitos da alma condicionada são: (1) deve cometer erros; (2) deve ficar iludido; (3) deve possuir a tendência de enganar outros; e (4) todos os seus sentidos devem ser imperfeitos. Nós devemos entender que a encarnação de Deus é transcendental a todos esses defeitos. Assim qualquer coisa que foi falada ou escrita por Vyasadeva é considerada perfeita. Os Upanishads e Vedanta-sutra se destinam ao mesmo objetivo: a Suprema Verdade Absoluta. Quando aceitamos o significado do Vedanta-sutra e dos Upanishads como eles estão afirmados, nós nos tornamos glorificados. Os comentários feitos por Shankaracharya, entretanto, são indiretos e são muito perigosos para a pessoa comum ler, porque se entender o significado dos Upanishads dessa forma indireta, maneira disruptiva, a pessoa praticamente barra si mesma da realização espiritual.

De acordo com o Skanda e Vayu Puranas, a palavra sutra se refere a uma obra condensada que carrega significado e importância de poder imensurável sem erro ou falha. A palavra vedanta significa "o fim do conhecimento Védico". Em outras palavras, qualquer livro que trata da matéria indicada por todos os Vedas se chama Vedanta. Por exemplo, Bhagavad-gita é Vedanta porque no Bhagavad-gita o Senhor diz que o objetivo último da busca Védica é Krishna. Por isso Bhagavad-gita e Srimad Bhagavatam, que almejam somente Krishna, devem ser entendidos como Vedanta.

Na realização transcendental existem três divisões de conhecimento chamadas prasthana-traya. Esse departamento do conhecimento que é provado pela instrução Védica (como os Upanishads) se chama sruti-prasthana. Livros autênticos que indicam o objetivo último e escritos por almas liberadas como Vyasadeva (por exemplo, Bhagavad-gita, Mahabharata e os Puranas, especialmente Srimad Bhagavatam, o Maha-Purana) são chamados smrti-prasthana. Das literaturas Védicas entendemos que os Vedas originaram da respiração de Narayana. Vyasadeva, que é uma encarnação do poder de Narayana, compilou o Vedanta-sutra (nyaya-prasthana), mas de acordo com os comentários de Shankara, Apantaratama Rishi também é creditado por ter compilado os códigos do Vedanta-sutra. De acordo com o Senhor Chaitanya, os códigos do Pañcharatra e os códigos do Vedanta são um e o mesmo. Porque o Vedanta-sutra é compilado por Vyasadeva, deve-se entender que foi falado por Narayana Ele mesmo. De todas as literaturas descritivas que tratam do Vedanta-sutra, parece que há muitos outros rsis contemporâneos de Vyasadeva que também discutiram Vedanta-sutra. Esses sábios eram Atreya, Asmarathya, Audulomi, Karsnajini, Kasakrtsna, Jaimini, Badari e outros sábios como Parasari e Karmandi.

Na realidade nos dois primeiros capítulos do Vedanta-sutra o relacionamento entre os seres vivos e o Supremo Senhor é explicado, e no Terceiro Capítulo a execução do serviço devocional é explicada. O Quarto Capítulo trata da relação que resulta da execução do serviço devocional. O comentário natural do Vedanta-sutra é o Srimad Bhagavatam. Os grandes acaryas das quatro comunidades Vaishnava (sampradayas) - chamados Ramanujacharya, Madhwacharya, Vishnuswami e Nimbarka - também escreveram comentários sobre o Vedanta-sutra por seguir os princípios do Srimad Bhagavatam. No presente, os seguidores de todos os acaryas escreveram muitos livros que seguem os princípios do Srimad Bhagavatam como o comentário do Vedanta. O comentário de Shankara sobre Vedanta-sutra, conhecido como Shariraka-bhashya, é muito adorado por intelectuais impersonalistas, mas comentários sobre o Vedanta escritos do ponto de vista materialista são completamente adversos ao serviço transcendental do Senhor. Conseqüentemente o Senhor Chaitanya disse que comentários diretos sobre os Upanishads e Vedanta-sutra são gloriosos, mas qualquer um que segue o caminho indireto do Shariraka-bhashya de Shankaracharya está certamente arruinado.

O Senhor Chaitanya admitiu que Shankaracharya era uma encarnação do Senhor Shiva. E é sabido que o Senhor Shiva é um dos grandes devotos (um mahajana) da escola Bhagavata. Existem doze grandes autoridades sobre serviço devocional, e o Senhor Shiva é uma delas. Por que, então, ele adotou o processo da filosofia Mayavadi? A resposta é dada no Padma Purana, onde o Senhor Shiva afirma:

mayavadam asac-chastram
pracchannam bauddham ucyte
mayaiva kalpitam devi
kalau brahmana-rupina

"A filosofia Mayavadi é Budismo velado". Em outras palavras, a filosofia do vazio de Buddha é mais ou menos repetida na filosofia Mayavadi do impersonalismo, apesar da filosofia Mayavadi alegar ser dirigida pelas conclusões Védicas. O Senhor Shiva, todavia, admite que essa filosofia é manufaturada por ele nesta era de Kali a fim de confundir os ateístas. "Na realidade a Suprema Personalidade de Deus tem Seu corpo transcendental", o Senhor Shiva afirma. "Mas eu descrevo o Supremo como impessoal. Eu também explico Vedanta-sutra de acordo com os mesmos princípios da filosofia Mayavadi".

No Shiva Purana o Supremo Senhor diz:

dvaparadau yuge bhutva
kalaya manusadisu
svagamaih kalpitais tvam ca
janan mad-vimukhan kuru

"No começo de Dwapara-yuga, diretamente por Minhas ordens, muitos sábios confundirão as pessoas em geral pela filosofia Mayavadi". No Padma Purana o Senhor Shiva diz pessoalmente a Bhagavatidevi:

srnu devi paraksyami
tamasani yatha-kramam
yesam sravana-matrena
patityam jñaninam api
apartham sruti-vakyanam
darsayal loka-garhitam
karma-svarupa-tyajyatvam
atra ca pratipadyate
sarva-karma-paribhramsan
naiskarmyam tatra cocyate
paratma jivayor aikyam
mayatra pratipadyate

"Minha querida Devi, às vezes eu ensino filosofia Mayavadi para aqueles que estão absortos no modo da ignorância. Mas se uma pessoa no modo da bondade por acaso ouvir essa filosofia Mayavadi, ela cai, porque quando eu ensino filosofia Mayavadi, eu digo que o ser vivo e o Supremo Senhor são um e o mesmo".

Sadananda-yogi, um dos maiores acaryas Mayavadi, escreveu em seu livro, Vedanta-sara: "A Verdade Absoluta de eternidade, conhecimento e bem-aventurança é Brahman. Todos produtos dos três modos da natureza material são cobertos por ignorância, e todos são diferentes da suprema causa e efeito. Essa ignorância é manifestada num senso coletivo e individual. Ignorância coletiva é chamada visuddha-sattva-pradhana. Quando essa visuddha-sattva-pradhana se manifesta dentro da ignorância da natureza material, é chamada o Senhor, e o Senhor manifesta todos tipos de ignorância. Por isso Ele é conhecido como sarvajña". Assim de acordo com a filosofia Mayavadi, o Senhor é um produto desta natureza material, e o ser vivo está no estágio mais baixo da ignorância. Essa é a soma e substância da filosofia Mayavadi.

Se, todavia, aceitarmos o significado dos Upanishads diretamente, é claro que a Suprema Personalidade de Deus é uma pessoa com potência ilimitada. Por exemplo, no Shwetashvatara Upanishad é dito que a Suprema Personalidade de Deus é a origem de tudo e que Ele tem potências múltiplas. A Suprema Personalidade de Deus é transcendental à manifestação cósmica. Ele é a origem de toda religião, o libertador supremo e o possuidor de todas opulências. A Suprema Personalidade de Deus, que é justamente igual ao Sol, distribui profusamente Suas energias enquanto situado além da nuvem desta manifestação cósmica material. Ele é o mestre de todos os mestres, e Ele é o Supremo de todos supremos. Ele é conhecido como o melhor Senhor, a Personalidade de Deus. Suas energias e potências são múltiplas e distribuídas variadamente. Também está afirmado que Vishnu é o Supremo e que pessoas santificadas estão sempre ansiosas para ver Seus pés de lótus (Rg Veda 1.22.20). No Aitareya Upanishad também está afirmado que a manifestação cósmica surgiu quando o Senhor olhou sobre a natureza material (1.1.1-2). Isso também é verificado pelo Prashna Upanishad (6.3).

Nas descrições negativas do Senhor que ocorrem na literatura Védica (como no apani-padah) há indicações de que o Senhor não tem nenhum corpo material e nenhuma forma material. Todavia, Ele tem Seu corpo transcendental espiritual e Sua forma transcendental. Porque os filósofos Mayavadis interpretam errado Sua natureza transcendental, eles O explicam como impessoal. O nome, forma, qualidade, associados e residência do Senhor estão todos no mundo transcendental. Como Ele pode ser uma transformação desta natureza material? Tudo conectado com o Supremo Senhor é eterno, bem-aventurado e pleno de conhecimento.

De fato, Shankaracharya pregou filosofia Mayavadi com o propósito de confundir um certo tipo de ateísta. Na realidade ele nunca considerou o Supremo Senhor, a Personalidade de Deus, como impessoal ou de não ter corpo ou forma. É melhor para pessoas inteligentes evitarem palestras sobre filosofia Mayavadi. Nós devemos entender que a Suprema Personalidade de Deus Vishnu não é impessoal. Ele é uma pessoa transcendental, e o princípio básico da manifestação cósmica é Sua energia. A filosofia Mayavadi não pode traçar a energia do Supremo Senhor, mas todas literaturas Védicas dão evidência das várias manifestações energéticas do Supremo Senhor. Vishnu não é um produto da natureza material, mas a natureza material é um produto da potência de Vishnu. Os filósofos Mayavadis entendem Vishnu como um produto da natureza material, mas se Ele for um produto da natureza material, Ele só pode ser contado entre os semideuses. Aquele que considera Vishnu como um semideus está certamente equivocado e enganado. Como isso acontece é explicado no Bhagavad-gita: "Iludidos pelos três modos, o mundo inteiro não Me conhece Eu que sou acima dos modos e inexaurível. Esta Minha energia divina, que consiste dos três modos da natureza material, é difícil de superar, mas aquele que se rendeu a Mim pode atravessá-la facilmente" (Bg. 7.13-14).

     

     

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Vinte

O Objetivo do Estudo do Vedanta

É concluído que o Senhor Krishna, ou Vishnu, não é deste mundo material. Ele pertence ao mundo espiritual. Aquele que O considera como um semideus material é um grande ofensor e blasfemador. O Senhor Vishnu não é sujeito à percepção pelos sentidos materiais, nem Ele pode ser realizado por especulação mental. Não existe diferença entre o corpo e alma do Supremo Senhor Vishnu, embora no mundo material sempre existe uma diferença entre o corpo e a alma.

Coisas materiais são desfrutadas por seres vivos porque os seres vivos são superior, enquanto natureza material é da qualidade inferior. Assim a qualidade superior, os seres vivos, podem desfrutar a qualidade inferior, matéria. Porque o Senhor Vishnu não está em nenhum caminho tocado por matéria, Ele não é sujeito para desfrutar natureza material do modo que os seres vivos fazem. Os seres vivos não podem atingir Vishnu por desfrutarem seus hábitos de especulação mental. Os seres vivos infinitesimais não são desfrutadores de Vishnu, mas eles são desfrutados por Vishnu. Só o maior ofensor acha que Vishnu é desfrutado. A maior blasfêmia é considerar Vishnu e o ser vivo no mesmo nível.

A Suprema Verdade Absoluta, a Personalidade de Deus, é comparada a um fogo ardente, e os inumeráveis seres vivos são comparados a fagulhas que emanam desse fogo. Embora tanto o Supremo Senhor quanto os seres vivos sejam qualitativamente fogo, ainda assim há uma distinção. Vishnu o Supremo é infinito, enquanto os seres vivos, que são só fagulhas, são infinitesimais. Os seres vivos infinitesimais são emanações do espírito infinito original. Em sua posição constitucional como espíritos infinitesimais, não existe traço de matéria.

Os seres vivos não são tão grandiosos quanto Narayana, Vishnu, que está além desta criação material. Mesmo Shankaracharya aceita Narayana como além da criação material. Porque nem Vishnu nem o ser vivo são da criação material, alguém pode perguntar, "Por que as pequenas partículas de espírito foram criadas então"? A resposta é que a Verdade Absoluta Suprema é completa em Sua perfeição quando Ele é tanto infinito quanto infinitesimal. Se Ele fosse simplesmente infinito e não fosse infinitesimal, Ele não seria perfeito. A porção infinita é Vishnu-tattva, ou a Suprema Personalidade de Deus, e a porção infinitesimal é o ser vivo.

Devido aos desejos infinitos da Suprema Personalidade de Deus, há existência no mundo espiritual, e devido aos desejos infinitesimais do ser vivo, há existência no mundo material. Quando os seres vivos infinitesimais são engajados em seus desejos infinitesimais por desfrute material, eles são chamados de jiva-sakti, mas quando eles são encaixados com o infinito, são chamados almas liberadas. Por isso não há necessidade de perguntar, portanto, por que Deus criou porções infinitesimais; elas são simplesmente o lado complementar do Supremo. É sem dúvida essencial para o infinito ter porções infinitesimais que são partes e parcelas da alma suprema. Porque os seres vivos são partes e parcelas infinitesimais do Supremo, há uma reciprocidade de sentimentos entre o infinito e o infinitesimal. Se não existissem seres vivos infinitesimais, o Supremo Senhor seria inativo, e não haveria variedade na vida espiritual. Não há sentido para um rei se não houverem súditos, e não há sentido para o Deus Supremo se não houverem seres vivos infinitesimais. Como pode haver significado para a palavra "senhor" se não existe ninguém para reinar sobre? A conclusão é que os seres vivos são considerados expansões da energia do Supremo Senhor, e o Supremo Senhor, a Personalidade de Deus, Krishna, é o energético.

Em todas literaturas Védicas, inclusive Bhagavad-gita e Vishnu Purana, muita evidência é dada para distinguir entre energia e energético. No Bhagavad-gita (Bg. 7.4) está claramente afirmado que terra, água, fogo, ar e éter são os cinco elementos grosseiros principais do mundo material e que mente, inteligência e ego falso são os três elementos sutis. Toda a natureza material é dividida nesses oito elementos que juntos compreendem a natureza inferior, ou energia, do Senhor. Outro nome para esta natureza inferior é maya, ou ilusão. Além desses oito elementos inferiores existe a energia superior, que é chamada para-prakrti. Essa para-prakrti é o ser vivo, o qual é encontrado em grandes números por todo o mundo material. Ele é indicado no Bhagavad-gita (Bg. 7.5) como jiva-bhutam. O significado é que o Supremo Senhor é a Verdade Absoluta, o energético, e assim Ele tem Suas energias. Quando Sua energia não é manifestada propriamente, ou quando é coberta por alguma sombra, é chamada maya-sakti. A manifestação cósmica material é um produto dessa maya-sakti coberta.

Os seres vivos são realmente além desta energia inferior coberta. Eles têm sua existência espiritual pura e sua identidade pura, e também suas atividades mentais puras. Todas elas estão além da manifestação deste cosmos material. Embora a mente, inteligência e corpo do ser vivo estão fora do alcance deste mundo material, quando ele entra dentro deste mundo material devido a seu desejo de dominar matéria, sua mente, inteligência e corpo originais ficam cobertos pela energia material. Quando ele é novamente descoberto destas energias material ou inferior, ele é chamado liberado. Quando é liberado, ele não tem ego falso, mas seu ego real novamente vem na existência. Especuladores mentais ingênuos acham que depois da liberação a identidade é perdida, mas isso não é assim. Porque o ser vivo é eternamente parte e parcela de Deus, quando é liberado, revive sua identidade parte e parcela, original e eterna. A realização de aham brahmasmi ("eu não sou este corpo") não significa que o ser vivo perde sua identidade. No presente momento uma pessoa pode se considerar matéria, mas em seu estado liberado ela entenderá que não é matéria mas alma espiritual, parte e parcela do infinito. Para se tornar consciente de Krishna ou espiritualmente consciente e se dedicar no serviço amoroso transcendental de Krishna são sinais do estágio liberado. No Vishnu Purana (6.7.61) está claramente afirmado:

visnu-saktih para prokta
ksetra-jñakhya tatha para
avidya-karma-samjñanya
trtiya saktir isyate

(Cc. Madhya 6.154)

"A energia do Supremo Senhor é dividida em três: para, ksetrajña e avidya". A energia para é realmente a energia do Supremo Senhor Ele mesmo; a energia ksetrajña é o ser vivo; e a energia avidya é o mundo material, ou maya. É chamada avidya, ou ignorância, porque sob o encanto desta energia material a pessoa esquece sua posição verdadeira e seu relacionamento com o Supremo Senhor. A conclusão é que os seres vivos representam uma das energias do Supremo Senhor, e como partes e parcelas infinitesimais do Supremo, são chamados jivas. Se os jivas forem colocados artificialmente no mesmo nível com o infinito Supremo - porque ambos são Brahman, ou espírito - desorientação certamente será o resultado.

Geralmente filósofos Mayavadis ficam perplexos perante um Vaishnava erudito porque os Mayavadis não podem explicar a causa do cativeiro dos seres vivos. Eles simplesmente dizem, "É devido à ignorância", mas não podem explicar por que os seres vivos são cobertos pela ignorância se são supremos. A razão verdadeira é que os seres vivos, apesar de qualitativamente unos com o Supremo, são infinitesimais, e não infinitos. Se eles fossem infinitos, não haveria possibilidade de serem cobertos pela ignorância. Porque o ser vivo é infinitesimal, ele é coberto por uma energia inferior. A ingenuidade e ignorância dos Mayavadis são reveladas quando eles tentam explicar como o infinito é coberto pela ignorância. É ofensivo tentar qualificar o infinito como sujeito ao encanto da ignorância.

Apesar de Shankara tentar cobrir o Supremo Senhor com sua filosofia Mayavadi, ele simplesmente seguiu a ordem do Supremo Senhor. Deve-se entender que seus ensinamentos eram uma necessidade temporária mas não um fato permanente. No Vedanta-sutra a distinção entre a energia e o energético é aceita desde o próprio começo. Nesse Vedanta-sutra o primeiro aforismo (janmady asya) (Bhag. 1.1.1) explica claramente que a Verdade Absoluta Suprema é a origem ou fonte de todas as emanações. Assim as emanações são a energia do Supremo, enquanto o Supremo Ele mesmo é o energético. Shankara argumentou falsamente se a transformação de energia for aceita, a Verdade Absoluta Suprema não pode permanecer imutável. Mas isso não é verdade. Apesar do fato que energia ilimitada está sempre sendo gerada, a Verdade Absoluta Suprema permanece sempre a mesma. Ele não é afetado pela emanação de energias ilimitadas. Shankaracharya portanto estabeleceu incorretamente sua teoria da ilusão.

Ramanujacharya discutiu esse ponto muito bem: "Se você argumenta que antes da criação deste mundo material existia somente uma Verdade Absoluta, então como é possível que o ser vivo emanou Dele? Se Ele era sozinho, como Ele produziu ou gerou os seres vivos infinitesimais"? Em resposta a essa pergunta, os Vedas afirmam que tudo é gerado pela Verdade Absoluta, tudo é mantido pela Verdade Absoluta, e, depois da aniquilação, tudo entra dentro da Verdade Absoluta. Dessa afirmação fica claro que os seres vivos entram dentro da existência suprema quando são liberados, e eles não mudam sua posição constitucional original.

Devemos lembrar que o Supremo Senhor tem Sua função criativa e que os seres vivos infinitesimais têm suas funções criativas também. Não é que sua função criativa é perdida quando são liberados e entram dentro do Supremo depois da dissolução do corpo material. Ao contrário, a função criativa do ser vivo é propriamente manifestada no estado liberado. Se as atividades do ser vivo são manifestas mesmo quando ele está condicionado materialmente, então como é possível que suas atividades parem quando alcança a liberação? A entrada do ser vivo no estado de liberação pode ser comparado a um pássaro que entra numa árvore, ou um animal que entra na floresta, ou um avião que entra no céu. Em nenhum caso a identidade é perdida.

Quando explicou o primeiro aforismo do Vedanta-sutra, Shankara muito sem cerimônia tentou explicar que Brahman, ou a Verdade Absoluta Suprema, é impessoal. Ele também astuciosamente tentou trocar a doutrina do subproduto pela doutrina da mudança. Para a Verdade Absoluta Suprema, não existe mudança. É simplesmente que um subproduto resulta de Seus inconcebíveis poderes de ação. Em outras palavras, uma verdade relativa é produzida da Verdade Suprema. Quando uma cadeira é produzida de madeira crua, é dito que um subproduto foi produzido. A Verdade Absoluta Suprema, Brahman, é imutável, e quando encontramos um subproduto - o ser vivo ou esta manifestação cósmica - é uma transformação, ou um subproduto do Supremo. É igual leite a ser transformado em iogurte. Desse modo, se nós estudarmos os seres vivos dentro da manifestação cósmica, parecerá que eles não são diferentes da Verdade Absoluta original, mas das literaturas Védicas nós entendemos que a Verdade Absoluta original tem variedades de energia e que os seres vivos e a manifestação cósmica são apenas demonstrações de Suas energias. As energias não são separadas do energético; portanto o ser vivo e a manifestação cósmica são verdades inseparáveis, parte da Verdade Absoluta. Essa conclusão a respeito da Verdade Absoluta e a verdade relativa deve ser aceitável por qualquer pessoa sensata.

A Verdade Absoluta Suprema tem Sua potência inconcebível, da qual este cosmos foi manifestado. Em outras palavras, a Verdade Absoluta Suprema é o ingrediente, e o ser vivo e manifestação cósmica são os subprodutos. No Taittiriya Upanishad está claramente afirmado, yato va imani bhutani jayante: "A Verdade Absoluta é o reservatório original de todos ingredientes, e este mundo material e seus seres vivos são produzidos desses ingredientes".

Pessoas não inteligentes não podem entender como a manifestação cósmica e o ser vivo são simultaneamente unos e diferentes da Verdade Absoluta. Sem entender isso, conclui-se, por medo, que esta manifestação cósmica e o ser vivo são falsos. Shankaracharya dá o exemplo da corda confundida com uma serpente, e às vezes o exemplo de confundir uma concha de ostra com ouro são citados, mas com certeza esses argumentos são modos de enganar. Como mencionado no Mandukya Upanishad, os exemplos da corda por uma serpente e a ostra por ouro têm suas aplicações diferentes e podem ser entendidos como se segue. O ser vivo em sua posição constitucional original é espírito puro. Quando um ser humano se identifica com o corpo material, pode-se dizer que ele confunde uma corda com uma serpente, ou uma concha de ostra com ouro. A doutrina da transformação é aceita quando uma coisa é confundida com outra. Na realidade o corpo não é o ser vivo, mas a doutrina da transformação aceita o corpo como o ser vivo. Toda alma condicionada é indubitavelmente contaminada por essa doutrina da transformação.

O estado condicionado do ser vivo é sua condição doentia. Originalmente o ser vivo e a causa original desta manifestação cósmica existem fora do estado de transformação. Entretanto, pensamentos e argumentos equivocados podem dominar uma pessoa quando ela esquece as energias inconcebíveis do Supremo Senhor. Mesmo no mundo material existem muitos exemplos. O Sol produz energia ilimitada desde tempo imemorial, e tantos subprodutos resultam do Sol; mesmo assim não há mudança no calor e temperatura do Sol em si. Apesar de ser um produto material, se o Sol pode manter sua temperatura original e ainda produzir tantos subprodutos, é difícil para a Verdade Absoluta Suprema permanecer imutável apesar de produzir tantos subprodutos por Sua energia inconcebível? Não há questão de transformação no que diz respeito à Verdade Absoluta Suprema.

Nas literaturas Védicas há informação do produto material chamado "pedra filosofal" a qual simplesmente pelo toque transforma ferro em ouro. A pedra filosofal pode produzir uma quantidade ilimitada de ouro e ainda permanecer a mesma. Somente no estado de ignorância alguém pode aceitar a conclusão Mayavadi que esta manifestação cósmica e os seres vivos são falsos ou ilusórios. Nenhuma pessoa sensata imporá ignorância e ilusão sobre a Verdade Absoluta Suprema, que é absoluta em tudo. Não há possibilidade de mudança, ignorância ou ilusão acontecerem Nele. O Brahman Supremo é transcendental e completamente diferente de todos conceitos materiais. Na Verdade Absoluta Suprema existe toda energia possível inconcebível existente. No Shwetashvatara Upanishad está afirmado que a Suprema Absoluta Personalidade de Deus é plena de energias inconcebíveis e que ninguém mais possui essas energias.

Por entender mal as energias inconcebíveis do Supremo, pode-se concluir falsamente que a Verdade Absoluta Suprema é impessoal. Tal conclusão iludida é experimentada por um ser vivo quando ele está num estágio agudo de doença. No Srimad Bhagavatam também há afirmações no sentido de que o atma supremo, o Senhor, tem potências inconcebíveis e inumeráveis (Bhag. 3.33.3). Também é afirmado no Brahma-sutra que o supremo espírito tem muitas energias variadas e inconcebíveis. Nem ninguém deve pensar que há qualquer possibilidade de ignorância existente na Verdade Absoluta. Ignorância e conhecimento são conceitos neste mundo de dualidade, mas no Absoluto não existe dualidade. É simplesmente ingenuidade considerar que o Absoluto é coberto pela ignorância. Se a Verdade Absoluta pode possivelmente ser coberta pela ignorância, como pode ser dito que é Absoluta? A compreensão da qualidade inconcebível do Absoluto é a única solução para a questão da dualidade. Isso porque dualidade surge da energia inconcebível do Absoluto. Por Suas energias inconcebíveis, a Verdade Absoluta Suprema pode permanecer imutável e ainda assim produzir esta manifestação cósmica com todos seus seres vivos, justamente igual a pedra filosofal pode produzir quantidades ilimitadas de ouro e ainda assim permanecer imutável. Porque a Verdade Absoluta tem essas energias inconcebíveis, a qualidade material da ignorância não pode pertencer a Ele. A variedade verdadeira que existe na Verdade Absoluta é um produto de Sua energia inconcebível. De fato, pode-se concluir seguramente que esta manifestação cósmica é apenas um subproduto de Suas energias inconcebíveis. Quando aceitamos as energias inconcebíveis do Supremo Senhor, encontramos que não existe dualidade nenhuma. A expansão da energia do Supremo Senhor é tão verdadeira quanto o Supremo Senhor. No que diz respeito à manifestação da energia suprema, não existe questão de transformação. O mesmo exemplo pode ser citado: apesar de produzir quantidades ilimitadas de ouro, a pedra filosofal permanece a mesma. Nós por isso ouvimos alguns sábios dizerem que o Supremo é o ingrediente ou causa desta manifestação cósmica.

Na realidade o exemplo da corda e a serpente não é completamente irregular. Quando aceitamos uma corda como uma serpente, entende-se que nós experimentamos uma serpente previamente. Senão, como uma corda pode ser confundida com uma serpente? Assim o conceito de uma serpente não é falso ou irreal em si. É a falsa identidade que é falsa e irreal. Quando, por equívoco, nós consideramos a corda como uma serpente, isso é nossa ignorância. Mas a própria idéia da serpente não é em si ignorância. Quando aceitamos uma miragem como água no deserto, não existe questão da água ser um conceito falso. Água é um fato, mas é um erro achar que tem água no deserto.

Assim esta manifestação cósmica não é falsa, como Shankaracharya mantém. Na realidade não existe nada falso aqui. Os Mayavadis dizem que este mundo é falso por causa de sua ignorância. É a conclusão da filosofia Vaishnava que esta manifestação cósmica é um subproduto das energias inconcebíveis do Supremo Senhor.

A palavra principal nos Vedas, pranava omkara, é a representação sonora do Supremo Senhor. Portanto omkara deve ser considerado o som supremo. Entretanto, Shankaracharya falsamente pregou que tat tvam asi são as vibrações supremas dos Vedas. Omkara é o reservatório de todas as energias do Supremo Senhor. Shankara está errado em manter que as palavras tat tvam asi são as vibrações supremas dos Vedas, porque tat tvam asi são palavras secundárias apenas. tat tvam asi sugere somente uma representação parcial. No Bhagavad-gita o Senhor em vários lugares deu importância ao omkara (Bg. 8.13, 9.17, 17.24). Similarmente, omkara é dado importância no Atharva Veda e no Mandukya Upanishad. No seu Bhagavat-sandarbha, Srila Jiva Goswami diz: "Omkara é a representação sonora mais confidencial do Supremo Senhor". A representação sonora ou nome do Supremo Senhor é tão boa quanto o Supremo Senhor em Pessoa. Por vibrar o som do omkara ou de Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare, a pessoa pode ser liberada da contaminação deste mundo material. Porque essas vibrações do som transcendental podem liberar uma alma condicionada, elas são conhecidas como tara, ou libertadores.

Que a vibração sonora do Senhor é idêntica com o Supremo Senhor é um fato. Isso é confirmado no Narada-pancharatra:

vyaktam hi bhagavan eva
saksan-narayanah svayam
astaksara-svarupena
mukhesu parivartate

"Quando a vibração transcendental é praticada por uma alma condicionada, o Supremo Senhor está presente na sua língua". No Mandukya Upanishad é dito que quando o omkara é cantado, tudo que é visto como material é visto perfeitamente como espiritual. No mundo espiritual ou na visão espiritual não existe nada além de omkara, o único alternativo, om. Infelizmente, Shankara abandonou essa palavra principal, omkara, e aceitou caprichosamente tat tvam asi como a vibração suprema dos Vedas. Por aceitar essa palavra secundária e deixar de lado a vibração principal, ele abandonou uma interpretação direta da escritura em favor de sua própria interpretação indireta.

Sripada Shankaracharya sem cerimônia obscureceu a Consciência de Krishna descrita no purusa-vedanta-sutra por manufaturar uma interpretação indireta e abandonar a interpretação direta. A menos que aceitarmos todas as afirmações do Vedanta-sutra como auto evidentes, não há sentido em estudar Vedanta-sutra. Interpretar os versos do Vedanta-sutra de acordo com seu próprio capricho é o maior desserviço para os Vedas auto evidentes.

No que diz respeito ao omkara pranava, é considerado como a encarnação sonora da Suprema Personalidade de Deus. Assim, omkara é eterno, ilimitado, transcendental, supremo e indestrutível. Ele (omkara) é o começo, meio e fim, e Ele é sem começo também. Quando alguém entende omkara assim, torna-se imortal. Deve-se saber então omkara como uma representação do Supremo Senhor situada no coração de todos. Aquele que entende omkara e Vishnu como um e o mesmo e todo-penetrante nunca lamenta no mundo material, nem ele permanece um sudra.

Apesar de Ele (omkara) não ter forma material, Ele é ilimitadamente expandido, e Ele tem forma ilimitada. Por entender omkara a pessoa fica livre da dualidade do mundo material e atinge conhecimento absoluto. Portanto omkara é a representação mais auspiciosa do Supremo Senhor. Assim é a descrição dada no Mandukya Upanishad. Não se deve ingenuamente interpretar uma descrição do Upanishad e dizer porque a Suprema Personalidade de Deus "não pode" aparecer em Pessoa neste mundo material em Sua própria forma, Ele manda Sua representação sonora (omkara) no lugar. Devido a essa falsa interpretação, omkara vem a ser considerado algo material, e conseqüentemente omkara é mal interpretado e louvado como simplesmente uma exibição ou símbolo do Senhor. Na realidade omkara é tão bom quanto qualquer outra encarnação do Supremo Senhor.

O Senhor tem inumeráveis encarnações, e omkara é uma delas. Como Krishna afirma no Bhagavad-gita: "Entre as vibrações, Eu sou a sílaba om" (Bg. 9.17). Isso significa que omkara não é diferente de Krishna. Impersonalistas, entretanto, dão mais importância para omkara do que para a Personalidade de Deus, Krishna. O fato é, todavia, que qualquer encarnação representante do Supremo Senhor não é diferente Dele. Essa encarnação ou representação é tão boa espiritualmente quanto o Supremo Senhor. Omkara é portanto a representação última de todos os Vedas. De fato, os mantras e hinos Védicos têm valor transcendental porque são precedidos pela sílaba om. Os Vaishnavas interpretam omkara como se segue: pela letra O, Krishna, a Suprema Personalidade de Deus, é indicado; pela letra U, a consorte eterna de Krishna, Srimati Radharani, é indicada; e pela letra M, o servidor eterno do Supremo Senhor, o ser vivo, é indicado. Shankara não deu essa importância para o omkara. Todavia, importância é dada nos Vedas, no Ramayana, nos Puranas e no Mahabharata do começo ao fim. Assim, as glórias do Supremo Senhor, a Suprema Personalidade de Deus, são declaradas.
[NT: É óbvio o erro mecânico, mas não corrigi. Omkara é formado por três letras "AUM". "A" é Krishna, "U" Srimati Radharani e "M" os seres vivos. (CcAdi 7.128), (Bg. 10.33)].

     

        

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Vinte e Um

Os Filósofos Mayavadi são Convertidos

Desse modo o Senhor Chaitanya condenou tentativas de interpretação indireta do Vedanta-sutra, e todos os sannyasis presentes ficaram admirados com Sua explicação. Depois de ouvir a interpretação direta, um dos sannyasis declarou imediatamente, "Ó Sripada Chaitanya, tudo que Você explicou em Sua condenação da interpretação indireta do omkara é muitíssimo útil. Somente uma pessoa afortunada pode aceitar Sua interpretação como a certa. Na realidade, todos nós agora sabemos que as interpretações dadas por Shankara são todas artificiais e imaginárias, mas porque nós pertencemos à seita de Shankaracharya, nós tomamos isso como garantido que a interpretação dele é a certa. Nós ficaremos muito felizes de ouvir Você explicar mais o Vedanta-sutra pela interpretação direta".

Assim solicitado, o Senhor Chaitanya explicou cada e todo verso do Vedanta-sutra de acordo com a interpretação direta. Ele também explicou a palavra Brahman, por indicar que Brahman significa o maior, a Suprema Personalidade de Deus. Brahman indica que o maior é pleno com seis opulências; a Suprema Personalidade de Deus é o reservatório de toda riqueza, toda fama, todo poder, toda beleza, todo conhecimento e toda renúncia. Quando o Senhor Krishna estava presente pessoalmente na Terra, Ele exibiu essas seis opulências em sua plenitude. Ninguém era mais rico do que o Senhor Krishna, ninguém era mais erudito do que Ele, ninguém mais belo, ninguém mais poderoso, ninguém mais famoso e ninguém mais renunciado. Portanto a Suprema Personalidade de Krishna é o Supremo Brahman. Isso é confirmado por Arjuna no Bhagavad-gita (Bg. 10.12), param brahma param dhama: "Você é o Brahman Supremo, o último, a morada suprema". Assim Brahman indica o maior, e o maior é a Suprema Personalidade de Deus, Krishna. Ele é o abrigo da Verdade Absoluta (para-tattva) porque Ele é param brahma. Não existe nada material em Suas opulências e exibições de riqueza, fama, poder, beleza, conhecimento e renúncia. Todos os versos Védicos e hinos indicam que tudo sobre Ele é espiritual e transcendental. Sempre que a palavra Brahman aparece nos Vedas, deve ser entendido que Krishna, a Suprema Personalidade de Deus, é indicado. Uma pessoa inteligente imediatamente substitui a palavra Brahman pelo nome Krishna.

A Suprema Personalidade de Deus é transcendental aos modos da natureza material, mas Ele é plenamente qualificado com atributos transcendentais. Aceitar o Supremo como impessoal é negar a manifestação de Suas energias espirituais. Quando alguém aceita simplesmente a exibição impessoal da energia espiritual para a exclusão da Suprema Personalidade de Deus, ele não aceita a Verdade Absoluta em plenitude. Aceitar o Supremo em plenitude é aceitar variedade espiritual, que é transcendental aos modos da natureza material. Por falharem em indicar a Suprema Personalidade de Deus, os impersonalistas são deixados com um conceito incompleto.

O método aprovado para entender a Suprema Personalidade de Deus, Krishna, é o caminho do serviço devocional, e isso é confirmado em toda escritura Védica. Serviço devocional do Senhor começa por ouvir sobre Ele. Existem nove métodos diferentes em serviço devocional, dos quais ouvir é o principal. Ouvir, cantar, lembrar, adorar - todos esses são usados no processo de atingir a perfeição mais elevada por entender a Suprema Personalidade de Deus. Esse processo pelo qual a Suprema Personalidade de Deus é entendido é conhecido como abhidheya, prática do serviço devocional dentro da vida condicionada.

É experimentado na prática que quando alguém adota a Consciência de Krishna, ele não gosta de desviar para outra forma de consciência. Consciência de Krishna é o desenvolvimento do amor por Krishna, a Suprema Personalidade de Deus, e esse é o interesse de quinta dimensão do ser humano. Quando alguém realmente adota este processo do serviço transcendental, ele saboreia sua relação com Krishna diretamente. Quando existe reciprocidade dos intercâmbios transcendentais com Krishna, Krishna gradualmente Se torna um associado pessoal do devoto. Então o devoto eternamente desfruta vida bem-aventurada. Por essa razão, é o propósito do Vedanta-sutra restabelecer o relacionamento perdido do ser vivo com o Supremo Senhor Krishna e capacitá-lo a executar serviço devocional e ultimamente alcançar o objetivo mais elevado da vida, amor do Supremo. Esse é o verdadeiro propósito do Vedanta-sutra.

Depois que o Senhor Chaitanya explicou o Vedanta-sutra por interpretar diretamente os versos, o discípulo principal de Prakashananda Sarasvati levantou na assembléia e começou a louvar o Senhor Chaitanya como a Suprema Personalidade de Deus, Narayana. Ele não somente apreciou muitíssimo a explicação do Vedanta-sutra pelo Senhor Chaitanya, mas ele declarou publicamente que a explicação direta dos Upanishads e Vedanta-sutra "é tão agradável que nós esquecemos de nós próprios e esquecemos que pertencemos à seita Mayavadi". Assim foi admitido aqui que as explicações de Shankaracharya dos Upanishads e Vedanta-sutra são todas imaginárias. Às vezes podemos aceitar essas explicações imaginárias pelo bem de feudos sectários, mas na realidade essas explicações não nos satisfazem. Não é que alguém fica livre do enredamento material simplesmente por aceitar a ordem sannyasa. Ainda assim se nós realmente entendermos as explicações dadas pelo Senhor Chaitanya, nós seremos ajudados. Por exemplo, quando o Senhor Chaitanya explica o significado de harer nama harer nama harer nama kevalam (Cc. Adi 17.21), todos ficam satisfeitos, porque é um fato que não existe alternativa para o serviço devocional. Sem serviço devocional ninguém pode atingir liberação das garras materiais. Especialmente nesta era de Kali, a pessoa pode alcançar a liberação mais elevada simplesmente por cantar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. No Srimad Bhagavatam (10.14.4) está afirmado que quando uma pessoa abandona o caminho do serviço devocional e simplesmente labuta por conhecimento, não tem nenhum proveito outro além do trabalho que tem para entender a diferença entre matéria e espírito. É trabalho inútil tentar obter grãos de cascas vazias. No Srimad Bhagavatam (10.2.32) está afirmado, a pessoa que abandona o serviço amoroso transcendental do Supremo Senhor e superficialmente se considera liberada, nunca alcança liberação. Com muito labor, austeridade e penitência, ela pode ser elevada para a plataforma liberada, mas por falta de abrigo nos pés de lótus do Supremo Senhor, ela cai novamente dentro da contaminação material.

O Brahman Supremo não pode ser aceito como impessoal, de outra forma as seis opulências, que pertencem à Suprema Personalidade de Deus, não podem ser atribuídas a Brahman. Todos os Vedas e Puranas afirmam que a Suprema Personalidade de Deus é plena de energias espirituais, mas pessoas ingênuas rejeitam isso e ridicularizam Suas atividades. Eles mal interpretam o corpo de Krishna como uma criação da natureza material, e isso é considerado como a maior ofensa e o maior pecado. Deve-se aceitar as palavras do Senhor Chaitanya como Ele as falou perante Prakashananda Sarasvati e os sannyasis Mayavadi.

A personalidade individual da Verdade Absoluta Suprema é explicada no Srimad Bhagavatam (3.9.3-4): "Ó Supremo Senhor, a forma transcendental que eu vejo agora é a corporificação do prazer transcendental. É eterna e desprovida da contaminação dos modos materiais. É a maior manifestação da Verdade Absoluta, e é plena de refulgência. Ó alma de todos, Você é o criador desta manifestação cósmica e todos os elementos materiais. Eu me rendo a Você em Sua forma transcendental, ó Krishna! Ó mais auspicioso universo! Você advém Você mesmo em Sua forma pessoal original a fim de ser adorado por nós, e nós percebemos Você ou por meditação ou por adoração direta. Pessoas ingênuas contaminadas pela natureza material não dão muita importância para Sua forma transcendental, e conseqüentemente elas escorregam para o inferno".

Isso também é confirmado no Bhagavad-gita:

avajananti mam mudha
manusim tanum asritam
param bhavam ajananto
mama bhuta-mahesvaram

"Os tolos Me menosprezam quando Eu descendo em forma humana. Eles não conhecem Minha natureza transcendental e Meu domínio supremo sobre tudo que existe" (Bg. 9.11).

Que essas pessoas ingênuas e demoníacas vão para os planetas infernais também é confirmado no Bhagavad-gita:

tan aham dvisatah kruran
samsaresu naradhaman
ksipamy ajasram asubhan
asurisv eva yonisu

"Aqueles que são invejosos e malvados, que são os mais baixos entre os humanos, são jogados por Mim no oceano da existência material, em várias espécies de vida demoníacas" (Bg. 16.19).

A doutrina dos subprodutos, parinama-vada, é afirmada desde o próprio início do Vedanta-sutra, mas Shankaracharya tentou superficialmente escondê-la e estabelecer a doutrina da transformação, vivarta-vada. Ele também teve a audácia de dizer que Vyasa está enganado. Todas as literaturas Védicas, inclusive puranas, confirmam que o Supremo Senhor é o centro de toda energia e variedade espirituais. O filósofo Mayavadi, enfatuado e incompetente, não pode entender variedade na energia espiritual. Ele conseqüentemente acredita falsamente que variedade espiritual não é diferente de variedade material. Iludido por essa falsa crença, os Mayavadis ridicularizam os passatempos da Suprema Personalidade de Deus. Tais pessoas idiotas, incapazes de compreenderem as atividades espirituais do Supremo Senhor, consideram Krishna como um produto desta natureza material. Essa é a maior ofensa que qualquer ser humano pode cometer. O Senhor Chaitanya portanto estabelece que Krishna é sac-cid-ananda-vigraha (Bs. 5.1), a forma de eternidade, conhecimento e bem-aventurança, e que Ele está sempre entretido em Seus passatempos transcendentais nos quais existe toda variedade espiritual.

O estudante de Prakashananda resumiu as explanações do Senhor Chaitanya e concluiu: "Nós praticamente abandonamos o caminho da realização espiritual. Nós simplesmente nos engajamos em conversa sem sentido. Os filósofos Mayavadis que são sérios em alcançar bênção devem se dedicar no serviço devocional de Krishna, mas em vez disso eles sentem prazer em argumento inútil apenas. Nós aqui admitimos que a explicação de Shankaracharya esconde o verdadeiro significado real da literatura Védica. Somente a explicação dada por Chaitanya é aceitável. Todas outras interpretações são inúteis".

Depois de explicar assim sua posição, o estudante principal de Prakashananda Sarasvati começou a cantar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Quando Prakashananda Sarasvati viu isso, ele também admitiu a culpa de Shankaracharya e disse, "Porque Shankaracharya queria estabelecer a doutrina do monismo, ele não tinha alternativa além de interpretar o Vedanta-sutra de um modo diferente. Quando alguém aceita a Suprema Personalidade de Deus, a doutrina do monismo não pode ser estabelecida. Por isso, por meio de erudição mundana Shankaracharya tentou obscurecer o significado real do Vedanta-sutra. Não somente Shankaracharya fez isso, mas todos autores que tentam dar suas próprias visões da necessidade mal interpretam Vedanta-sutra".

Assim o Senhor Chaitanya deu o significado direto do Vedanta-sutra. Nenhuma escritura Védica deve ser usada para especulação indireta. Em adição a Shankaracharya, outros filósofos materialistas tais quais Kapila, Gautama, Astavakra e Patañjali distribuíram especulação filosófica de vários modos. De fato, Jaimini e seus seguidores, que são todos mais ou menos lógicos, abandonaram o significado real dos Vedas (serviço devocional) e tentaram estabelecer a Verdade Absoluta como sujeita ao mundo material. É a opinião deles que se existe um Deus, Ele ficará satisfeito com os humanos e dará aos humanos todos resultados desejados se a pessoa simplesmente executar suas atividades materiais bem. Similarmente, o ateísta Kapila tentou estabelecer que não existe nenhum Deus que criou o mundo material. Kapila até tentou estabelecer que a combinação de elementos materiais causou a criação. Similarmente, Gautama e Kanada enfatizaram essa teoria que a criação resultou de uma combinação afortunada de elementos materiais, e eles tentaram estabelecer que a energia atômica é a origem da criação. Similarmente, impersonalistas e monistas como Astavakra tentaram estabelecer a refulgência impessoal (brahmajyoti) como o Supremo. E Patañjali, uma das maiores autoridades no sistema de yoga, tentou conceber uma forma imaginária do Supremo Senhor.

Em resumo, deve-se entender que todos esses filósofos materialistas tentaram evitar a Suprema Personalidade de Deus por apresentarem suas próprias filosofias inventadas mentalmente. Entretanto, Vyasadeva, o grande sábio e encarnação do Supremo, estudou inteiramente todas essas especulações filosóficas e em resposta compilou o Vedanta-sutra, que estabelece o relacionamento entre o ser vivo e a Suprema Personalidade de Deus e a importância do serviço devocional em ultimamente alcançar amor do Supremo. O verso janmady asya yatah (Bhag. 1.1.1), que aparece no próprio começo do Vedanta-sutra, é explicado no Srimad Bhagavatam de Vyasadeva. No Srimad Bhagavatam, Vyasadeva estabelece desde o próprio início que a suprema fonte de tudo é uma pessoa transcendental, consciente.

O impersonalista tenta explicar que a refulgência impessoal do Supremo Senhor (brahmajyoti) está além destes modos da natureza material, mas ao mesmo tempo ele tenta estabelecer que a Suprema Personalidade de Deus é contaminada pelos modos da natureza material. O Vedanta-sutra afirma que a Suprema Personalidade de Deus é não somente transcendental aos modos da natureza material mas também Ele possui inumeráveis qualidades e energias transcendentais. Todos esses vários filósofos especuladores são unos em negar a existência do Supremo Senhor Vishnu, e são muito entusiasmados para propagar suas teorias próprias e serem reconhecidos pelas pessoas. Pessoas desafortunadas ficam enamoradas por esses filósofos ateístas e conseqüentemente nunca podem entender a natureza real da Verdade Absoluta. É muito melhor seguir os passos das grandes almas (mahajanas). De acordo com o Srimad Bhagavatam existem doze mahajanas, ou grandes almas, e são: (1) Brahma, (2) Senhor Shiva, (3) Narada, (4) Vaivasvata Manu, (5) Kapila (não o ateísta, mas o Kapila original), (6) os Kumaras, (7) Prahlada, (8) Bhisma, (9) Janaka, (10) Bali, (11) Shukadeva Goswami e (12) Yamaraja. De acordo com o Mahabharata, não há nenhum ponto em argumentar sobre a Verdade Absoluta porque existem tantas escrituras Védicas diferentes e entendimentos filosóficos que nenhum filósofo pode concordar com outro. Porque todos tentam apresentar seu próprio ponto de vista e rejeitar outros, é muito difícil entender a necessidade dos princípios religiosos. Por isso é melhor seguir os passos dos grandes mahajanas, grandes almas; assim a pessoa pode alcançar o sucesso desejado. Os ensinamentos do Senhor Chaitanya são justamente iguais a néctar, e eles contêm qualquer coisa que for necessária. O melhor modo é adotar este caminho e segui-lo.

     

       

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Vinte e Dois

O Srimad Bhagavatam

Depois da conversão dos sannyasis Mayavadi para o caminho de Chaitanya Mahaprabhu, muitos intelectuais e pessoas inquisitivas visitaram o Senhor em Benares. Porque não era possível todo mundo ir ver Chaitanya Mahaprabhu em Sua residência, as pessoas costumavam fazer fila para vê-Lo à medida em que Ele passava em Seu caminho para o templo de Vishvanatha e Bindumadhava. Certo dia, quando o Senhor visitou o templo com Seus associados, Chandrashekhara Acharya, Paramananda, Tapana Mishra, Sanatana Goswami e outros, Ele cantava:

haraye namah krsna yadavaya namah
gopala govinda rama sri madhusudana

Quando o Senhor cantava desse modo, cantava e dançava, milhares de pessoas ficavam em volta Dele, e quando o Senhor cantava, elas urravam. A vibração era tão tumultuosa que Prakashananda Sarasvati, que estava sentado nas imediações, imediatamente se juntou à multidão com seus discípulos. Logo que ele viu o belo corpo do Senhor Chaitanya e o Senhor dançando com Seus associados, Prakashananda Sarasvati também se juntou e começou a cantar: "Hari! Hari"! Todos os habitantes de Benares ficaram admirados de ver a dança extática do Senhor Chaitanya. Entretanto, o Senhor Chaitanya restringiu Seu êxtase contínuo e parou de dançar quando Ele viu os sannyasis Mayavadi. Logo que o Senhor parou de dançar e cantar, Prakashananda Sarasvati caiu a Seus pés. O Senhor Chaitanya tentou impedi-lo e disse, "Ó, você é o mestre espiritual do mundo inteiro, jagad-guru, e Eu não estou nem mesmo no nível igual de seus discípulos. Você portanto não adore um inferior como Eu. Você é exatamente como o Brahman Supremo, e se Eu permitir que você caia aos Meus pés, Eu cometerei uma grande ofensa. Apesar de você não ter visão da dualidade, com o propósito de ensinar as pessoas em geral você não deve fazer isso".

"Previamente eu falei mal de Você muitas vezes", Prakashananda Sarasvati respondeu. "Agora a fim de me livrar dos resultados da minha ofensa, eu caio a Seus pés". Ele então citou um verso das literaturas Védicas o qual afirma que mesmo uma alma liberada quando comete uma ofensa contra o Supremo Senhor, novamente se torna vítima da contaminação material. Prakashananda Sarasvati então citou um outro verso do Srimad Bhagavatam (10.34.9) a respeito quando Nanda Maharaja foi atacado por uma serpente que era previamente Vidyadhararchita. Quando a serpente foi tocada pelos pés de lótus de Krishna, ele recuperou seu corpo anterior e ficou livre das reações de suas atividades pecaminosas. Quando o Senhor Chaitanya assim ouviu sobre Ele mesmo em igualdade com Krishna, Ele protestou suavemente. Ele queria alertar as pessoas para não compararem o Supremo Senhor com nenhum ser vivo, e apesar de Ele ser o Supremo Senhor em Pessoa, Ele protestou contra essa comparação a fim de nos ensinar. Assim Ele disse que a maior ofensa é comparar qualquer um com o Supremo Senhor Krishna. O Senhor Chaitanya sempre manteve que Vishnu, a Suprema Personalidade de Deus, e grandioso e os seres vivos, por maiores que possam ser, são apenas infinitesimais. Nessa conexão, Ele citou um verso do Padma Purana que é encontrado no Vaishnava tantra (Hari-bhakti-vilasa 1.73): "Uma pessoa que compara o Supremo Senhor mesmo com os maiores dos semideuses tais quais Brahma e Shiva deve ser considerada um ateísta número um".

"Eu posso entender que Você é a Suprema Personalidade de Deus, Krishna", Prakashananda Sarasvati continuou, "e mesmo que Você Se apresente como um devoto, ainda assim Você é adorável porque Você é maior que todos nós em educação e realização. Por isso que por blasfemar Você, nós cometemos a maior ofensa. Por favor nos perdoe".

Como um devoto se torna o maior de todos os transcendentalistas é afirmado no Srimad Bhagavatam (6.14.5):

muktanam api siddhanam
narayana-parayanah
sudurlabhah prasantatma
kotisv api mahamune

"Existem muitas almas liberadas e almas perfeitas, mas de todas elas aquele que é um devoto da Suprema Personalidade de Deus é o melhor. Os devotos do Supremo Senhor são sempre calmos e tranqüilos, e a perfeição deles é muito raramente vista, mesmo entre milhões de pessoas". Prakashananda também citou um outro verso (Bhag. 10.4.46) no qual está afirmado que a duração de vida de uma pessoa, prosperidade, fama, religião e a bênção das autoridades superiores são todas perdidas quando alguém ofende um devoto. Prakashananda também citou outro verso do Srimad Bhagavatam (7.5.32) o qual diz que todos os receios da alma condicionada desaparecem pelo toque dos pés de lótus da Suprema Personalidade de Deus. Todavia, ninguém pode tocar os pés de lótus do Supremo Senhor a menos que a pessoa receba a bênção da poeira dos pés de lótus do devoto puro do Senhor. Em outras palavras, ninguém pode se tornar um devoto puro da Suprema Personalidade de Deus a menos que seja favorecido por outro devoto puro do Senhor.

"Agora eu me abrigo em Seus pés de lótus", Prakashananda Sarasvati disse, "porque eu quero ser elevado para a posição de um devoto do Supremo Senhor".

Depois de falar assim, ambos Prakashananda Sarasvati e Senhor Chaitanya sentaram juntos. "Qualquer coisa que Você disse a respeito de discrepâncias na filosofia Mayavadi também é sabido por nós", Prakashananda disse. "De fato, nós sabemos que todos os comentários sobre as escrituras Védicas por filósofos Mayavadis são errôneos, especialmente os de Shankaracharya. As interpretações do Vedanta-sutra de Shankaracharya são todas invenções de sua imaginação. Você não explicou os códigos do Vedanta-sutra e Upanishads de acordo com Sua própria imaginação mas os apresentou como eles são. Assim todos nós ficamos satisfeitos em ouvir Sua explanação. Tais explanações dos códigos do Vedanta-sutra e Upanishads não podem ser dadas por ninguém mais além da Suprema Personalidade de Deus. Porque Você possui todas as potências do Supremo Senhor, por favor explique o Vedanta-sutra mais ainda para que eu seja beneficiado".

O Senhor Chaitanya protestou por ser chamado de Supremo Senhor, e Ele disse, "Meu querido senhor, Eu sou um ser vivo ordinário. Eu não posso conhecer o verdadeiro significado do Vedanta-sutra, mas Vyasadeva, que é uma encarnação de Narayana, conhece seu verdadeiro significado. Nenhum ser vivo ordinário pode interpretar Vedanta-sutra de acordo com seus conceitos mundanos. Com o propósito de restringir comentários sobre Vedanta-sutra por pessoas inescrupulosas, o próprio autor, Vyasadeva, já comentou sobre o Vedanta-sutra por escrever o Srimad Bhagavatam". Em outras palavras, a melhor explicação de um livro é a escrita pelo próprio autor. Ninguém pode entender a mente do autor a menos que o próprio autor revele ele mesmo o significado por trás de sua obra. Assim o Vedanta-sutra deve ser entendido através do Srimad Bhagavatam, o comentário escrito pelo autor do Vedanta-sutra.

Pranava, ou omkara, é a substância divina de todos os Vedas. Omkara é explicado mais ainda no gayatri mantra exatamente igual como explicado no Srimad Bhagavatam. Existem quatro versos escritos nessa conexão, e eles foram explicados para Brahma pelo Senhor Krishna em Pessoa. Por sua vez, Brahma os explica para Narada, e Narada os explica para Vyasadeva. Desse modo o significado dos versos do Srimad Bhagavatam vem para baixo através da sucessão discipular. Não é que qualquer um e todos podem fazer seus próprios comentários estúpidos sobre Vedanta-sutra e enganar os leitores. Qualquer um que queira entender Vedanta-sutra deve ler Srimad Bhagavatam cuidadosamente. Sob as instruções de Narada Muni, Vyasadeva compilou Srimad Bhagavatam com o propósito de explicar Vedanta-sutra. Ao escrever o Srimad Bhagavatam, Vyasadeva coletou toda a essência dos Upanishads, o propósito disso também foi explicado no Vedanta-sutra. Srimad Bhagavatam é portanto a essência de todo conhecimento Védico. Aquilo que é afirmado nos Upanishads e reafirmado no Vedanta-sutra é explicado muito bem no Srimad Bhagavatam.

Há uma passagem no Ishopanishad similar para um verso encontrado no Srimad Bhagavatam (8.1.10) a qual afirma que qualquer coisa que alguém veja na manifestação cósmica é apenas a energia do Supremo Senhor e não é diferente Dele. Conseqüentemente Ele é o controlador, amigo e mantenedor de todos os seres vivos. Nós temos que viver pela misericórdia de Deus e aceitar somente aquelas coisas que foram distribuídas para nós. Desse modo, sem invadir a propriedade de outro, pode-se desfrutar a vida.

Em outras palavras, o propósito dos Upanishads, Vedanta-sutra e Srimad Bhagavatam é um e o mesmo. Se alguém estudar o Srimad Bhagavatam cuidadosamente, verá que todos os Upanishads e o Vedanta-sutra são muito bem explicados ali. Srimad Bhagavatam nos ensina como restabelecer nossa relação eterna com o Supremo Senhor, como agir nesse relacionamento, e, ultimamente, como alcançar o benefício máximo dele.

Os quatro versos que começam com aham eva são a essência de todo o Bhagavatam. Eles são: "Eu sou o centro supremo para os relacionamentos de todos os seres vivos, e Meu conhecimento é o conhecimento supremo. O processo pelo qual Eu posso ser alcançado pelo ser vivo é chamado abhidheya. Por ele, pode-se atingir a perfeição do amor mais elevada, amor do Supremo. Quando alguém atinge amor do Supremo, sua vida se torna perfeita". A explanação desses quatro versos é dada no Srimad Bhagavatam, e o Senhor Chaitanya deu uma pequena descrição dos princípios desses versos. Ele disse que ninguém pode entender a posição constitucional do Supremo Senhor - Sua situação, Suas qualidades transcendentais, Suas atividades transcendentais e Suas seis opulências. Isso não pode ser entendido por especulação mental ou educação acadêmica; só podem ser entendidas pela misericórdia do Senhor. Como afirmado no Bhagavad-gita, aquele que é afortunado o bastante para receber o favor do Senhor pode entender todas essas explanações pela misericórdia do Senhor.

O Senhor existia antes da criação material; assim os ingredientes materiais, natureza e os seres vivos todos emanaram Dele, e depois da dissolução eles repousam Nele. Quando a criação é manifestada, ela é mantida por Ele; de fato, qualquer manifestação que nós vemos é apenas uma manifestação de Sua energia externa. Quando o Senhor recolhe Sua energia externa, tudo entra Nele. No primeiro dos quatro versos, a palavra aham é dada três vezes com o propósito de enfatizar que a Suprema Personalidade de Deus é plena com todas opulências. Aham é citado três vezes justamente para castigar aquele que não pode entender ou acreditar na natureza e forma transcendentais do Supremo Senhor.

O Senhor possui Sua energia interna, Suas energias externa, marginal e relativa, a manifestação do mundo cósmico e os seres vivos. A energia externa é manifestada pelos modos qualitativos (gunas) da natureza material. Aquele que pode entender a natureza do ser vivo no mundo espiritual pode realmente entender vedyam, ou conhecimento perfeito. Ninguém pode entender o Supremo Senhor simplesmente por ver a energia material e a alma condicionada, mas quando alguém está em conhecimento perfeito, ele fica livre da influência da energia externa. A Lua reflete a luz do Sol, e sem a luz do Sol, a Lua não pode iluminar nada. Similarmente, esta manifestação cósmica material é apenas o reflexo do mundo espiritual. Quando alguém está realmente liberado do encanto da energia externa, pode entender a natureza constitucional do Supremo Senhor. Serviço devocional para o Senhor é o único meio pelo qual o Senhor pode ser obtido, e esse serviço devocional pode ser aceito por todos e cada um em qualquer país e sob qualquer circunstância. Serviço devocional está acima dos quatro princípios da religião e da compreensão derivada da liberação. Mesmo as preliminares do serviço devocional são transcendentais ao entendimento mais elevado derivado de liberação e o entendimento derivado de religião ordinária.

Deve-se portanto aproximar de um mestre espiritual fidedigno - independente de casta, credo, cor, país, etc. - e ouvir dele tudo sobre serviço devocional. O verdadeiro propósito da vida é reviver nosso amor dormente por Deus. De fato, essa é nossa necessidade última. Como esse amor de Deus pode ser obtido é explicado no Srimad Bhagavatam. Existe conhecimento teórico e conhecimento específico ou realizado, e conhecimento perfeitamente realizado é atingido quando alguém realiza os ensinamentos recebidos do mestre espiritual.

      

        

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Vinte e Três

Por que estudar o Vedanta-sutra

Conhecimento é informação colhida das escrituras, e ciência é realização prática desse conhecimento. Conhecimento é científico quando é coletado das escrituras através de um mestre espiritual fidedigno, mas quando interpretado por especulação, é invenção mental. Por entender cientificamente a informação das escrituras através do mestre espiritual fidedigno, a pessoa aprende, por sua própria realização, a situação real da Suprema Personalidade de Deus. A forma transcendental da Suprema Personalidade de Deus é diferente das manifestações materiais, e está acima das reações da matéria. A menos que alguém entenda cientificamente a forma espiritual da Suprema Personalidade de Deus, ele se torna um impersonalista. O brilho solar em si é iluminação, mas essa iluminação é diferente do Sol. Ainda assim o Sol e o brilho solar não estão situados diferentemente, porque sem o Sol não pode haver brilho solar, e sem brilho solar não há sentido para a palavra Sol.

A menos que alguém esteja livre da influência da energia material, não pode entender o Supremo Senhor e Suas diferentes energias. Nem alguém que está cativado pelo encanto da energia material pode entender a forma espiritual do Supremo Senhor. A menos que haja realização da forma transcendental da Suprema Personalidade de Deus, não há questão do amor de Deus. A menos que alguém realize a forma transcendental do Supremo Senhor, não pode realmente atingir amor de Deus, e sem amor de Deus não existe perfeição na vida humana. Justamente igual os cinco elementos grosseiros da natureza - chamados terra, água, fogo, ar e éter - que estão tanto dentro quanto fora de todos seres vivos neste mundo, o Supremo Senhor está tanto dentro quanto fora desta existência, e aqueles que são Seus devotos podem realizar isso.

Devotos puros sabem que são destinados para servir a Suprema Personalidade de Deus e que todas as coisas que existem podem ser meios pelos quais pode-se servir o Supremo. Porque um devoto foi abençoado pelo Supremo de dentro do seu coração, pode ver o Supremo Senhor onde quer que ele olhe. De fato, ele não pode ver mais nada. No Srimad Bhagavatam (11.2.55) o relacionamento entre o devoto e o Supremo Senhor é confirmado como se segue:

visrjati hrdayam na yasya saksad
dharir avasabhihito 'py aghaugha-nasah
pranaya-rasanaya dhrtanghri-padmah
sa bhavati bhagavata-pradhana uktah

"Se o coração de uma pessoa está sempre atado aos pés de lótus do Supremo Senhor com a corda do amor, o Senhor não a abandona. De fato, mesmo se sua lembrança não for perfeita, deve ser considerada um devoto de primeira classe". Existe um exemplo disso descrito no Srimad Bhagavatam, Dasha-skandha (10.30.4). Quando as gopis se reuniram para ingressar na dança rasa com Krishna, Krishna as abandonou. Conseqüentemente as gopis começaram a cantar o santo nome de Krishna e, dominadas pela loucura, começaram a perguntar sobre Krishna para flores e arbustos na floresta. Krishna é igual o céu; Ele está situado em todo lugar.

Por estudar Srimad Bhagavatam, podemos obter informação sobre nosso relacionamento eterno com o Supremo Senhor, entender o procedimento pelo qual o Senhor pode ser obtido e receber a realização última. que é amor do Supremo. Ao explicar para Prakashananda Sarasvati como alguém pode alcançar a Suprema Personalidade de Deus por serviço devocional, o Senhor Chaitanya citou um verso do Srimad Bhagavatam (11.14.21) no qual o Senhor diz que ele pode ser realizado somente através do serviço devocional executado com fé e amor. De fato, é o serviço devocional unicamente que purifica o coração do devoto e o eleva para a realização última pela qual ele, estabelecido em fé, rende serviço ao Supremo Senhor. Mesmo se alguém for nascido em família de classe baixa, tal qual uma família de candalas (comedores de cachorro), pode se tornar cheia de sintomas transcendentais através da realização do estágio supremo do amor do Supremo. Esses sintomas são descritos no Srimad Bhagavatam (11.3.31):

smarantah smarayantas ca
mitho 'ghaugha-haram harim
bhaktya samjataya bhaktya
bibhraty utpulakam tanum

"Quando devotos discutem assuntos relacionados com o Supremo Senhor, que pode limpar o coração de Seu devoto de todos os tipos de reações pecaminosas, eles ficam dominados pelo êxtase e exibem diferentes sintomas devido a seu serviço devocional". O Bhagavatam diz mais ainda: "Devido a seu apego espontâneo pelo Senhor, quando eles cantam Seus santos nomes, às vezes choram, às vezes riem, dançam, cantam e assim por diante, sem se importarem com nenhuma convenção social" (Bhag. 11.2.40).

Nós devemos entender que Srimad Bhagavatam é a explanação real do Brahma-sutra, e é compilado pelo próprio Vyasadeva. No Garuda Purana está dito:

artho 'yam brahma-sutranam
bharatartha-vinirnayah
gayatri-bhasya-rupo 'sau
vedartha-paribrmhitah
grantho 'stadasa-sahasrah
srimad-bhagavatabhidhah

"O Srimad Bhagavatam é a explanação autorizada do Brahma-sutra, e é uma explicação adicional do Mahabharata. É a expansão do gayatri mantra e a essência de todo conhecimento Védico. Esse Srimad Bhagavatam, que contém dezoito mil versos, é conhecido como a explicação de toda literatura Védica". Logo no Primeiro Canto do Srimad Bhagavatam os sábios de Naimisharanya perguntaram a Suta Goswami como alguém pode conhecer a essência da literatura Védica. Em resposta, Suta Goswami apresentou o Srimad Bhagavatam como a essência de todos os Vedas, histórias e outras literaturas Védicas. Em outra parte do Srimad Bhagavatam (12.13.15) está claramente afirmado que o Srimad Bhagavatam é a essência de todo conhecimento Vedanta e aquele que saboreia o conhecimento do Srimad Bhagavatam não tem nenhum gosto para estudar qualquer outra literatura. Logo no início do Srimad Bhagavatam, o significado e propósito do gayatri mantra também é descrito: "Eu ofereço minhas reverências à Verdade Suprema". Esse é o primeiro verso introdutório relacionado com a Verdade Suprema, que é descrito no Srimad Bhagavatam como a fonte da criação, manutenção e destruição da manifestação cósmica. Reverências à Personalidade de Deus, Vasudeva (om namo bhagavate vasudevaya), indica diretamente o Senhor Sri Krishna, que é o filho divino de Vasudeva e Devaki. Esse fato é apresentado mais explicitamente mais tarde no Srimad Bhagavatam. Vyasadeva afirma que Sri Krishna é a Personalidade de Deus original e todos os outros são Suas porções plenárias diretas ou indiretas ou porções dessas porções. Srila Jiva Goswami depois desenvolveu mais explicitamente ainda esse assunto no seu Krishna-sandarbha, e Brahma, o ser vivo original, explicou Sri Krishna substancialmente em seu tratado Brahma-samhita. O Sama Veda também verifica o fato que o Senhor Sri Krishna é o filho de Devaki.

Em sua prece, o autor do Srimad Bhagavatam primeiro propõe que o Senhor Sri Krishna é o Senhor primordial e se qualquer nomenclatura transcendental para a Personalidade de Deus Absoluta deve ser aceita, deve ser o nome Krishna, o todo-atrativo. No Bhagavad-gita o Senhor afirmou em muitas passagens que Ele é a Personalidade do Supremo, e isso também foi confirmado por Arjuna, que citou grandes sábios tais quais Narada, Vyasa e muitos outros. No Padma Purana também está afirmado que dos inumeráveis nomes do Senhor, o nome de Krishna é o principal. Apesar do nome Vasudeva indicar a porção plenária da Personalidade de Deus, e apesar que todas as formas diferentes do Senhor são idênticas a Vasudeva, nesse texto Vasudeva indica principalmente o filho divino de Vasudeva e Devaki. Sri Krishna é sempre meditado pelos paramahamsas, aqueles que são os mais perfeitos na ordem de vida renunciada. Vasudeva, ou Senhor Sri Krishna, é a causa de todas as causas, e tudo o que existe é uma emanação Dele. Como é isso, é explicado nos capítulos posteriores do Srimad Bhagavatam.

Chaitanya Mahaprabhu descreve Srimad Bhagavatam como o Purana imaculado porque contém narrações transcendentais dos passatempos da Suprema Personalidade de Deus Sri Krishna. A história do Srimad Bhagavatam também é muito gloriosa. Foi compilado por Vyasadeva, que o elaborou de sua experiência madura do conhecimento transcendental sob a instrução de Sri Narada Muni, seu mestre espiritual. Vyasadeva compilou toda a literatura Védica - os quatro Vedas, o Vedanta-sutra ou Brahma-sutras, os puranas e o Mahabharata. Mesmo assim ele não ficou satisfeito até que escreveu o Srimad Bhagavatam. Sua insatisfação foi observada por seu mestre espiritual, e conseqüentemente Narada o aconselhou para escrever sobre as atividades transcendentais do Senhor Sri Krishna. As atividades transcendentais de Sri Krishna são especificamente descritas no Décimo Canto do Srimad Bhagavatam, o Canto que é considerado como o que contém a substância de toda a obra. Não se deve aproximar do Décimo Canto imediatamente e sim deve ser aproximado gradualmente pelo desenvolvimento do conhecimento sobre outros assuntos apresentados primeiramente.

Geralmente uma mente filosófica é inquisitiva para aprender a origem de todas criações. Quando alguém filosófico vê o céu da noite, naturalmente levanta questões sobre as estrelas, como elas estão situadas, quem vive lá, etc.. Todas essas indagações são bem naturais para um ser humano, porque o ser humano tem uma consciência maior desenvolvida do que os animais. Em resposta a essa questão, o autor do Srimad Bhagavatam diz que o Senhor é a origem de todas criações. Ele não é só o criador mas o mantenedor e aniquilador também. A criação cósmica manifestada é criada por um certo período pelo desejo do Senhor, é mantida por algum tempo e finalmente é aniquilada por Sua vontade. Ele é a vontade suprema por trás de todas atividades.

Claro que existem ateístas de várias categorias que não acreditam no criador, mas isso é devido a seu pobre fundo de conhecimento. Os cientistas modernos criam foguetes, por um arranjo ou outro eles são lançados no espaço sideral para voar por algum tempo sob o controle de um cientista bem distante. Todos os universos e os inumeráveis planetas dentro deles são similares a esses foguetes, e todos eles são controlados pela Personalidade de Deus.

Nas literaturas Védicas é dito que a Verdade Absoluta, a Personalidade de Deus, é o principal entre todas as personalidades vivas. Todos seres vivos, desde o primeiro ser vivo criado, Brahma, abaixo até a menor formiga, são seres vivos individuais. Mesmo acima de Brahma existem muitos outros seres vivos com capacidades individuais. A Personalidade de Deus em Pessoa também é um ser vivo e é tão individual quanto os outros seres vivos. Todavia, o Supremo Senhor é o ser vivo supremo, e Ele possui a mente mais grandiosa e possui energias inconcebíveis supremas em grande variedade. Se a mente de um humano pode produzir foguetes e espaçonaves, é concebível que uma mente superior à dos seres humanos pode produzir coisas superiores. Uma pessoa sensata aceitará esse argumento mas pessoas teimosas obstinadas não.

Srila Vyasadeva imediatamente aceita a mente suprema como o paramesvara, o controlador supremo. Como afirmado no Bhagavad-gita e todas as outras escrituras escritas por Srila Vyasadeva, o paramesvara é Sri Krishna Ele mesmo. Isso é especificamente validado no Srimad Bhagavatam. No Bhagavad-gita também o Senhor em Pessoa diz que não existe nenhum paratattva (summum bonum) superior a Ele mesmo. Portanto o autor imediatamente adora o paratattva, Sri Krishna, cujas atividades transcendentais são descritas no Décimo Canto.

Pessoas inescrupulosas vão direto para o Décimo Canto, especialmente para os cinco capítulos que descrevem a dança rasa do Senhor. Todavia, essa porção do Srimad Bhagavatam é a parte mais confidencial dessa grande literatura. A menos que alguém esteja completamente realizado no conhecimento transcendental do Senhor, com certeza interpretará errado os passatempos transcendentais adoráveis do Senhor na dança rasa e os relacionamentos amorosos do Senhor com as gopis. Esse assunto é altamente espiritual e técnico, e somente personalidades liberadas que atingiram gradualmente o estágio de paramahamsa podem transcendentalmente saborear a dança rasa adorável.

Portanto Srila Vyasadeva dá ao leitor uma chance para se desenvolver gradualmente na realização espiritual antes de saborear a essência dos passatempos do Senhor. Assim Vyasadeva profusamente invoca o gayatri mantra: dhimahi. Esse gayatri mantra é especialmente destinado para pessoas avançadas espiritualmente. Quando alguém obtém o sucesso em cantar o gayatri mantra, pode entrar dentro da posição transcendental do Senhor. Primeiro, entretanto, deve-se adquirir as qualidades brahmanas e se tornar perfeitamente situado no modo da bondade a fim de cantar o gayatri mantra com sucesso. A partir desse ponto pode-se começar a realizar o Senhor transcendentalmente, Seu nome, Sua fama, Suas qualidades, etc.. Srimad Bhagavatam é uma narração relacionada com o svarupa (forma) do Senhor, que é manifestado pela Sua potência interna. Essa potência é distinta da potência externa, que manifestou o mundo cósmico dentro da nossa experiência. Srila Vyasadeva faz uma distinção clara entre as potências interna e externa logo no primeiro verso do Primeiro Capítulo do Srimad Bhagavatam. Nesse verso ele diz que a potência interna é realidade verdadeira, enquanto energia externa manifestada na forma da existência material é temporária e ilusória, não mais real do que uma miragem no deserto. Água pode parecer estar presente numa miragem, mas a água de verdade está em algum outro lugar. Similarmente, a criação cósmica manifestada parece ser realidade, mas é simplesmente um reflexo da realidade verdadeira que existe no mundo espiritual. No mundo espiritual não existem miragens. A Verdade Absoluta está lá; não está aqui neste mundo material. Aqui, tudo é verdade relativa; uma verdade parece depender da outra. Esta criação cósmica resulta de uma interação dos três modos da natureza material. As manifestações temporárias são criadas assim para apresentarem uma ilusão da realidade para a mente confusa da alma condicionada. Assim aparecem a existir tantas espécies de vida, inclusive semideuses elevados tais quais Brahma, Indra, Chandra, etc.. De fato não existe realidade no mundo manifestado, mas parece ser realidade porque a verdadeira realidade existe no mundo espiritual, onde a Personalidade de Deus habita eternamente com Sua parafernália transcendental.

O engenheiro chefe de uma construção complicada não faz parte pessoalmente da construção em si, mas ele é o único que conhece todos pontos e cantos da construção porque tudo é executado sob suas instruções somente. Em outras palavras, ele sabe tudo sobre a construção diretamente e indiretamente. Similarmente, a Personalidade de Deus, que é o engenheiro supremo desta criação cósmica, sabe muito bem o que acontece em cada ponto e canto da criação cósmica, apesar das atividades perecerem ser executadas por alguém mais. Na realidade ninguém é independente na criação material; a mão do Supremo Senhor está em toda parte. Todos elementos materiais, e também todas centelhas espirituais, são apenas emanações Dele somente. Qualquer coisa criada neste mundo material é criada pela interação das duas energias, material e espiritual. Essas energias pertencem à Verdade Absoluta, a Personalidade de Deus, Sri Krishna.

Um químico pode manufaturar água no laboratório por misturar hidrogênio e oxigênio, mas na realidade o ser vivo só pode trabalhar sob a direção do Supremo Senhor. De fato, todos materiais usados por um químico são fornecidos pelo Senhor. O Senhor conhece tudo diretamente e indiretamente, e Ele é conhecedor de todos os mínimos detalhes de tudo. Ele também é plenamente independente. Ele pode ser comparado a uma mina de ouro, e as criações cósmicas podem ser comparadas a ornamentos feitos com esse ouro, tais quais anéis de ouro, brincos, etc.. O anel e brinco de ouro são qualitativamente unos com o ouro na mina, mas quantitativamente o ouro na mina e o ouro no brinco ou colar são diferentes. A filosofia da Verdade Absoluta do Senhor Chaitanya se centra em torno do fato do Supremo Senhor ser simultaneamente uno com e diferente de Sua criação. Nada é absolutamente igual à Verdade Absoluta, mas ao mesmo tempo nada é independente dela.

Almas condicionadas, a começar por Brahma, o engenheiro deste universo particular, abaixo até uma formiga insignificante, todos criam alguma coisa, mas nenhum deles é independente do Supremo Senhor. O materialista pensa erroneamente que não existe nenhum criador fora de seu próprio bom eu, e isso se chama maya, ou ilusão. Devido a seu pobre fundo de conhecimento, o materialista não pode ver além do alcance de seus sentidos imperfeitos; assim ele pensa que a matéria toma sua forma automaticamente independente de uma consciência por trás dela. Isso é rejeitado por Srila Vyasadeva no primeiro verso do Srimad Bhagavatam. Como foi afirmado antes, Vyasadeva é uma alma liberada, e ele compilou esse livro de autoridade depois de alcançar perfeição espiritual. Porque o todo completo, ou a Verdade Absoluta, é a fonte de tudo, nada é independente Dele. Tudo existe dentro do corpo da Verdade Absoluta. Qualquer ação ou reação de uma parte de um corpo se torna um fato consciente para o todo corporificado. Similarmente, se a criação habita dentro do corpo da Verdade Absoluta, então nada é desconhecido para o absoluto, diretamente ou indiretamente.

No sruti-mantra está afirmado que o todo absoluto, ou Brahman, é a fonte última de tudo. Tudo emana Dele, tudo é mantido por Ele, e no fim tudo entra Nele novamente. Essa é a lei da natureza. Isso também é confirmado no smrti-mantra. Lá está dito que no começo do milênio de Brahma, a fonte da qual tudo emana é a Verdade Absoluta, ou Brahman, e no fim desse milênio o reservatório onde tudo entra é a mesma Verdade Absoluta. Cientistas materialistas ao acaso tomam como certo que a fonte última deste sistema planetário é o Sol, mas eles são incapazes de explicar a fonte do Sol. Nas literaturas Védicas a fonte última é explicada; Brahma é o criador do universo, mas porque ele teve que meditar a fim de receber a inspiração para uma criação dessa, ele não é o criador último. Como está afirmado no primeiro verso do Srimad Bhagavatam, Brahma foi ensinado conhecimento Védico pela Personalidade de Deus. No primeiro verso do Srimad Bhagavatam é dito que o Supremo Senhor inspirou um criador secundário, Brahma, e o capacitou para levar a cabo suas funções criativas. Desse modo o Supremo Senhor é o engenheiro superintendente; a mente real por trás de todos agentes criativos da Personalidade de Deus Absoluta, Sri Krishna. No Bhagavad-gita Sri Krishna admite pessoalmente que é Ele unicamente que superintende a energia criativa (prakrti), a soma total da matéria. Assim Sri Vyasadeva não adora nem Brahma nem o Sol mas o Supremo Senhor, que guia tanto Brahma quanto o Sol em suas atividades criativas.

As palavras em sânscrito abhijña e svarat, que aparecem no primeiro verso do Srimad Bhagavatam, são significativas. Essas duas palavras distinguem o Senhor de todos os outros seres vivos. Nenhum ser vivo outro do que o ser supremo, a Personalidade de Deus Absoluta, é tanto abhijña quanto svarat - isto é, nenhum deles é plenamente consciente ou plenamente independente. Todos têm que aprender de seu superior sobre conhecimento, mesmo Brahma, que é o primeiro ser vivo dentro deste mundo material, tem que meditar no Supremo Senhor e pedir a ajuda Dele a fim de criar. Se Brahma ou o Sol não podem criar nada sem adquirir conhecimento de um superior, então qual é a situação com os cientistas materialistas que são plenamente dependentes de tantas coisas? Cientistas modernos como Jagadisha Chandra Bose, Isaac Newton, Albert Einstein, etc., podem ser bem arrogantes sobre suas respectivas energias criativas, mas todos eram dependentes do Supremo Senhor para tantas coisas. Depois de tudo, os cérebros altamente inteligentes desses cavalheiros certamente não são produtos de nenhum ser humano. O cérebro é criado por outro agente. Se cérebros como os de Einstein ou Newton pudessem ser manufaturados por um ser humano, então a humanidade teria produzido muitos desses cérebros em vez de elogiar a passagem deles. Se cientistas como esses não podem nem mesmo manufaturar esses cérebros, o que dizer de ateístas idiotas que desafiam a autoridade do Senhor?

Mesmo os impersonalistas Mayavadi que se vangloriam e acreditam que se tornaram o Senhor eles mesmos não são abhijñah ou svarat, plenamente consciente ou plenamente independente. Os monistas Mayavadi se submetem a um processo severo de austeridade e penitência para adquirir conhecimento de se tornar uno com o Senhor, mas ultimamente eles se tornam dependentes de algum seguidor rico que os supre com parafernália para construir grandes monastérios e templos. Ateístas como Ravana e Hiranyakashipu tiveram que se submeter a severas penitências antes de poderem desafiar a autoridade do Senhor, mas ultimamente eles ficaram tão desamparados que não conseguiram se salvar quando o Senhor apareceu perante eles como a morte cruel. Isso também é aplicável para os ateístas modernos que ousam desafiar a autoridade do Senhor. Tais ateístas serão tratados com a mesma sentença que foi dada no passado para grandes ateístas como Ravana e Hiranyakashipu. A história se repete, e o que ocorreu no passado reaparecerá novamente e novamente quando houver necessidade. Sempre que a autoridade do Senhor é negligenciada, as penalidades que lidam com as leis da natureza estão sempre lá.

Que o Supremo Senhor, a Personalidade de Deus, é todo-perfeito é confirmado em todos os sruti-mantras. É dito nos sruti-mantras que o Senhor todo-perfeito olhou sobre a matéria e assim criou todos os seres vivos. Os seres vivos são partes e parcelas do Senhor, e Ele impregna a vasta natureza material com as sementes das centelhas espirituais. Assim as energias criativas são postas em movimento para tantas criações maravilhosas. Quando um ateu argumenta que Deus não é mais esperto do que o manufaturador de um relógio fino que tem tantas partes delicadas, temos de responder que Deus é um mecânico maior do que o relojoeiro porque Ele simplesmente cria uma máquina nas formas masculina e feminina, e as formas masculina e feminina seguem a produzir inumeráveis máquinas similares sem mais atenção de Deus. Se um humano pudesse manufaturar um conjunto de máquinas capazes de produzir outras máquinas sem que o homem precise dar mais nenhuma atenção à matéria, então poderíamos dizer que o homem igualou a inteligência de Deus. Claro que isso não é possível. Cada e toda das máquinas imperfeitas dos humanos têm de ser manipuladas individualmente por um mecânico. Porque ninguém pode ser igual em inteligência a Deus, outro nome de Deus é asamaurdhva, o qual indica que ninguém mais é igual ou superior a Ele. Todos têm seu intelecto igual e superior, e ninguém pode reclamar que não tem nenhum. Todavia, esse não é o caso do Senhor. Os sruti-mantras indicam que antes da criação do universo material, o Senhor existia, e Ele era o senhor de todos. Foi o Senhor que instruiu Brahma no conhecimento Védico. Essa Personalidade de Deus tem que ser obedecida em todos aspectos. Qualquer um que queira se tornar livre do enredamento material deve se render a Ele, isso é confirmado no Bhagavad-gita.

A menos que alguém se renda aos pés de lótus da Personalidade de Deus, é certeza que ficará desorientado. Mesmo se acontecer de ser uma grande mente. Somente quando grandes mentes se rendem aos pés de lótus de Vasudeva e sabem plenamente que Vasudeva é a causa de todas as causas, como confirmado no Bhagavad-gita (7.19), que eles podem se tornar mahatmas, ou mente ampla de verdade. Todavia, tais mahatmas de mente aberta são vistos raramente. Somente eles, entretanto, podem entender o Supremo Senhor como a Personalidade de Deus Absoluta, a causa primordial de todas criações. Ele é parama, verdade última, porque todas as outras verdades são dependentes Dele. Porque Ele é a fonte de todo conhecimento, Ele é onisciente; não existe ilusão para Ele como existe para o conhecedor relativo.

Alguns intelectuais Mayavadi argumentam que o Srimad Bhagavatam não foi compilado por Srila Vyasadeva, e alguns sugerem que o livro é uma criação moderna escrita por alguém chamado Vopadeva. A fim de refutar esse argumento sem sentido, Srila Shridhara Swami indica que existem muitos dos puranas antigos que fazem referência ao Srimad Bhagavatam. O primeiro sloka, ou verso, do Srimad Bhagavatam começa com o Gayatri mantra, e há referência disso no Matsya Purana (o Purana mais velho). Com referência ao contexto do Gayatri mantra no Srimad Bhagavatam, nesse Purana está dito, "Aquele que contém muitas narrações de instrução espiritual, começa com o Gayatri mantra e contém a história de Vritrasura, é conhecido como Srimad Bhagavatam. Quem quer que presenteie essa grande obra num dia de lua cheia atinge a perfeição mais elevada da vida e vai de volta ao Supremo". Também existe referência ao Srimad Bhagavatam em outros Puranas que até mesmo indicam que a obra consiste em Doze Cantos e dezoito mil slokas. No Padma Purana também há referência sobre o Srimad Bhagavatam durante uma conversação entre Gautama e Maharaja Ambarisha. Maharaja Ambarisha foi aconselhado a ler Srimad Bhagavatam regularmente se ele desejasse liberação do cativeiro material. Sob essas circunstâncias, não existe dúvida a respeito da autoridade do Srimad Bhagavatam. Pelos últimos quinhentos anos muitos intelectuais fizeram comentários elaborados sobre Srimad Bhagavatam e exibiram erudição única. O estudante sério fará bem por tentar ir através deles a fim de mais feliz saborear as mensagens transcendentais do Bhagavatam.

Srila Visvanatha Chakravarti Thakura especificamente trata de psicologia sexual pura e original (adi-rasa) desprovida de toda embriaguez mundana. O mundo material inteiro gira devido ao princípio básico da vida sexual. Na civilização humana moderna, sexo é o ponto central de todas atividades, de fato, para onde viramos nossa face vemos vida sexual proeminente. Conseqüentemente vida sexual não é irreal; sua realidade verdadeira é experimentada no mundo espiritual. Sexo material é apenas um reflexo pervertido do original; o original é encontrado na Verdade Absoluta. Isso valida o fato que a Verdade Absoluta é pessoal, porque a Verdade Absoluta não pode ser impessoal e ter um sentido de vida sexual pura. A filosofia monista impessoal dá um ímpeto indireto para sexo mundano abominável porque isso excessivamente enfatiza a impersonalidade da verdade última. O resultado é que a humanidade que carece de conhecimento aceitou a vida sexual material pervertida como tudo em tudo porque não tem informação da verdadeira forma de sexo espiritual. Existe uma distinção entre sexo na condição doentia da vida material e sexo na existência espiritual. O Srimad Bhagavatam gradualmente eleva o leitor imparcial para o estágio de perfeição da transcendência mais elevado acima dos três modos da natureza material, ações lucrativas, filosofia especulativa e acima da adoração de deidades funcionais indicadas nos Vedas. O Srimad Bhagavatam é a corporificação do serviço devocional para a Suprema Personalidade de Deus Krishna e por isso está situado numa posição superior a outras literaturas Védicas.

Religião inclui quatro assuntos principais: (1) atividades piedosas, (2) desenvolvimento econômico, (3) satisfação dos sentidos, e (4) liberação do cativeiro material. Vida religiosa é distinta da vida irreligiosa do barbarismo. De fato, pode ser dito que a vida humana começa realmente com religião. Os quatro princípios da vida animal - comer, dormir, defender-se e acasalar - são comuns tanto para animais quanto seres humanos, mas religião é o interesse especial dos seres humanos. Porque vida humana não é melhor do que vida animal sem religião, numa sociedade humana de verdade existe alguma forma de religião destinada à auto-realização e com referência ao relacionamento eterno da pessoa com Deus.

No estágio mais baixo da civilização humana sempre existe competição entre humanos em sua tentativa de dominar a natureza material. Em outras palavras, existe rivalidade constante na tentativa de satisfazer os sentidos. Assim guiados pela consciência da satisfação sensual, encenam rituais religiosos. As atividades piedosas e funções religiosas são executadas com um objetivo de adquirir algum ganho material, e se esse ganho material for obtenível de outro modo, essa dita religião é negligenciada. Isso pode ser visto na civilização humana moderna. Porque os desejos econômicos das pessoas parecem ser satisfeitos de outro modo, ninguém está interessado em religião agora. As igrejas, mesquitas e templos estão praticamente vazios, porque as pessoas estão mais interessadas em fábricas, shoppings, e cinemas. Assim elas deserdaram os locais religiosos erigidos por seus antepassados. Essa é a evidência que a religião é geralmente executada com o propósito do desenvolvimento econômico, e desenvolvimento econômico é requerido para satisfação sensual. Quando a pessoa se frustra na sua tentativa de atingir satisfação sensual, ela adota a causa da salvação a fim de se tornar una com o supremo todo. Todas essas atividades surgem com o mesmo objetivo em vista - satisfação sensual.

Nos Vedas, os quatro assuntos primários mencionados acima são prescritos de um modo regulador para que não haja competição por satisfação sensual. Todavia, o Srimad Bhagavatam é transcendental a todas atividades de satisfação dos sentidos do mundo material. É uma literatura transcendental pura, compreensível pelos devotos do Senhor que estão acima da competição na satisfação sensual. No mundo material existe forte concorrência entre animais, humanos, comunidades e mesmo nações na tentativa de satisfazer os sentidos, mas os devotos do Senhor estão acima de tudo isso. Devotos não têm necessidade de competir com materialistas porque eles estão no caminho de volta ao Supremo, de volta ao lar onde tudo é eterno, pleno e bem-aventurado. Tais transcendentalistas são cem por cento não invejosos e são portanto puros no coração. Porque todo mundo no mundo material é invejoso, existe competição. Os devotos do Senhor não só estão livres de toda inveja material, mas eles também são bondosos com todos na tentativa de estabelecer uma sociedade sem competição com Deus no centro.

A idéia socialista de uma sociedade desprovida de competição é artificial porque mesmo nos estados socialistas existe competição pelo poder. É um fato que o princípio da satisfação sensual é o princípio básico da vida materialista, e isso pode ser realizado ou por ler os Vedas ou simplesmente observar atividades humanas comuns. Os Vedas recomendam atividades piedosas pelas quais as pessoas podem avançar para os planetas superiores, e também recomendam adoração de vários semideuses com o propósito de atingir os planetas deles. Ultimamente os Vedas recomendam atividades pelas quais pode-se alcançar a Verdade Absoluta e realizar Sua característica impessoal a fim de se tornar uno com Ele. Entretanto, o aspecto impessoal da Verdade Absoluta não é a última palavra. Acima do aspecto impessoal está o Paramatma, ou a Superalma, e acima desse está a Suprema Personalidade de Deus. O Srimad Bhagavatam dá informação sobre as qualidades pessoais da Verdade Absoluta, qualidades as quais estão além do aspecto impessoal. Tópicos a respeito dessas qualidades são maiores do que os tópicos da especulação filosófica impessoal; conseqüentemente ao Srimad Bhagavatam é dado um status superior do que as porções jñana-kanda dos Vedas. O Srimad Bhagavatam também é maior do que as porções karma-kanda e upasana-kanda também porque recomenda a adoração da Suprema Personalidade de Deus, Sri Krishna, o filho divino de Vasudeva. A porção karma-kanda dos Vedas é carregada com competição para alcançar os planetas celestiais para melhor satisfação sensual, e essa competição também é vista nas porções jñana-kanda e upasana-kanda. O Srimad Bhagavatam está acima de tudo isso porque visa somente a Suprema Verdade, a substância ou raiz de todas categorias.

Em outras palavras, do Srimad Bhagavatam nós podemos conhecer a substância e também as relatividades em seu sentido e perspectiva verdadeiros. A substância é a Verdade Absoluta, a Suprema Personalidade de Deus, e as relatividades são as diferentes formas de energia que emanam Dele. Porque os seres vivos também são relacionados a Suas energias, não existe nada realmente diferente da substância. Ao mesmo tempo, as energias são diferentes da substância. No sentido material, esse conceito é autocontraditório, mas o Srimad Bhagavatam explicitamente trata desse aspecto da unidade e diferença simultâneas. Essa filosofia também é encontrada no Vedanta-sutra que começa com o sutra janmady asya. Conhecimento da unidade e diferença simultâneas encontrado na Verdade Absoluta é transmitido para o bem-estar de todos. Especuladores mentais desviam as pessoas por estabelecer a energia do Senhor como absoluta, mas quando a verdade da unidade e diferença simultâneas é compreendida, os conceitos imperfeitos de monismo e dualidade cessam de satisfazer. Por entender a unidade com o Senhor e diferença de Sua criação simultâneas, pode-se atingir imediatamente liberdade das misérias triplas - misérias infligidas pelo corpo e mente, por outros seres vivos e por atos da natureza.

O Srimad Bhagavatam começa com a rendição do ser vivo para a Pessoa Absoluta. Essa rendição é feita com a consciência clara e ciência da unidade do devoto com o Absoluto, e, ao mesmo tempo, de sua posição eterna de servidão. No conceito material, a pessoa pensa que ela mesma é o Senhor de tudo que ela inspeciona; conseqüentemente está sempre perturbada pelas misérias triplas da vida. Logo que alguém chega a conhecer sua posição real no serviço transcendental, imediatamente se torna livre de todas essas misérias. A posição de servidor é desperdiçada no conceito de vida material. Numa tentativa de dominar a natureza material, o ser vivo é forçado a oferecer seu serviço para a energia material relativa. Quando esse serviço é transferido para o Senhor na consciência pura da identidade espiritual, o ser vivo imediatamente se torna livre dos ônus da afeição material.

Sobre e acima disso, o Srimad Bhagavatam é o comentário pessoal sobre o Vedanta-sutra feito por Vyasadeva quando ele alcançou a maturidade na realização espiritual. Ele foi capaz de escrevê-lo pela ajuda da misericórdia de Narada. Vyasadeva também é uma encarnação de Narayana, a Personalidade de Deus; portanto não há questão sobre sua autoridade. Apesar dele ser o autor de toda literatura Védica, ele especificamente recomenda o estudo do Srimad Bhagavatam. Em outros puranas vários métodos de adoração aos semideuses são mencionados, mas no Srimad Bhagavatam somente a Suprema Personalidade de Deus é mencionada. O Supremo Senhor é o corpo total, e os semideuses são diferentes partes desse corpo. Por isso que se alguém adora o Supremo Senhor, não necessita adorar os semideuses, porque o Supremo Senhor está dentro dos corações dos semideuses. O Senhor Chaitanya Mahaprabhu distinguiu o Srimad Bhagavatam de todos os outros puranas por recomendá-lo como o Purana imaculado.

O método pelo qual a mensagem transcendental é recebida é o método de ouvir com submissão. Uma atitude de desafio não pode ajudar a pessoa a receber ou realizar a mensagem transcendental, portanto no segundo verso do Srimad Bhagavatam a palavra susrusu é usada. Essa palavra indica que a pessoa tem que estar ansiosa para ouvir a mensagem transcendental. O desejo de ouvir com interesse é a qualificação primária para assimilar conhecimento transcendental. Infelizmente muitas pessoas não estão interessadas em ouvir pacientemente a mensagem do Srimad Bhagavatam. O processo é simples mas a aplicação difícil. Aqueles que são desafortunados encontrarão tempo para ouvir tópicos ordinários sociais e políticos, mas quando são convidados para assistirem a uma assembléia para ouvir Srimad Bhagavatam, são relutantes em comparecer. Às vezes pessoas se entregam a ouvir porções do Srimad Bhagavatam as quais não estão preparadas para ouvir. Leitores profissionais do Bhagavatam se entregam à leitura das porções confidenciais que tratam dos passatempos do Supremo Senhor. Essas porções parecem ser lidas iguais à literatura sexual. Todavia, o Srimad Bhagavatam é destinado a ser ouvido desde o início, e aqueles que são aptos para assimilar as mensagens do Bhagavatam são mencionados logo no início (Bhag. 1.1.2): Uma audiência fidedigna apta para ouvir o Srimad Bhagavatam é gerada depois de muitos feitos piedosos. Uma pessoa intelectual pode acreditar nas garantias do grande sábio Vyasadeva e pacientemente ouvir as mensagens do Srimad Bhagavatam com paciência a fim de realizar a Suprema Personalidade de Deus diretamente. Não há necessidade de esforço árduo através dos diferentes estágios Védicos de realização, porque alguém pode ser elevado à posição de paramahamsa simplesmente por concordar em ouvir a mensagem do Srimad Bhagavatam com paciência. Os sábios de Naimisharanya disseram a Suta Goswami que eles estavam intensamente desejosos de entender Srimad Bhagavatam. Eles ouviam de Suta Goswami sobre Krishna, a Suprema Personalidade de Deus, e eles nunca ficaram saciados por essas discussões. Pessoas que são realmente apegadas a Krishna nunca querem parar de ouvir sobre Ele.

O Senhor Chaitanya então aconselhou Prakashananda Sarasvati: "Sempre leia o Srimad Bhagavatam e tente entender todo e cada verso. Assim você realmente entenderá Brahma-sutra. Você diz que está muito ansioso para estudar Vedanta-sutra, mas você não pode entender Vedanta-sutra sem entender Srimad Bhagavatam". Ele também aconselhou Prakashananda Sarasvati a sempre cantar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. "E, por fazer isso, você será liberado muito facilmente. Depois da liberação você será elegível para alcançar o objetivo mais elevado da vida, amor do Supremo".

O Senhor então recitou muitos versos das escrituras autênticas tais quais Srimad Bhagavatam, Bhagavad-gita e Nrisimha-tapani. Em particular, Ele citou o seguinte verso do Bhagavad-gita:

brahma-bhutah prasannatma
na socati na kanksati
samah sarvesu bhutesu
mad-bhaktim labhate param

"A pessoa que está situada transcendentalmente imediatamente realiza o Brahman Supremo. Nunca lamenta nem deseja ter nada; é igualmente disposta com todo ser vivo. Nesse estado, ela alcança serviço devocional puro a Mim" (Bg. 18.54).

Quando a pessoa alcança essa plataforma brahma-bhuta (Bhag. 4.30.20), ela vê todos os seres vivos igualmente e se torna um devoto puro do Supremo Senhor. No Nrisimha-tapani (2.5.16) é dito que quando uma pessoa está realmente liberada, pode entender os passatempos transcendentais do Supremo Senhor e assim se dedicar em Seu serviço devocional. O Senhor Chaitanya também citou um verso do Segundo Canto do Srimad Bhagavatam (2.1.9) no qual Shukadeva Goswami admite que embora ele estivesse elevado ao estágio liberado e livre das garras de maya, mesmo assim ele ficou atraído pelos passatempos transcendentais de Krishna. Conseqüentemente ele estudou Srimad Bhagavatam de seu grande pai, Vyasadeva.

O Senhor Chaitanya também citou outro sloka do Srimad Bhagavatam (3.15.43) a respeito dos Kumaras. Quando os Kumaras entraram no templo do Senhor, eles ficaram atraídos pelo aroma das flores e folhas de tulasi oferecidas aos pés de lótus do Senhor com polpa de sândalo. Simplesmente por cheirar o aroma dessas oferendas, as mentes dos Kumaras se voltaram para o serviço do Supremo Senhor, apesar do fato que os Kumaras já eram almas liberadas. Está afirmado em outra parte do Bhagavatam (1.7.10) que mesmo se alguém for uma alma liberada e estiver realmente livre da contaminação material, ainda pode, sem causa, ficar atraído pelo serviço devocional do Supremo Senhor. Assim Deus é tão atraente, e porque Ele é tão atraente, Ele é chamado Krishna.

Desse modo, o Senhor Chaitanya discutiu o verso Atmarama do Srimad Bhagavatam com Prakashananda Sarasvati. Admirador do Senhor Chaitanya, o brahmana Maharashtriya, relatou que o Senhor explicou esse verso em sessenta e um modos diferentes. Todos reunidos ali estavam muito ansiosos para ouvir as diferentes versões do sloka Atmarama novamente, e porque estavam tão ansiosos, o Senhor Chaitanya explicou o sloka do mesmo modo que Ele havia explicado para Sanatana Goswami. Todos que ouviram as explanações do sloka Atmarama ficaram admirados. De fato, todos consideraram o Senhor Chaitanya como não outro além de Sri Krishna em Pessoa.

      

         

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Vinte e Quatro

Conversas com Sarvabhauma Bhattacharya

Quando o Senhor Chaitanya encontrou Sarvabhauma Bhattacharya em Jagannatha Puri, Bhattacharya, que era o melhor lógico da época, também queria ensinar Vedanta ao Senhor. Porque Bhattacharya era um senhor idoso, da idade do pai do Senhor Chaitanya, ele sentiu compaixão pelo jovem sannyasi e Lhe pediu para aprender Vedanta-sutra dele. Senão, Bhattacharya manteve, seria difícil para o Senhor Chaitanya continuar como um sannyasi. Quando o Senhor finalmente concordou, Bhattacharya começou a ensinar para Ele dentro do templo de Jagannatha. Bhattacharya lecionou sobre o Vedanta-sutra continuamente por sete dias, e o Senhor o ouviu sem falar uma palavra. No oitavo dia, Bhattacharya disse: "Você ouve Vedanta-sutra de mim pela última semana, mas Você não fez nenhuma pergunta, nem indicou se o explico bem. Por isso não posso dizer se Você me entende ou não".

"Eu sou um tolo", o Senhor respondeu. "Eu não tenho capacidade para estudar Vedanta-sutra, mas porque você Me pediu para ouvi-lo, Eu tento ouvir. Eu simplesmente o ouço porque você disse que é dever de cada sannyasi ouvir Vedanta-sutra. Mas a respeito do significado que você transmite - Eu não posso entender isso". Assim o Senhor indicou que na sampradaya Mayavadi existem muitos ditos sannyasis que, mesmo iletrados e pouco inteligentes, ouvem Vedanta-sutra de seus mestres espirituais justamente como caso de formalidade. Apesar de ouvirem, não entendem nada. No que diz respeito ao Senhor Chaitanya, Ele disse que não entendeu a explicação dada pelo Bhattacharya não porque era muito difícil para Ele entender mas porque Ele não aprovava a interpretação Mayavadi.

Quando o Senhor disse que Ele era um tolo sem educação e não conseguiu acompanhar as exposições, Bhattacharya respondeu: "Se Você não acompanha o que eu digo, por que Você não pergunta? Por que Você simplesmente senta aí silencioso? Parece que Você tem algo a dizer sobre minhas explanações".

"Meu querido senhor", o Senhor respondeu. "No que diz respeito ao Vedanta-sutra ou os códigos do Vedanta, Eu posso entender o significado muito bem. Todavia, Eu não consigo entender suas explicações. Não existe nada realmente difícil sobre o significado do Vedanta-sutra original, mas o modo que você explica Vedanta-sutra parece obscurecer o verdadeiro significado. Você não elucida o significado direto mas imagina algo e conseqüentemente obscurece o significado verdadeiro. Eu acho que você tem algum tipo de doutrina particular a qual você tenta expor através dos códigos do Vedanta-sutra".

De acordo com o Muktika Upanishad, existem 108 Upanishads. Entre eles são: (1) Isha, (2) Kena, (3) Katha, (4) Prashna, (5) Mundaka, (6) Mandukya, (7) Tittiri, (8) Aitareya, (9) Chandogya, (10) Brihad-aranyaka, (11) Brahma, (12) Kaivalya, (13) Javala, (14) Shwetashva, (15) Hamsa, (16) Arunih, (17) Garbha, (18) Narayana, etc.. Esses 108 Upanishads contêm todo conhecimento sobre a Verdade Absoluta. Às vezes as pessoas perguntam sobre o significado das 108 contas do rosário, mas porque nós pensamos que existem 108 Upanishads que contêm conhecimento completo sobre a Verdade Absoluta, por isso 108 contas são aceitas. Às vezes, por outro lado, os transcendentalistas Vaishnava pensam que as 108 contas representam as 108 companheiras do Senhor Krishna em Sua dança rasa, e por isso 108 contas são aceitas.

O Senhor Chaitanya protestou contra más interpretações dos Upanishads, e Ele rejeitou qualquer explicação que não dá o significado direto dos Upanishads. A interpretação direta é chamada abhidha-vrtti, enquanto a interpretação indireta é chamada laksana-vrtti. A interpretação indireta não serve nenhum propósito. Existem quatro tipos de entendimento, chamados: (1) entendimento direto (Pratyaksa), (2) entendimento hipotético (anumana), entendimento histórico (aitihya) e (4) entendimento através do som (sabda). Desses quatro, entender das escrituras Védicas (que são as representações sonoras da Verdade Absoluta) é o melhor método. Os estudantes Védicos tradicionais aceitam o entendimento através do som como o melhor.

As fezes e ossos de qualquer ser vivo são considerados impuros de acordo com literaturas Védicas, ainda assim as literaturas Védicas afirmam que esterco de vaca e conchas são puros. Aparentemente essas declarações são contraditórias, mas porque esterco de vaca e conchas são considerados puros pelos Vedas, eles são aceitos como puros pelos seguidores dos Vedas. Se quisermos entender as declarações por interpretação indireta, então teremos que desafiar as declarações Védicas. Em outras palavras, as declarações Védicas não podem ser aceitas por nossas interpretações imperfeitas; elas têm que ser aceitas como elas são. Se não forem aceitas desse modo, não existe autoridade nas declarações Védicas.

De acordo com o Senhor Chaitanya, aqueles que tentam dar interpretações pessoais para as declarações Védicas não são inteligentes nenhum pouco. Eles desviam seus seguidores por inventar suas próprias interpretações. Na Índia existe uma classe humana conhecida como arya-samaja a qual diz que eles aceitam os Vedas originais somente e rejeitam todas as outras literaturas Védicas. O motivo dessas pessoas, entretanto, é dar suas próprias interpretações. De acordo com o Senhor Chaitanya, tais interpretações não devem ser aceitas. Elas simplesmente não são Védicas. O Senhor Chaitanya disse que as declarações Védicas dos Upanishads são iguais o brilho solar. Tudo fica claro e muito distinto quando é visto na luz solar; as declarações dos Vedas são similarmente claras e distintas. Os filósofos Mayavadis simplesmente cobrem a luz solar com a nuvem da má interpretação.

O Senhor Chaitanya então disse que todas as declarações Védicas dos Upanishads se destinam à verdade última conhecida como Brahman. A palavra Brahman significa "o maior", e quando falamos sobre o maior, nós nos referimos imediatamente à Suprema Personalidade de Deus, a fonte de todas emanações. A menos que o maior possua seis opulências em plenitude, não pode ser chamado o maior. O maior, que é pleno em seis opulências, é a Suprema Personalidade de Deus. Em outras palavras, o Brahman Supremo é a Suprema Personalidade de Deus também. No Bhagavad-gita (10.12) Krishna é aceito por Arjuna como o Brahman Supremo (param brahma). Os conceitos do Brahman impessoal e do Paramatma localizado estão contidos dentro do entendimento da Suprema Personalidade de Deus.

Sempre que falamos da Suprema Personalidade de Deus, adicionamos a palavra sri, indica que Ele é pleno com seis opulências. Em outras palavras, Ele é eternamente uma pessoa; se Ele não fosse uma pessoa, as seis opulências não poderiam estar presentes em plenitude. Se dissermos que a Verdade Absoluta Suprema é impessoal, queremos dizer que Sua personalidade não é material. Assim com o propósito de distinguir Seu corpo transcendental dos corpos materiais ordinários, alguns filósofos O explicaram como impessoal do ponto de vista material. Em outras palavras, personalidade material é negada, personalidade espiritual é estabelecida. No Shwetashvatara Upanishad (3.19) está claramente explicado que a Verdade Absoluta não tem pernas e mãos materiais, mas nessa escritura está indicado que Ele possui mãos espirituais pelas quais Ele aceita tudo oferecido a Ele. Similarmente, Ele não tem olhos materiais, mas Ele tem olhos espirituais pelos quais Ele pode ver tudo e qualquer coisa. Embora Ele não tenha ouvidos materiais, Ele pode ouvir tudo e qualquer coisa. Por possuir sentidos perfeitos, Ele conhece passado, futuro e presente. De fato, Ele sabe tudo, mas ninguém pode compreendê-Lo, porque pelos sentidos materiais Ele não pode ser compreendido. Porque é a origem de todas emanações, Ele é o Supremo, o maior, a Personalidade de Deus.

Existem muitos hinos Védicos similares os quais definitivamente estabelecem que a Verdade Absoluta Suprema é uma pessoa que não é deste mundo material. Por exemplo, no Hayashirsha-pañcharatra está explicado, apesar que em cada e todo Upanishad o Brahman Supremo é primeiro visualizado como impessoal, no fim a forma pessoal do Supremo Senhor é aceita. Um verso similar ocorre no Sri Ishopanishad:

hiranmayena patrena
satyasyapihitam mukham
tat tvam pusann apavrnu
satya-dharmaya drstaye

"Ó meu Senhor, sustentador de tudo que vive, Sua face real está coberta pela Sua refulgência brilhante. Por favor remova essa cobertura e Se exiba para Seu devoto puro" (Isha 15).

Esse verso indica que todos devem se ocupar no serviço devocional do Supremo Senhor, que é o mantenedor de todo este universo. Todos são sustentados por Sua misericórdia; portanto serviço devocional a Ele constitui a verdadeira religião. A Suprema Personalidade de Deus é a forma eterna de sac-cid-ananda, e Sua refulgência é propagada por toda a criação, justamente igual o brilho solar é propagado por todo sistema solar. E justamente igual o disco do Sol está coberto pela refulgência brilhante do brilho solar, a forma transcendental do Senhor está coberta pela refulgência radiante do brahmajyoti. De fato, nesse verso está claramente afirmado que a forma eterna, bem-aventurada, consciente do Supremo Senhor é encontrada dentro da refulgência radiante do brahmajyoti, que emana do corpo do Supremo Senhor. Portanto o corpo pessoal do Senhor é a fonte do brahmajyoti, como confirmado no Bhagavad-gita (Bg. 14.27). Porque o Brahman impessoal é dependente da Suprema Personalidade está afirmado no Hayashirsha-pañcharatra e em cada outro Upanishad ou escritura Védica. De fato, sempre que se fala do Brahman impessoal no começo, a Suprema Personalidade é finalmente estabelecida no fim. Justamente igual o Ishopanishad indica, a Verdade Absoluta Suprema é tanto impessoal quanto pessoal eternamente, mas Seu aspecto pessoal é mais importante do que o impessoal.

De acordo com um mantra no Taittiriya Upanishad (yato va imani bhutani jayante) esta manifestação cósmica é só uma emanação da Verdade Absoluta Suprema, e ela repousa na Verdade Absoluta Suprema. A Verdade Absoluta é o executante ablativo, causativo e locativo. Assim como um executante, Ele é a Suprema Personalidade de Deus, porque esses são sintomas da personalidade. Como o executante ablativo desta manifestação cósmica, todo pensar, sentir e desejar vem Dele. Sem pensar, sentir e desejar, não há possibilidade de arranjo e projeto na manifestação cósmica. Depois novamente, Ele é causativo, porque Ele é o projetista original do cosmos. E Ele é locativo: isto é, tudo repousa em Sua energia. Esses atributos são claramente atributos de personalidade.

No Chandogya Upanishad (5.2.3), está dito que quando a Suprema Personalidade de Deus deseja se tornar muitos, Ele revolve a natureza material. Como também está confirmado no Aitareya Upanishad (1.1), sa aiksata: "O Senhor olhou para a natureza material". A manifestação cósmica não existia antes do olhar Dele; portanto o olhar Dele não é contaminado materialmente. Seu poder de visão existia antes da criação material; portanto Seu corpo não é material. Seu pensar, sentir e agir são todos transcendentais. Em outras palavras, deve-se concluir que a mente pela qual o Senhor pensa, sente e deseja é transcendental, e os olhos com os quais Ele lança Seu olhar sobre a natureza material também são transcendentais. Porque Seu corpo transcendental e todos os Seus sentidos existiam antes da criação material, o Senhor também tem uma mente transcendental e pensar, sentir e desejar transcendentais. Essa é a conclusão de toda literatura Védica.

A palavra Brahman é encontrada em toda parte por todos Upanishads. No Srimad Bhagavatam, Brahman, Paramatma e Bhagavan, a Suprema Personalidade de Deus, são todos aceitos juntos como a Verdade Absoluta. Realização Brahman e Paramatma são consideradas estágios em direção à realização última, que é a realização da Suprema Personalidade de Deus. Essa é a verdadeira conclusão de todas as literaturas Védicas.

Assim de acordo com as evidências proporcionadas por várias escrituras Védicas, o Supremo Senhor Krishna é aceito como o objetivo supremo da realização Brahman. O Bhagavad-gita (Bg. 7.7) também confirma que não há nada superior a Krishna. Madhwacharya, um dos maiores acaryas na sucessão discipular de Brahma, afirmou na sua explicação do Vedanta-sutra que tudo pode ser visto através das autoridades das escrituras. Ele citou um verso do Skanda Purana no qual está afirmado que o Rg Veda, Sama Veda, Atharva Veda, Mahabharata, Pañcharatra e o Ramayana original são evidência Védica de verdade. Os Puranas, que são aceitos pelos Vaishnavas, também são considerados como evidência Védica. De fato, qualquer coisa que está contida nessa literatura deve ser levada sem argumento como a conclusão última, e todas essas literaturas proclamam Krishna como a Suprema Personalidade de Deus.

     

     

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Vinte e Cinco

Realização Pessoal e Impessoal

Os Puranas são chamados literaturas Védicas suplementares. Porque nos Vedas originais o assunto é muito difícil para a pessoa comum entender, os Puranas explicam a matéria simplesmente pelo uso de histórias e incidentes históricos. No Srimad Bhagavatam (10.14.32) está afirmado que Maharaja Nanda e os pastores de vacas e habitantes de Vrindavana são muito afortunados porque o Brahman Supremo, a Personalidade de Deus, cheia de bem-aventurança, Se entretém em Seus passatempos eternos como amigo deles.

De acordo com o Shwetashvatara Upanishad, o mantra apani-pado javano grahita confirma que apesar do Brahman não ter mãos e pernas, Ele entretanto anda de forma muito majestosa e aceita tudo o que é oferecido a Ele. Isso sugere que Ele possui membros transcendentais e portanto não é impessoal. Aquele que não entende os princípios Védicos simplesmente enfatizam as características impessoais materiais da Verdade Absoluta Suprema e assim incorretamente chamam a Verdade Absoluta de impessoal. Os filósofos Mayavadis impersonalistas querem estabelecer a Verdade Absoluta como impessoal, mas isso é contraditório com a literatura Védica. Apesar das literaturas Védicas confirmarem o fato que Verdade Absoluta Suprema possui energias múltiplas, os impersonalistas Mayavadi ainda assim tentam estabelecer que a Verdade Absoluta não tem nenhuma energia. O fato permanece portanto, entretanto, que a Verdade Absoluta é cheia de energia e é uma pessoa também. Não é possível estabelecê-Lo como impessoal.

De acordo com Vishnu Purana (6.7.61-3), os seres vivos são considerados energia ksetrajña. Embora o ser vivo seja parte e parcela do Supremo Senhor e é plenamente consciente, ele entretanto se torna enredado pela contaminação material e sofre todas as misérias da vida material. Tais seres vivos vivem de diferentes modos de acordo com o grau de seu enredamento na natureza material. A energia original do Supremo Senhor é espiritual e não diferente da Suprema Personalidade Absoluta de Deus. O ser vivo é chamado de energia marginal do Supremo Senhor, e a energia material se chama energia inferior. Devido à sua embriaguez material, o ser vivo na posição marginal se torna enredado na energia inferior, matéria. Nesse tempo ele esquece seu significado espiritual, identifica-se com a energia material e por isso se torna sujeito às misérias triplas. Somente quando ele fica livre dessa contaminação material que pode ficar situado na sua posição apropriada.

De acordo com instruções Védicas, deve-se entender a posição constitucional do ser vivo, a posição do Senhor, e a posição da energia material em sua interrelação. Primeiro de tudo, deve-se tentar entender a posição constitucional do Supremo Senhor, a Personalidade de Deus. Esse Supremo Senhor tem um corpo eterno, consciente e bem-aventurado, e Sua energia espiritual é distribuída como eternidade, conhecimento e bem-aventurança. Em Sua identidade bem-aventurada pode-se encontrar Sua potência de prazer, e Sua identidade eterna pode ser vista como a causa de tudo. Em Sua identidade consciente, Ele é o conhecimento supremo. De fato, a palavra krsna indica esse conhecimento supremo. Em outras palavras, a Suprema Personalidade, Krishna, é o reservatório de todo conhecimento, prazer e eternidade. O conhecimento supremo de Krishna é exibido em três energias diferentes - interna, marginal e externa. Em virtude de Sua energia interna, Ele existe em Si mesmo com Sua parafernália espiritual; por meio de Sua energia marginal, Ele Se exibe como os seres vivos, e por meio de Sua energia externa Ele Se exibe como a energia material. Por trás de cada e toda exibição energética existe um fundo de eternidade, prazer, potência e consciência plena.

A alma condicionada é a potência marginal dominada pela potência externa. Todavia, quando a potência marginal vem para a jurisdição da potência espiritual, torna-se elegível para o amor de Deus. O Supremo Senhor desfruta seis tipos de opulências, e ninguém pode estabelecer que Ele é sem forma ou que Ele é sem energia. Se alguém declarar isso, sua controvérsia é completamente oposta às instruções Védicas. Na realidade a Suprema Personalidade de Deus é o senhor de todas energias. Somente o ser vivo, que é uma parte e parcela infinitesimal Dele, que é dominado pela energia material.

No Mundaka Upanishad está afirmado que existem dois pássaros sentados na mesma árvore, e um desses pássaros come os frutos dessa árvore enquanto o outro pássaro simplesmente testemunha suas atividades. Somente quando o pássaro que come os frutos olha para o outro pássaro que ele se torna livre de todas as ansiedades. Essa é a posição do ser vivo infinitesimal. Enquanto ele estiver esquecido da Suprema Personalidade de Deus, que testemunha todas suas atividades, está sujeito às misérias triplas. Mas quando ele olha para o Supremo Senhor e se torna um devoto do Supremo Senhor, ele se torna livre de toda ansiedade e misérias materiais. O ser vivo é eternamente subordinado ao Supremo Senhor; o Supremo Senhor é sempre o senhor de todas energias, enquanto o ser vivo está sempre sob o domínio das energias do Senhor. Apesar de qualitativamente uno com o Supremo Senhor, o ser vivo tem a tendência para dominar a natureza material, entretanto, por ser infinitesimal, ele é na realidade controlado pela natureza material. Por isso o ser vivo é chamado de potência marginal do Senhor.

Porque o ser vivo tende a ser controlado pela natureza material, ele não pode em nenhum estágio se tornar uno com o Supremo Senhor. Se um ser vivo fosse igual ao Supremo Senhor, não haveria possibilidade dele ser controlado pela energia material. No Bhagavad-gita o ser vivo é descrito como uma das energias do Supremo Senhor. Apesar de inseparável do energético, energia ainda é energia, e não pode ser igual ao energético. Em outras palavras, o ser vivo é simultaneamente uno e diferente do Supremo Senhor. Bhagavad-gita (7.4-5) claramente afirma que terra, água, fogo, ar, éter, mente, inteligência e ego falso são as oito energias elementares do Supremo Senhor e são de qualidade inferior, enquanto o ser vivo é de qualidade superior. As literaturas Védicas confirmam o fato que a forma transcendental do Supremo Senhor é eterna, bem-aventurada e plena de conhecimento.

A forma do Supremo Senhor que está além dos modos da natureza material não é como as formas deste mundo material. Sua forma é plenamente espiritual e não pode ser comparada com qualquer forma material. De acordo com as literaturas Védicas, aquele que não aceita a forma espiritual do Supremo Senhor é um ateísta. Porque o Senhor Buddha não aceitou os princípios Védicos, os professores Védicos o consideram um ateísta. Apesar dos filósofos Mayavadi pretenderem aceitar os princípios Védicos, eles indiretamente pregam filosofia Budista, ou filosofia ateísta, e não aceitam a Suprema Personalidade de Deus. Filosofia Mayavadi é inferior à filosofia Budista, que nega diretamente a autoridade Védica. Porque é disfarçada como filosofia Vedanta, filosofia Mayavadi é mais danosa do que Budismo ou ateísmo.

Vedanta-sutra é compilado por Vyasadeva para o benefício de todos os seres vivos. É através do Vedanta-sutra que a filosofia de bhakti-yoga pode ser entendida. Infelizmente, o comentário Mayavadi, Shariraka-bhashya, praticamente derrotou o propósito do Vedanta-sutra. No comentário Mayavadi, a forma espiritual, transcendental da Suprema Personalidade de Deus foi negada, e o Brahman Supremo foi arrastado para baixo até o nível do Brahman individual, o ser vivo. Tanto o Brahman Supremo quanto o Brahman individual foram negados da forma espiritual e individualidade, apesar de estar claramente afirmado que o Supremo Senhor é o ser vivo supremo e os outros seres vivos são os muitos seres vivos subordinados. Por isso que ler comentários Mayavadi sobre Vedanta-sutra é sempre perigoso. O perigo principal é que através desses comentários a pessoa pode considerar o ser vivo como igual ao Supremo Senhor. É fácil para um ser vivo condicionado ser falsamente direcionado dessa forma, e uma vez direcionado assim não pode nunca chegar à sua posição verdadeira ou desfrutar sua atividade eterna em bhakti-yoga. Em outras palavras, a filosofia Mayavadi prestou o maior desserviço para a humanidade por promover a visão impessoal do Supremo Senhor. Assim os filósofos Mayavadi privaram a sociedade humana da mensagem real do Vedanta-sutra.

Desde o início do Vedanta-sutra é aceito que a manifestação cósmica é só uma exibição energética do Supremo Senhor. Logo o primeiro aforismo (janmady asya Bhag 1.1.1) descreve o Brahman Supremo como Aquele de quem tudo emana. Tudo é mantido por Ele, e tudo é dissolvido por Ele. Assim a Verdade Absoluta é a causa da criação, manutenção e dissolução. A causa de um pedaço de fruta é a árvore, quando uma árvore produz um pedaço de fruta, não se pode dizer que a árvore é impessoal. A árvore pode produzir centenas e milhares de frutas, mas permanece como ela é. O fruto é produzido, e ele se desenvolve e permanece por algum tempo; então ele decai e desaparece. Isso não quer dizer que a árvore também desaparece. Assim desde o início o Vedanta-sutra explica a doutrina dos subprodutos. Essas atividades de produção, manutenção e dissolução são realizadas pela energia inconcebível do Supremo Senhor. A manifestação cósmica é uma transformação da energia do Supremo Senhor, apesar da energia do Supremo Senhor e o Supremo Senhor Ele mesmo não serem diferentes e inseparáveis. Uma pedra filosofal pode produzir grandes quantidades de ouro em contato com ferro, ainda assim a pedra filosofal continua como ela é. Apesar Dele produzir imensas manifestações cósmicas materiais, o Supremo Senhor está sempre em Sua forma transcendental.

Filosofia Mayavadi tem a audácia de rejeitar o propósito de Vyasadeva, como explicado no Vedanta-sutra, e tentar estabelecer uma doutrina da transformação que é totalmente imaginária. De acordo com a filosofia Mayavadi, a manifestação cósmica é somente a transformação da Verdade Absoluta, e a Verdade Absoluta não tem existência separada fora da manifestação cósmica. Essa não é a mensagem do Vedanta-sutra. A transformação foi explicada pelos filósofos Mayavadi como falsa, mas não é falsa. É somente temporária. Os filósofos Mayavadi mantêm que a Verdade Absoluta é a única verdade e que esta manifestação material conhecida como o mundo é falsa. Na realidade esse não é o caso. A contaminação material não é exatamente falsa; porque é verdade relativa, é temporária. Existe uma diferença entre algo que é temporário e algo que é falso.

Pranava, ou omkara, é a vibração principal encontrada nos hinos Védicos, e omkara é considerado como a forma de som do Supremo Senhor. Do omkara todos os hinos Védicos emanaram, e o próprio mundo em si também emanou desse som omkara. As palavras tat tvam asi, também encontradas nos hinos Védicos, não são as vibrações principais mas são explicações da posição constitucional do ser vivo. Tat tvam asi significa que o ser vivo é uma partícula espiritual do espírito supremo, mas esse não é o motivo principal do Vedanta ou literaturas Védicas. A representação de som principal do Supremo é omkara.

Todas essas explicações defeituosas do Vedanta-sutra são consideradas ateístas. Porque os filósofos Mayavadi não aceitam a forma transcendental eterna do Supremo Senhor, são incapazes de se dedicarem no serviço devocional real. Assim o filósofo Mayavadi fica desprovido para sempre da Consciência de Krishna e serviço devocional de Krishna. O devoto puro da Personalidade de Deus nunca aceita a filosofia Mayavadi como um caminho verdadeiro para realização transcendental. Os filósofos Mayavadi pairam na atmosfera material moral e imoral do mundo cósmico e conseqüentemente estão sempre engajados em rejeitar e aceitar desfrute material. Eles aceitaram falsamente o não espiritual como espiritual, e em resultado eles se esqueceram da forma eterna da Suprema Personalidade de Deus, e também Seu nome, qualidade e associados. Eles consideram os passatempos, nome, forma e qualidade do Supremo como produtos da natureza material. Por causa de sua aceitação e rejeição do prazer e miséria materiais, os filósofos Mayavadi são eternamente sujeitos à miséria material.

Os devotos verdadeiros do Senhor estão sempre em discordância com os filósofos Mayavadi. Não existe modo que o impersonalismo possa representar possivelmente eternidade, bem-aventurança e conhecimento. Situados no conhecimento imperfeito da liberação, o Mayavadi critica eternidade, bem-aventurança e conhecimento como materialismo. Porque rejeitam serviço devocional, eles são sem inteligência e incapazes de entender os efeitos do serviço devocional. O malabarismo de palavras eles usam numa tentativa de amalgamar conhecimento, o conhecível e o conhecedor simplesmente os revelam como sem inteligência. A doutrina dos subprodutos é o significado real do começo do Vedanta-sutra. O Senhor é poderoso com inumeráveis energias ilimitadas, e conseqüentemente Ele exibe os subprodutos dessas energias em diferentes modos. Tudo está sob o Seu controle. O Supremo Senhor também é o controlador supremo, e Ele é manifestado em inumeráveis energias e expansões.

     

      

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Vinte e Seis

Bhattacharya é Convertido

Para os filósofos impersonalistas e niilistas, o próximo mundo é um mundo de eternidade e bem-aventurança sem sentidos. Os filósofos niilistas querem estabelecer que ultimamente tudo é sem sentidos, e os impersonalistas querem estabelecer que no próximo mundo existe simplesmente conhecimento desprovido de atividade. Assim salvacionistas menos inteligentes tentam levar conhecimento imperfeito dentro da esfera da atividade espiritual perfeita. Porque o impersonalista experimenta a atividade material como miserável, ele quer estabelecer vida espiritual sem atividade. Ele não tem compreensão sobre as atividades do serviço devocional. De fato, atividade espiritual no serviço devocional é ininteligível para os filósofos niilistas e impersonalistas. Os filósofos Vaishnava sabem perfeitamente bem que a Verdade Absoluta, a Suprema Personalidade de Deus, nunca pode ser impessoal ou vazia porque Ele possui inumeráveis potências. Através de Suas inumeráveis energias, Ele pode Se apresentar em formas múltiplas e ainda assim permanecer a Suprema Personalidade de Deus Absoluta. Assim apesar de Se expandir em formas múltiplas e difundir Suas energias inumeráveis, Ele pode manter Sua posição transcendental.

Assim o Senhor Chaitanya expôs muitos defeitos na filosofia Mayavadi, e apesar do Bhattacharya tentar se estabelecer por lógica e malabarismo de palavra, o Senhor Chaitanya foi capaz de Se manter dos ataques dele. O Senhor estabeleceu que literatura Védica é destinada a três coisas: entender nosso relacionamento com a Suprema Personalidade de Deus Absoluta, agir de acordo com esse entendimento, e alcançar a perfeição mais elevada da vida, amor de Deus. Qualquer um que tente provar que as literaturas Védicas se destinam a qualquer outra coisa é por necessidade uma vítima de sua própria imaginação.

O Senhor então citou alguns versos dos Puranas pelos quais Ele estabeleceu que Shankaracharya foi delegado para ensinar por ordem da Suprema Personalidade de Deus. Ele citou um verso do Padma Purana (62.31) no qual está afirmado que o Senhor ordenou Mahadeva, Senhor Shiva, para apresentar algumas interpretações imaginárias das literaturas Védicas a fim de desviar pessoas do propósito verdadeiro dos Vedas. "Por fazer isso você tentará transformá-los em ateístas", o Senhor disse, "Depois disso, eles poderão produzir mais população". Também está afirmado no Padma Purana (25.9) que o Senhor Shiva explicou para sua esposa, Parvati, que na era de Kali ele viria na forma de um brahmana para pregar uma interpretação imperfeita dos Vedas, conhecida como Mayavadismo, a qual é na realidade apenas uma segunda edição da filosofia Budista ateísta.

Bhattacharya ficou abismado com essas explicações do Senhor Chaitanya. Depois de ouvir filosofia Mayavadi explicada pelo Senhor Chaitanya, ele não conseguia falar. Depois de ficar em silêncio por algum tempo, o Senhor Chaitanya pediu a ele, "Meu querido Bhattacharya, não fique confuso com essa explicação. Faça o favor de aceitar de Mim que o serviço devocional do Supremo Senhor é o estágio de perfeição do entendimento humano mais elevado. De fato, é tão atraente que mesmo aqueles que já são liberados se tornam devotos pela potência inconcebível da Suprema Personalidade de Deus". Existem tantas conversões na literatura Védica. Por exemplo, no Srimad Bhagavatam (1.7.10) o famoso verso Atmarama é especialmente destinado para aqueles que estão atraídos à auto-realização e liberados de todos apegos materiais. Tais impersonalistas liberados se tornam atraídos ao serviço devocional pelas várias atividades do Senhor Krishna. Assim são as qualidades da Suprema Personalidade de Deus.

Na realidade, na consciência pura o ser vivo entende ele mesmo como o servo eterno do Supremo Senhor. Sob o encanto da ilusão, a pessoa aceita os corpos grosseiro e sutil como seu eu; tal conceito é a base da doutrina da transferência. Na realidade a parte e parcela do Supremo não é eternamente sujeita à vida corpórea grosseira e sutil. As coberturas grosseira e sutil não compreendem a forma eterna do ser vivo; elas podem ser mudadas. Em outras palavras, o ser vivo, que é espiritual puro originalmente, pode ser condicionado pelos corpos grosseiro e sutil, por se libertar desses condicionamentos grosseiro e sutil, novamente atinge sua situação como espírito puro. Filósofos Mayavadis aproveitam essa doutrina da transferência por dizer que o ser vivo está sob a impressão errada quando pensa em si mesmo como parte e parcela do Supremo. Eles mantêm que o ser vivo é o Supremo Ele mesmo. Essa doutrina não pode ser sustentável.

Bhattacharya então pediu ao Senhor Chaitanya para explicar o famoso verso Atmarama, porque ele queria ouvir do Senhor em Pessoa. O Senhor Chaitanya respondeu que o Bhattacharya devia explicar o verso de acordo com seu próprio entendimento, e então o Senhor Chaitanya o explicaria. Bhattacharya então começou a explicar o sloka Atmarama, usando seus métodos de lógica e gramática. Assim ele explicou o sloka Atmarama em nove modos diferentes. O Senhor apreciou a erudição acadêmica dele na explicação do verso e disse: "Meu querido Bhattacharya, Eu sei que você é um representante do intelectual erudito Brihaspati e pode explicar qualquer porção dos sastras muito bem. Ainda assim sua explicação é mais ou menos baseada em educação acadêmica apenas. À parte dessa abordagem acadêmica erudita, existe outra explicação".

Então, a pedido do Bhattacharya, o Senhor Chaitanya explicou o sloka Atmarama. As palavras do verso foram analisadas assim: (1) atmaramah, (2) ca, (3) munayah, (4) nirgranthah, (5) api, (6) urukrame, (7) kurvanti, (8) ahaitukim, (9) bhaktim, (10) itthambhuta-gunah, (11) harih. Esse verso já foi explicado nos ensinamentos do Senhor para Sanatana Goswami. O Senhor Chaitanya não mencionou as nove explicações diferentes do Bhattacharya, mas Ele explicou o verso com a análise dessas onze palavras. Desse modo, Ele expôs sessenta e uma explicações diferentes do verso. Em resumo Ele disse que a Suprema Personalidade de Deus é plena de inumeráveis potências; ninguém pode estimar quantas qualidades transcendentais Ele possui. Suas qualidades são sempre inconcebíveis, e todos processos de auto-realização inquirem dentro das potências, energias e qualidades da Suprema Personalidade de Deus. Todavia, os devotos do Senhor imediatamente aceitam a posição inconcebível do Senhor. O Senhor Chaitanya explicou que mesmo grandes almas liberadas tais quais os Kumaras e Shukadeva Goswami também ficaram atraídos pelas qualidades transcendentais do Supremo Senhor. Bhattacharya apreciou a explicação do Senhor Chaitanya, e ele concluiu que o Senhor Chaitanya era ninguém mais além do próprio Krishna em Pessoa. Bhattacharya então começou a depreciar sua própria posição, em relação que primeiramente ele considerou o Senhor Chaitanya como um ser humano ordinário e assim cometeu uma ofensa. Ele então caiu aos pés de lótus do Senhor Chaitanya, e censurava si mesmo, e pediu para o Senhor mostrar Sua misericórdia sem causa para ele. O Senhor Chaitanya apreciou a humildade desse grande intelectual e assim exibiu Sua própria forma, primeiro com quatro mãos, e depois com seis mãos (sadbhuja). Sarvabhauma Bhattacharya então repetidamente caía aos pés de lótus do Senhor. e compôs várias preces para Ele. Ele era indubitavelmente um grande intelectual, e depois de receber a misericórdia sem causa do Senhor, ele foi dotado de poder para explicar as atividades do Senhor em diferentes modos. De fato, ele ficou apto para expressar o método de cantar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare.

É dito que Sarvabhauma Bhattacharya compôs cem versos em apreciação das atividades do Senhor, e esses versos eram tão grandiosos que não podem ser superados mesmo por Brihaspati, o maior intelectual erudito nos planetas celestiais. O Senhor ficou muito feliz de ouvir esses cem versos, e Ele abraçou Bhattacharya. Bhattacharya ficou dominado pelo êxtase pelo toque do Senhor, e ele praticamente caiu inconsciente. Ele chorava, tremia, estremecia e transpirava, e às vezes ele dançava e cantava e caía aos pés de lótus do Senhor Chaitanya. O cunhado do Bhattacharya, Gopinatha Acharya, e os devotos do Senhor ficaram surpresos ao ver Bhattacharya transformado num grande devoto.

Gopinatha Acharya então começou a agradecer o Senhor: "É somente por Sua graça que Bhattacharya foi transformado da sua posição igual pedra num devoto como esse". O Senhor Chaitanya então respondeu para Gopinatha Acharya que foi devido a um favor de um devoto que um homem coração de pedra pôde ser transformado num devoto compassivo, coração de flor. Na realidade Gopinatha Acharya desejou sinceramente que seu cunhado, Bhattacharya, se tornasse um devoto do Senhor. Ele desejou sinceramente que o Senhor favorecesse Bhattacharya, e ele ficou feliz de ver que seu desejo foi satisfeito pelo Senhor Chaitanya. Em outras palavras, um devoto do Senhor é mais misericordioso do que o Senhor Ele mesmo. Quando um devoto deseja mostrar sua misericórdia para uma pessoa, o Senhor age, e por Sua graça a pessoa se torna um devoto.

O Senhor Chaitanya acalmou Bhattacharya e lhe disse para ir para casa. Bhattacharya novamente começou a louvar o Senhor e disse, "Você descendeu em Pessoa para liberar todas almas caídas deste mundo material. Tal empreendimento não é muito difícil para Você, mas Você transformou um homem coração de pedra como eu em um devoto, e isso é muito maravilhoso de fato. Apesar de eu ser muito perito em argumentos lógicos e explanações gramaticais dos Vedas, eu era tão duro quanto como uma barra de ferro. Mas Sua influência e temperatura foram tão grandiosos que Você pôde derreter um monte de ferro igual a mim".

O Senhor Chaitanya então retornou para Sua casa, e Bhattacharya mandou Gopinatha Acharya até Ele com vários tipos de prasada do templo Jagannatha. No dia seguinte o Senhor foi ao templo de Jagannatha de manhã cedo para assistir ao mangala arati. Os sacerdotes do templo trouxeram para Ele um colar de flores da Deidade e também Lhe ofereceram vários tipos de prasada. O Senhor ficou muito feliz em recebê-los, e Ele imediatamente foi para a casa do Bhattacharya, e levou o prasada e as flores para presenteá-lo. Apesar de estar cedo na manhã, Bhattacharya entendeu que o Senhor veio e batia na sua porta. Ele imediatamente levantou de sua cama e começou a dizer, "Krishna! Krishna"! Isso foi ouvido pelo Senhor Chaitanya. Quando Bhattacharya abriu a porta, ele viu o Senhor em pé ali, e ficou tão feliz de vê-Lo na manhã cedo que tentou recebê-Lo com todo cuidado. Ofereceu a Ele um bom assento, e os dois sentaram ali. O Senhor Chaitanya então lhe ofereceu prasada que Ele recebeu no templo de Jagannatha, e Bhattacharya ficou muito feliz de receber esse prasada das mãos do Senhor Chaitanya em Pessoa. De fato, sem tomar seu banho e sem realizar seus deveres diários ou mesmo escovar os dentes, ele imediatamente começou a comer o prasada. Desse modo, ele ficou livre de toda contaminação material e apego, e quando ele começou a comer o prasada, citou um verso do Padma Purana. No Padma Purana está afirmado que quando prasada é trazido ou recebido, deve ser comido imediatamente, mesmo se ficou muito seco ou velho, ou mesmo se foi trazido de um lugar distante, ou mesmo se não completou a execução de seus deveres diários. Porque está determinado nos sastras que prasada deve ser tomado imediatamente, não há restrição de tempo e espaço; a ordem da Suprema Personalidade de Deus deve ser cumprida. Existem restrições que se deve seguir antes de aceitar comestíveis de várias pessoas, mas não há restrições em aceitar prasada de todos os tipos de pessoas. prasada é sempre transcendental e pode ser tomado sob qualquer condição. O Senhor Chaitanya ficou feliz de ver que Bhattacharya, que sempre obedeceu às regras e regulamentos estritamente, aceitou prasada sem seguir quaisquer regras e regulamentos. Assim tão satisfeito, o Senhor Chaitanya abraçou Bhattacharya, e os dois começaram a dançar no êxtase transcendental. Nesse êxtase, o Senhor Chaitanya exclamou: "Minha missão em Jagannatha Puri agora está cumprida! Eu converti uma pessoa como Sarvabhauma Bhattacharya. Eu agora estou apto para atingir Vaikuntha sem falha".

O objetivo missionário de um devoto é converter uma pessoa simplesmente em um devoto puro. Desse modo sua admissão no reino espiritual está garantida. O Senhor estava tão satisfeito com Bhattacharya que Ele começou a abençoá-lo repetidamente: "Querido Bhattacharya, agora você é completamente um devoto puro do Senhor Krishna, e Krishna agora está muito satisfeito com você. A partir de hoje você está livre da contaminação deste corpo material e do enredamento na energia material. Agora você está apto para ir de volta ao Supremo, de volta ao lar". O Senhor então citou um verso do Srimad Bhagavatam (2.7.42):

yesam sa eva bhagavan dayayed anantah
sarvatmanasrita-pado yadi nirvyalikam
te dustaram atitaranti ca deva-mayam
naisam mamaham-iti dhih sva-srgala-bhaksye

"Quem quer que se abrigue nos pés de lótus do Supremo Senhor é favorecido pelo Supremo Senhor, que é conhecido como ilimitado. Tal pessoa também recebe a permissão para atravessar o oceano de ignorância. Entretanto, aquele que pensa neste corpo material como seu próprio eu não pode receber a misericórdia sem causa da Suprema Personalidade de Deus".

Depois desse incidente, o Senhor Chaitanya retornou à Sua casa, e Bhattacharya se tornou um devoto puro e impecável. Porque ele foi anteriormente um grande acadêmico erudito, Bhattacharya só pôde ser convertido pela misericórdia sem causa de Chaitanya Mahaprabhu. Daquele dia em diante Bhattacharya nunca explicou qualquer literatura Védica sem explicar serviço devocional. Gopinatha Acharya, seu cunhado, ficou tão feliz de ver a condição do Bhattacharya que ele começou a dançar em êxtase e vibrar o som transcendental Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare.

No dia seguinte, depois de visitar o templo Jagannatha de manhã cedo, Bhattacharya foi visitar o Senhor Chaitanya, e ofereceu seus respeitos por cair no chão perante o Senhor. Então ele começou a explicar seu comportamento passado indesejado. Foi quando ele pediu para o Senhor falar algo sobre serviço devocional, o Senhor começou a explicar explicitamente os versos do Brihan-naradiya Purana, nos quais está afirmado: harer nama harer nama (Cc. Adi 17.21). Depois de ouvir essa explicação, Bhattacharya ficou cada vez mais extático. Ao ver a condição de seu cunhado, Gopinatha Acharya disse, "Meu querido Bhattacharya, previamente eu disse que quando alguém é favorecido pelo Supremo Senhor, ele entenderá as técnicas do serviço devocional. Hoje eu vejo isso realizado".

Bhattacharya ofereceu-lhe seus devidos respeitos e respondeu, "Meu querido Gopinatha Acharya, foi através da sua misericórdia que eu recebi a misericórdia do Supremo Senhor". A misericórdia da Suprema Personalidade de Deus pode ser obtida pela misericórdia de um devoto puro. A misericórdia do Senhor Chaitanya foi concedida a Bhattacharya por causa do empenho de Gopinatha Acharya. "Você é um grande devoto do Senhor", Bhattacharya continuou, "eu estava simplesmente cego pela minha educação acadêmica. Sim, eu obtive a misericórdia do Senhor através da sua agência somente". O Senhor Chaitanya em Pessoa ficou imensamente feliz ao ouvir Bhattacharya dizer que uma pessoa pode obter a misericórdia do Senhor através da agência de um devoto. Ele apreciou suas palavras e abraçou Bhattacharya, e confirmou sua declaração.

O Senhor então pediu a Bhattacharya para ir ao templo Jagannatha novamente, e Bhattacharya saiu para o templo acompanhado por Jagadananda e Damodara, dois associados principais do Senhor Chaitanya. Depois de ver o templo Jagannatha, Bhattacharya voltou para casa e trouxe com ele muito prasada comprado no templo. Ele mandou todo esse prasada para o Senhor Chaitanya por meio de seu servo brahmana.

Ele também despachou dois versos escritos em folhas de palmeira e pediu para Jagadananda prestar-lhe um favor de entregá-los. Assim ao Senhor Chaitanya foi oferecido o prasada e os versos nas folhas de palmeira. Todavia, antes de chegar ao Senhor, Mukunda Datta, que também participou da entrega dos versos, copiou os versos em seu livro. Quando o Senhor Chaitanya leu os versos na folha de palmeira, Ele os rasgou em pedaços, porque Ele nunca gostava de ser elogiado por ninguém. Os versos só sobreviveram porque foram copiados por Mukunda Datta. Esses versos louvam o Senhor, a Suprema Personalidade de Deus Original que descendeu como o Senhor Chaitanya para pregar desapego, conhecimento transcendental e serviço devocional para as pessoas em geral. O Senhor Chaitanya foi louvado como a Personalidade de Deus original e foi comparado a um oceano de misericórdia. "Que eu me renda a esse Senhor Chaitanya Mahaprabhu", os versos afirmavam. "O Senhor, ao ver que o serviço devocional estava ausente, descendeu Ele mesmo em Pessoa na forma de Chaitanya Mahaprabhu para pregar serviço devocional. Que nós todos nos rendamos a Seus pés de lótus e aprendamos Dele o que serviço devocional é realmente". Esses versos são considerados como as jóias mais importantes pelos devotos do Senhor na sucessão discipular, e em virtude desses versos famosos Sarvabhauma Bhattacharya ficou conhecido como o mais elevado dos devotos.

Assim Sarvabhauma Bhattacharya foi convertido em um dos mais importantes devotos do Senhor, e ele não teve outro interesse além de servir o Senhor. Ele pensava no Senhor Chaitanya constantemente, e meditação e canto se tornaram o propósito principal de sua vida.

Um dia Sarvabhauma Bhattacharya veio perante o Senhor, ofereceu seus respeitos e começou a ler um verso do Srimad Bhagavatam (10.14.8). Esse verso trata da prece do Senhor Brahma para o Senhor. O verso lido:

tat te 'nukampam susamiksamano
bhuñjana evatma-krtam vipakam
hrd-vag-vapurbhir vidadhan namas te
jiveta yo mukti-pade sa daya-bhak

"Uma pessoa que devota sua mente, corpo e fala para o serviço do Senhor, mesmo embora esteja no meio de uma vida miserável carregada más ações passadas, tem assegurada a liberação". Bhattacharya mudou a palavra mukti (liberação) para bhakti (serviço devocional).

"Por que você mudou o verso original"? o Senhor perguntou a Bhattacharya. "A palavra é mukti e você a mudou para bhakti". Bhattacharya então respondeu que mukti não é tão valioso quanto bhakti e que mukti na realidade é um tipo de punição para o devoto puro. Por essa razão ele mudou a palavra mukti para bhakti. Bhattacharya então começou a explicar sua realização de bhakti. "Qualquer um que não aceita a Personalidade de Deus transcendental e Sua forma transcendental não pode conhecer a Verdade Absoluta", disse ele.

Aquele que não entende a natureza transcendental do corpo de Krishna se torna um inimigo de Krishna e desafia ou luta com Ele. Os inimigos eventualmente imergem dentro da refulgência Brahman do Senhor. Tal mukti ou liberação dentro da refulgência Brahman nunca é desejada pelos devotos do Senhor. Existem cinco tipos de liberação: (1) alcançar o planeta onde o Senhor reside, (2) associar-se com o Senhor, (3) atingir um corpo transcendental igual do Senhor, (4) alcançar opulência igual do Senhor, e (5) imergir na existência do Senhor. Um devoto não tem interesse particular em nenhum desses tipos de liberação. Ele fica satisfeito simplesmente por estar dedicado no serviço amoroso transcendental do Senhor. Um devoto é especialmente adverso em imergir na existência do Senhor e perder sua identidade individual. De fato, um devoto considera unidade com o Senhor como infernal. Ele, todavia, aceitará um dos outros quatro tipos de liberação em consideração a estar dedicado no serviço do Senhor. Das duas possibilidades de imergir na transcendência - chamadas tornar-se um com a refulgência do Brahman impessoal e se tornar uno com a Personalidade de Deus - a última é mais abominável para o devoto. O devoto não tem outra aspiração além de se dedicar no serviço amoroso transcendental do Senhor.

Ao ouvir isso, o Senhor Chaitanya informou Bhattacharya que existe outro significado para a palavra mukti. A palavra mukti-pade diretamente indica a Personalidade de Deus. A Personalidade de Deus tem inumeráveis almas liberadas dedicadas no Seu serviço amoroso transcendental, e Ele é o refúgio último da liberação. Em qualquer caso, Krishna é o abrigo último.

"Apesar dessa leitura", Sarvabhauma Bhattacharya respondeu, "eu prefiro bhakti do que mukti. Embora de acordo com Você existem dois significados para a palavra mukti, ainda assim, porque essa palavra é ambígua, eu prefiro bhakti do que mukti porque quando alguém ouve a palavra mukti, imediatamente pensa em se tornar uno com o Supremo. Eu mesmo até detesto pronunciar a palavra mukti. Todavia sou muito entusiasmado para falar de bhakti".

O Senhor Chaitanya riu muito alto com isso e abraçou Bhattacharya com grande amor.

Assim Bhattacharya, que sentia prazer em explicar filosofia Mayavadi, se tornou um devoto convicto e ele até mesmo detestava pronunciar a palavra mukti. Isso só é possível pela misericórdia sem causa do Senhor Sri Chaitanya. O Senhor é igual uma pedra filosofal, pois por Sua graça Ele pode transformar ferro em ouro. Depois dessa conversação, todos evidenciaram uma grande mudança em Bhattacharya, e concluíram que essa mudança foi possível somente pelo poder inconcebível do Senhor Chaitanya. Assim eles tomaram isso como certo que o Senhor Chaitanya não era outro além do Senhor Krishna em Pessoa.

     

         

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Vinte e Sete

O Senhor Chaitanya e Ramananda Raya

O autor do Chaitanya Charitamrita descreveu o Senhor Chaitanya Mahaprabhu como o oceano de conhecimento transcendental e Sri Ramananda Raya como a nuvem que é produzida desse oceano. Ramananda Raya era um grandioso intelectual avançado em serviço devocional, e pela graça do Senhor Chaitanya ele reuniu todas conclusões justamente igual uma nuvem reúne água do oceano. Igual as nuvens aparecem do oceano, distribuem água por todo o mundo, e retornam para o oceano, assim pela graça do Senhor Chaitanya, Ramananda Raya atingiu seu conhecimento mais elevado do serviço devocional e novamente, depois de se aposentar do serviço, resolveu ir ver o Senhor Chaitanya em Puri.

Quando o Senhor Chaitanya visitou a parte sul da Índia, Ele primeiro foi ao grande templo conhecido como Jiyara-nrsimha-ksetra. Esse templo está situado num lugar conhecido como Simhachalam, oito quilômetros da estação de trem Vishakhapattana. O templo fica situado no topo de uma montanha. Há muitos templos naquela área, mas o templo Jiyara-nrsimha-ksetra é o maior de todos. Esse templo está repleto de belas esculturas, de interesse para muitos estudantes, por causa de sua popularidade é um templo muito rico. Uma inscrição no templo afirma que o Rei de Vijayanagara antigamente decorou esse templo com ouro e até passou ouro no corpo da Deidade. Para facilitar o comparecimento, há apartamentos gratuitos para visitantes no templo. O templo é administrado por sacerdotes da seita Ramanujacharya.

Quando o Senhor Chaitanya visitou esse templo, Ele louvou a Deidade e citou um verso do comentário de Shridhara Swami sobre o Srimad Bhagavatam (7.9.1):

ugro 'py anugra evayam
sva-bhaktanam nrkesari
kesariva svapotanam
anyesam ugra-vikramah

"Embora o Senhor Nrisimha seja muito severo para demônios e não devotos, Ele é muito bondoso para Seus devotos submissos tais quais Prahlada". O Senhor Nrisimha apareceu como uma encarnação metade homem, metade leão quando Prahlada, um menino devoto do Senhor, foi assediado pelo seu pai demoníaco Hiranyakashipu. Justamente igual um leão é muito feroz para outros animais mas muito carinhoso e submisso com seus filhotes, assim o Senhor Nrisimha apareceu feroz para Hiranyakashipu e muito carinhoso com Seu devoto Prahlada.

Depois de visitar o templo de Jiyara-nrsimha, o Senhor procedeu mais para o sul dentro da Índia e ultimamente alcançou a margem do Godavari. Quando estava na margem desse rio, o Senhor lembrou o rio Yamuna em Vrindavana, e Ele considerou as árvores na margem como a floresta de Vrindavana. Assim Ele estava em êxtase ali. Depois de tomar Seu banho nas margens do Godavari, o Senhor sentou perto da margem e começou a cantar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Enquanto estava sentado e cantava, o Senhor viu o governador da província, Sri Ramananda Raya, que chegou até as margens do rio acompanhado pelos seus associados, que incluía muitos brahmanas. Previamente o Senhor foi solicitado por Sarvabhauma Bhattacharya para visitar o grande devoto Ramananda Raya em Kabur. O Senhor pôde entender que o homem que se aproximava da margem do rio era Ramananda Raya, e Ele desejou vê-lo imediatamente. Todavia, porque Ele estava na ordem de vida renunciada, Ele Se restringiu de ir ver um personagem político. Porque era um grande devoto, Ramananda Raya estava atraído pelas características do Senhor Chaitanya, que apareceu como um sannyasi, e ele mesmo em pessoa veio ver o Senhor. Depois de se aproximar de Chaitanya Mahaprabhu, Ramananda Raya se prostrou no chão e ofereceu suas reverências e respeitos. O Senhor Chaitanya o recebeu por vibrar Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare.

Quando Ramananda Raya apresentou suas credenciais, o Senhor Chaitanya o abraçou, e os dois ficaram dominados pelo êxtase. Os brahmanas que acompanhavam Ramananda Raya ficaram surpresos de vê-los se abraçar em êxtase transcendental. Os brahmanas eram todos seguidores rígidos dos rituais, e não puderam entender o significado desses sintomas devocionais. De fato, eles ficaram bastante surpresos de ver tal grandioso sannyasi tocar num sudra, e eles também ficaram surpresos de ver Ramananda Raya, que era um grande governador e praticamente o rei da província, chorar simplesmente por tocar um sannyasi. O Senhor Chaitanya entendeu os pensamentos dos brahmanas, e, por considerar a situação desfavorável, Ele Se acalmou.

Depois disso, o Senhor Chaitanya e Ramananda Raya sentaram juntos. "Sarvabhauma Bhattacharya falou altissimamente de você", o Senhor Chaitanya o informou. "Por isso Eu vim para ver você".

"Sarvabhauma Bhattacharya me considera como um de seus devotos", Ramananda Raya respondeu. "Por isso ele recomendou gentilmente que Você viesse me ver".

Ramananda Raya apreciou muitíssimo o Senhor tocar num homem de riqueza. Um rei, governador ou qualquer político está sempre absorto em pensamentos de assuntos políticos e dinheiro-moeda-centavos; por isso que essas pessoas são evitadas por sannyasis. O Senhor Chaitanya, todavia, sabia que Ramananda Raya era um grande devoto, e por isso Ele não hesitou em tocá-lo e abraçá-lo. Ramananda Raya ficou surpreso com o comportamento do Senhor Chaitanya, e ele citou um verso do Srimad Bhagavatam (10.8.4): "As grandes personalidades e sábios aparecem nos lares de pessoas mundanas justamente para mostrar a elas misericórdia".

O tratamento especial do Senhor Chaitanya para Ramananda Raya indicou que apesar de Ramananda Raya ter nascido numa família não brahmana, ele era muito mais, muito mais avançado em conhecimento e atividade espirituais. Por isso ele era mais respeitável do que aquele que simplesmente aconteceu de nascer numa família brahmana. Apesar de Ramananda, por seu comportamento pacífico e gentil, considerar-se nascido numa família sudra de classe baixa, o Senhor Chaitanya todavia o considerou como situado no estágio transcendental da devoção mais elevado. Devotos nunca se anunciam como grande, mas o Senhor é muito ansioso em anunciar a glória de Seus devotos. Depois de se encontrarem pela primeira vez naquela manhã nas margens do Godavari, Ramananda Raya e Senhor Chaitanya se separaram com o entendimento que Ramananda Raya iria à noite para ver o Senhor.

Naquela noite, depois que o Senhor tomou Seu banho e Se sentou, Ramananda Raya veio para vê-Lo com um servo. Ele ofereceu seus respeitos e sentou perante o Senhor. Antes que Ramananda Raya pudesse mesmo perguntar ao Senhor uma pergunta sobre o avanço no conhecimento espiritual, o Próprio Senhor em Pessoa disse, "Por favor cite alguns versos de escritura sobre o objetivo último da vida humana".

Sri Ramananda Raya imediatamente respondeu: "Uma pessoa que é sincera no seu dever ocupacional gradualmente desenvolverá um senso de consciência de Deus". Ele também citou um verso do Vishnu Purana (3.8.9) o qual afirma que o Supremo Senhor é adorado pelo dever ocupacional da pessoa e que não existe alternativa para satisfazê-Lo. O significado é que a vida humana é destinada a entender o relacionamento pessoal com o Supremo Senhor, e por agir desse modo qualquer ser humano pode se encaixar no serviço do Senhor por executar seus deveres prescritos. Para esse propósito a sociedade humana é dividida em quatro classes: os intelectuais (brahmanas), os administradores (ksatriyas), os comerciantes (vaisyas), e os trabalhadores (sudras). Para cada classe há regras e regulamentos prescritos e também funções ocupacionais. Os deveres prescritos e qualidades das quatro classes são descritas no Bhagavad-gita (18.41-44). Uma sociedade que é civilizada e organizada deve seguir as regras e regulamentos prescritos para as classes particulares. Ao mesmo tempo, para avanço espiritual, os quatro estágios de asrama também devem ser seguidos: chamados, vida de estudante (brahmacarya), casado (grhastha), aposentado (vanaprastha) e vida renunciada (sannyasa).

Ramananda Raya afirmou aqueles que seguem estritamente as regras e regulamentos dessas oito divisões sociais podem realmente satisfazer o Supremo Senhor, e aquele que não as segue certamente arruína sua forma humana de vida e escorrega abaixo para o inferno. Pode-se pacificamente executar o objetivo da vida humana simplesmente por seguir as regras e regulamentos que se aplicam a si mesmo. O caráter de uma pessoa particular desenvolve por seguir os princípios reguladores de acordo com seu próprio nascimento, associação e educação. As divisões da sociedade são projetadas para que muitas pessoas de caráter diferente possam ser reguladas sob elas para a administração pacífica da sociedade e para o avanço espiritual também. As classes sociais podem ser mais caracterizadas como se segue: (1) Aquele cujo objetivo é entender o Supremo Senhor, a Personalidade de Deus, e devotar-se ao aprendizado dos Vedas e literaturas similares é chamado brahmana. (2) Aquele que adotou mostrar força e entrar na administração do governo é chamado um ksatriya. (3) Aquele que está engajado em agricultura, pastoreio de vacas e executar um comércio ou negócio é chamado um vaisya. (4) Aquele que não tem nenhum conhecimento específico mas fica satisfeito por servir as outras três classes é chamado um sudra. Se alguém executa seus deveres prescritos com fé, é seguro que avança em direção à perfeição. De outra forma, esses regulamentos são simplesmente uma perda de tempo inútil.

Depois de ouvir Ramananda Raya expor sobre a execução própria de uma vida regulada, o Senhor Chaitanya disse que esses regulamentos são simplesmente externos. Indiretamente Ele pediu para Ramananda Raya expor sobre algo superior a essa exibição externa. Execução formal de rituais e religião é inútil a menos que culmine na perfeição do serviço devocional. O Senhor Vishnu não fica satisfeito simplesmente por uma aderência ritualística para instruções Védicas; Ele fica satisfeito realmente quando alguém atinge o estágio do serviço devocional.

De acordo o verso citado por Ramananda Raya, pode-se elevar ao ponto do serviço devocional por execução ritualística. No Bhagavad-gita, Sri Krishna, que apareceu para libertar todas classes de pessoas, afirma que um ser humano pode atingir o estágio de perfeição da vida mais elevado por adorar o Supremo Senhor, de quem tudo emanou, através do seu dever ocupacional.

sve sve karmany abhiratah
samsiddhim labhate narah
svakarma-niratah siddhim
yatha vindati tac chrnu
yatah pravrttir bhutanam
yena sarvam idam tatam
svakarmana tam abhyarcya
siddhim vindati manavah

"Por seguir suas qualidades de trabalho, toda pessoa pode se tornar perfeita. Agora faça o favor de ouvir de Mim como isso pode ser feito. Por adorar o Senhor, que é a fonte de todas as coisas e que é todo-penetrante, pessoa pode, na execução do seu próprio dever, atingir perfeição" (Bg. 18.45-46). Esse processo de perfeição é seguido por grandes devotos como Bodhayana, Tanka, Dramida, Guhadeva, Kapardi e Bharuchi. Todas essas grandes personalidades seguiram esse caminho particular de perfeição. As leis Védicas também visam essa direção. Ramananda Raya queria apresentar esses fatos perante o Senhor, mas aparentemente execução de deveres ritualísticos não era suficiente, porque o Senhor Chaitanya disse que isso era externo. O Senhor Chaitanya indicou que se uma pessoa tem uma concepção de vida material, não pode atingir a perfeição mais elevada da vida mesmo se seguir todos os regulamentos ritualísticos.

     

      

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Vinte e Oito

Relacionamento com o Supremo

O Senhor Chaitanya rejeitou a declaração citada por Ramananda Raya do Vishnu Purana porque o Senhor desejou rejeitar uma classe de filósofos conhecidos como karma-mimamsa. Seguidores de karma-mimamsa aceitam Deus como sujeito a seu próprio trabalho. A conclusão deles é que se alguém trabalha bem, Deus é inclinado a dar bons resultados. Assim pode-se entender da declaração do Vishnu Purana que Vishnu, o Supremo Senhor, não tem independência mas é inclinado a conceder um tipo de resultado para o trabalhador. Tal objetivo dependente se torna sujeito ao adorador, o qual aceita o Supremo Senhor tanto como impessoal quanto pessoal, como ele deseja. Na realidade essa filosofia enfatiza o aspecto impessoal da Verdade Absoluta Suprema. Porque o Senhor Chaitanya não gostava desses impersonalistas, Ele os rejeitou.

"Diga-Me se você sabe algo além desse conceito da Verdade Absoluta Suprema", o Senhor Chaitanya disse finalmente.

Ramananda Raya entendeu a intenção do Senhor Chaitanya, e, por citar que é melhor abandonar os resultados das atividades lucrativas, ele citou um verso do Bhagavad-gita:

yat karosi yad asnasi
yaj juhosi dadasi yat
yat tapasyasi kaunteya
tat kurusva mad-arpanam

"Ó filho de Kunti, tudo que você faz, tudo que você come, tudo que você oferece e dá em caridade, bem como todas austeridades que possa executar, tudo deve ser feito como uma oferenda a Mim" (Bg. 9.27). Também existe uma passagem similar no Srimad Bhagavatam (11.2.36) a qual afirma que se deve submeter tudo - suas atividades lucrativas, corpo, fala, mente, sentidos, inteligência, alma e modos da natureza - para a Suprema Personalidade de Deus, Narayana.

O Senhor Chaitanya, todavia, também rejeitou essa segunda declaração, e disse, "Se você sabe de algo mais elevado, diga isso".

Oferecer tudo à Suprema Personalidade de Deus, como recomendado pelo Bhagavad-gita e Srimad Bhagavatam, é melhor do que impessoalmente fazer o Supremo Senhor sujeito ao nosso trabalho, mas ainda falta render atividades para o Supremo Senhor. A identificação de um trabalhador com a existência material não pode ser mudada sem a guia própria. Tal atividade lucrativa continuará a existência material da pessoa. Um trabalhador é simplesmente instruído aqui para oferecer os resultados de seu trabalho para o Supremo Senhor, mas não há informação dada para capacitar alguém para sair do enredamento material. Por isso o Senhor Chaitanya rejeitou a proposta dele.

Depois de ter suas sugestões rejeitadas duas vezes, Ramananda propôs que se deve abandonar suas atividades ocupacionais todas juntas e por desapego se elevar para o plano transcendental. Em outras palavras, ele recomendou a renúncia completa da vida mundana, e para suportar esse ponto de vista ele citou evidência do Srimad Bhagavatam (11.11.32) onde o Senhor diz: "Nas escrituras Eu descrevi os princípios ritualísticos e o caminho pelo qual se pode ficar situado no serviço devocional. Essa é a perfeição máxima da religião". Ramananda Raya também citou a recomendação do Senhor Krishna no Bhagavad-gita:

sarva-dharman parityajya
mam ekam saranam vraja
aham tvam sarva-papebhyo
moksayisyami ma sucah

"Abandone todas variedades de religião e simplesmente se renda a Mim. Eu vou libertá-lo de toda reação pecaminosa. Não tema" (Bg. 18.66).

O Senhor Chaitanya também rejeitou essa terceira proposta, porque Ele queria demonstrar que renúncia por si só não é suficiente. Tem que haver dedicação positiva. Sem dedicação positiva, o estágio de perfeição mais elevado não pode ser atingido. Geralmente existem dois tipos de filósofos na ordem de vida renunciada. O objetivo de um é nirvana, e o objetivo do outro é a refulgência Brahman impessoal. Esses filósofos não podem imaginar que eles podem alcançar além do nirvana e da refulgência Brahman os planetas Vaikuntha do céu espiritual. Porque na renúncia simples não existe nenhum conceito dos planetas espirituais e atividades espirituais, o Senhor Chaitanya rejeitou essa terceira proposta.

Ramananda Raya então citou mais evidência do Bhagavad-gita:

brahma-bhutah prasannatma
na socati na kanksati
samah sarvesu bhutesu
mad-bhaktim labhate param

"A pessoa que está situada na transcendência dessa forma, imediatamente realiza o Brahman Supremo. Nunca lamenta, nem deseja ter nada; é igualmente disposta com todo ser vivo. Nesse estado, ela alcança serviço devocional puro a Mim" (Bg. 18.54). Ramananda Raya primeiro sugeriu serviço devocional prestado com renúncia das atividades lucrativas, mas aqui ele sugere que serviço devocional com conhecimento pleno e realização espiritual adicionados é superior.

O Senhor Chaitanya, todavia, rejeitou essa proposta também porque simplesmente por renunciar resultados materiais na realização Brahman não se pode realizar o mundo espiritual e atividades espirituais. Embora não haja nenhuma contaminação material quando alguém atinge o estágio de realização do Brahman, o estágio não é perfeito porque não existe dedicação positiva na atividade espiritual. Porque ainda está no plano mental, é externo. Um ser vivo puro não é liberado a menos que esteja completamente dedicado em atividade espiritual. Enquanto alguém estiver absorto em pensamentos impessoais ou em pensamentos do vazio, sua entrada numa vida eterna bem-aventurada de conhecimento não é completada. Quando conhecimento espiritual não é completo, a pessoa ficará impedida em sua tentativa para limpar a mente da variedade material. Assim impersonalistas ficam frustrados em suas tentativas de deixar a mente vazia por meditação artificial. É muito difícil esvaziar a mente de todos conceitos materiais. Como afirmado no Bhagavad-gita:

kleso 'dhikataras tesam
avyaktasakta-cetasam
avyakta hi gatir duhkham
dehavadbhir avapyate

"Para aqueles cujas mentes estão atraídas ao não-manifestado, aspecto impessoal do Supremo, o avanço é muito árduo. Fazer progresso nessa disciplina é sempre difícil para aqueles que estão corporificados" (Bg. 12.5). A liberação que é obtida por tal meditação impessoal não é completa; por isso o Senhor Chaitanya a rejeitou.

Depois que sua quarta proposta foi rejeitada, Ramananda Raya disse que o serviço devocional prestado sem qualquer tentativa de cultivo do conhecimento ou especulação mental é o estágio mais elevado da perfeição. Para apoiar esse ponto de vista, ele deu evidência do Srimad Bhagavatam (10.14.3) onde o Senhor Brahma diz à Suprema Personalidade de Deus:

jnane prayasam udapasya namanta eva
jivanti san-mukharitam bhavadiya-vartam
sthane sthitah sruti-gatam tanu-van-manobhir
ye prayaso 'jita jito 'py asi tais tri-lokyam

"Meu querido Senhor, deve-se abandonar especulação monista e o cultivo do conhecimento todos juntos. Deve-se começar sua vida espiritual em serviço devocional por receber informação das atividades do Senhor de um devoto do Senhor realizado. Se a pessoa cultivar sua vida espiritual por seguir esses princípios e por manter-se no caminho honesto da vida, então embora Sua Divindade nunca seja conquistado, Você Se torna conquistado por esse processo".

Quando Ramananda Raya apresentou essa proposta, o Senhor Chaitanya disse imediatamente, "Sim, isso está certo". Nesta era não existe possibilidade de adquirir conhecimento espiritual por renúncia, ou por serviço devocional misturado, por atividade lucrativa em serviço devocional misturado, ou pelo cultivo do conhecimento. Porque a maioria das pessoas é caída e porque não há tempo para elevá-las por um processo gradual, o melhor curso, de acordo com o Senhor Chaitanya, é que elas permaneçam em qualquer condição que estejam mas se dediquem a ouvir as atividades do Supremo Senhor como essas atividades são explicadas no Bhagavad-gita e Srimad Bhagavatam. As mensagens transcendentais das escrituras devem ser recebidas dos lábios de almas realizadas. Desse modo uma pessoa pode continuar a viver em qualquer condição que esteja e mesmo assim fazer progresso no avanço espiritual. Assim pode-se seguramente avançar e realizar plenamente a Suprema Personalidade de Deus.

Embora o Senhor Chaitanya aceitou esses princípios, Ele ainda pediu a Ramananda Raya para explicar mais serviço devocional avançado. Assim o Senhor Chaitanya deu a Ramananda Raya uma chance para discutir avanço gradual a partir dos princípios de varnasrama-dharma (as quatro castas e quatro ordens da vida espiritual). O Senhor Chaitanya rejeitou o varnasrama-dharma e o oferecimento de atividade lucrativa porque no campo da execução do serviço devocional puro, tem muito pouco uso desses princípios. Sem auto-realização, os métodos artificiais de serviço devocional não podem ser aceitos como serviço devocional puro. Serviço devocional puro auto-realizado é completamente diferente de todos os outros tipos de atividade transcendental. O estágio mais elevado de atividade transcendental é sempre livre de todos desejos materiais, esforços lucrativos e tentativas especulativas pelo conhecimento. O estágio mais elevado se concentra na execução simples, favorável do serviço devocional puro.

Ramananda Raya pôde entender o motivo do Senhor Chaitanya; por isso ele afirmou que a obtenção do amor puro do Supremo é o estágio de perfeição mais elevado. Há um belo verso no Padyavali o qual é dito como composto pelo próprio Ramananda Raya. O significado do verso é: "Enquanto houver fome no estômago e sentir vontade de comer e beber, pode-se ficar feliz por comer qualquer comestível. Similarmente, pode haver muita parafernália para adorar o Supremo Senhor, mas quando isso é misturado com amor puro do Supremo, torna-se uma fonte real de felicidade transcendental". Ramananda Raya também compôs outro verso o qual afirma que mesmo depois de milhões e milhões de nascimentos não se pode alcançar um senso de serviço devocional, mas se de uma forma ou outra, alguém deseja atingir serviço devocional, a associação com um devoto puro tornará isso possível. Assim deve-se ter um desejo forte de se dedicar no serviço devocional. Nesses dois versos, Ramananda Raya descreveu os princípios reguladores e amor do Supremo desenvolvido. O Senhor Chaitanya queria trazê-lo para o estágio do amor do Supremo desenvolvido, e Ele queria que ele falasse dessa plataforma. Assim a discussão entre Ramananda Raya e o Senhor Chaitanya procedeu sobre a base do amor do Supremo.

Se amor do Supremo é elevado para a plataforma pessoal, ele é chamado prema-bhakti. No começo de prema-bhakti, um relacionamento particular entre o Supremo Senhor e o devoto não é estabelecido, mas quando prema-bhakti desenvolve, um relacionamento com o Supremo Senhor é manifestado em diferentes sabores transcendentais. O primeiro estágio é o de servidão, onde o Supremo Senhor é aceito como o senhor e o devoto como o servidor eterno. Quando o Senhor Chaitanya aceitou esse processo, Ramananda Raya descreveu o relacionamento entre o servidor e o senhor. Como descrito no Srimad Bhagavatam (9.5.16), Durvasa Muni, um grande yogi místico que se considerava muito elevado, invejou Maharaja Ambarisha, que era conhecido como o maior devoto do seu tempo. Numa tentativa de assediar Maharaja Ambarisha, Durvasa Muni se deparou com uma grande catástrofe e foi derrotado pelo sudarsana-cakra do Senhor. Durvasa Muni admitiu seu erro e disse, "Para devotos puros que estão sempre dedicados no serviço amoroso transcendental do Senhor, nada é considerado impossível, porque eles estão dedicados no serviço do Supremo Senhor, cujo próprio nome é suficiente para liberação".

No Stotra-ratna (46), Yamunacharya escreve: "Meu Senhor, aqueles que se mantêm independentes de Seu serviço são desamparados. Eles trabalham por conta própria, e não recebem nenhum apoio da autoridade superior. Por isso eu anseio pelo tempo quando eu me dedicarei plenamente no Seu serviço amoroso transcendental sem nenhum desejo por satisfação material e sem estar confinado no plano mental. Somente quando eu me dedicar nesse serviço devocional imaculado que desfrutarei vida espiritual de verdade".

Depois de ouvir essa declaração, o Senhor pediu a Ramananda Raya para ir mais adiante ainda.

     

      

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Vinte e Nove

Amor Puro por Krishna

Encorajado pelo Senhor Chaitanya para prosseguir adiante, Ramananda Raya disse que o relacionamento fraternal com o Senhor Krishna está num plano transcendental ainda mais elevado. Desse modo Ramananda Raya indica que quando o relacionamento com Krishna incrementa em afeição, o clima de medo e a consciência da superioridade do Supremo Senhor diminuem. Nesse ponto, o clima de fé incrementa, e essa fé se chama amizade. No relacionamento fraternal, existe um senso de igualdade entre Krishna e Seus amigos.

Sobre isso, Ramananda Raya citou um verso do Srimad Bhagavatam (10.12.11) no qual Shukadeva Goswami descreve o almoço do Senhor Krishna com Seus amigos na floresta. O Senhor Krishna e Seus amigos foram para a floresta para brincar com as vacas, e é dito que os meninos que acompanharam Krishna desfrutavam amizade transcendental com a Suprema Personalidade de Deus. O Supremo Senhor é considerado o Brahman impessoal por grandes sábios, a Suprema Personalidade de Deus para os devotos, e um ser humano ordinário para pessoas comuns.

O Senhor Chaitanya apreciou essa declaração muitíssimo, então Ele disse, "Você pode ir mais além ainda". Assim solicitado, Ramananda Raya então afirmou que relacionamento paterno-materno com Krishna é uma posição transcendental ainda mais elevada. Quando a afeição do relacionamento fraternal incrementa, desenvolve-se no relacionamento paternal-maternal que é encontrado entre pai e filho. A esse respeito, Ramananda Raya citou um verso do Srimad Bhagavatam (10.8.46) onde Maharaja Parikshit inquire de Shukadeva Goswami sobre a magnitude da atividade piedosa executada por Yashoda, a mãe de Krishna, que a capacitou para ser chamada de "mãe" e seus seios serem mamados pela Suprema Personalidade de Deus. Ele também citou outro verso do Srimad Bhagavatam (10.9.20) no qual está afirmado que Yashoda recebeu uma misericórdia dessa incomparável da Suprema Personalidade de Deus a qual não pode ser comparada à misericórdia recebida por Brahma, o primeiro ser vivo criado, ou pelo Senhor Shiva, ou mesmo pela deusa da fortuna, Lakshmi, que está sempre situada no tórax do Senhor Vishnu.

O Senhor Chaitanya então pediu a Ramananda Raya para proceder adiante a fim de chegar ao ponto do amor conjugal. Por entender a mente do Senhor Chaitanya, Ramananda Raya imediatamente respondeu que de fato era o amor conjugal com Krishna que constituía o relacionamento mais elevado. Em outras palavras, relacionamentos íntimos com Krishna se desenvolvem de um conceito ordinário da Suprema Personalidade de Deus, para o conceito de senhor e servo, e, quando isso se torna confidencial, desenvolve-se em um relacionamento de amizade, e quando esse relacionamento se desenvolve mais, torna-se paterno-materno, e quando esse se desenvolve para o ponto mais elevado do amor e afeição, é conhecido como amor conjugal com o Supremo Senhor. Ramananda Raya citou outro verso do Srimad Bhagavatam (10.47.60) o qual afirma que o clima transcendental de êxtase exibido durante a dança rasa entre as gopis e Krishna nunca foi saboreado mesmo pela deusa da fortuna, que está sempre situada no tórax do Senhor no reino espiritual. E o que falar da experiência de mulheres ordinárias?

Ramananda Raya então explicou o processo gradual pelo qual amor puro por Krishna é desenvolvido. Ele indicou que o ser vivo é relacionado com a Suprema Personalidade de Deus em um dos relacionamentos justamente adequados a ele. Na realidade, relacionamentos com o Supremo Senhor começam com o relacionamento de senhor e servo e se desenvolvem adiante em amizade, amor paterno-materno e amor conjugal. Aquele que atinge seu relacionamento particular com a Suprema Personalidade de Deus deve ser conhecido por estar no melhor relacionamento para ele, mas quando esses relacionamentos são estudados, pode-se ver que o estágio neutro de realização (brahma-bhuta - Bhag. 4.30.20) é o primeiro. Quando alguém aceita o Senhor como senhor e ele mesmo como servo, o relacionamento desenvolve, e se desenvolve mais quando a pessoa se torna um amigo do Supremo Senhor, e ainda mais adiante quando se torna um pai-mãe. Assim o relacionamento avança de amizade para amor paterno-materno e finalmente para amor conjugal, que é o relacionamento supremo com o Senhor.

Auto-realização na relação como servidor é certamente transcendental, e quando um senso de fraternidade é adicionado, o relacionamento desenvolve. À medida que a afeição incrementa, esse relacionamento desenvolve em paternidade-maternidade e amor conjugal. Ramananda Raya citou um verso do Bhakti-rasamrita-sindhu (2.5.38) o qual afirma que afeição espiritual pelo Supremo Senhor é transcendental em todos os casos, mas o devoto individual tem uma aptidão específica por um relacionamento particular, e esse relacionamento é mais saboreável para ele do que os outros.

Esses relacionamentos transcendentais com o Supremo Senhor não podem ser manufaturados por imaginações mentais de pseudo-devotos. No Bhakti-rasamrita-sindhu (1.2.101) Rupa Goswami afirmou que serviço devocional o qual não faz nenhuma referência às escrituras Védicas ou literaturas Védicas e que não segue os princípios lá estabelecidos nunca pode ser aprovado. Sri Bhaktisiddhanta Sarasvati Goswami Maharaja também comentou que mestres espirituais profissionais, recitadores do Bhagavatam profissionais, artistas de kirtana profissionais, e aqueles engajados em serviço devocional auto imaginado não podem ser aceitos. Na Índia existem várias comunidades profissionais conhecidas como Aula, Vaula, Kartabhaja, Neda Daravesha, Snai, Atibadi, Chudhari, e Gauranganagari. Um membro da Sociedade Goswami Ventor, ou a casta gosvami, não pode ser aceito como descendente dos seis Goswamis originais. Nem podem assim chamados devotos que manufaturam canções sobre o Senhor Chaitanya, nem aqueles que são sacerdotes profissionais ou recitadores pagos, serem aceitos. Aquele que não segue os princípios de pañcaratra, ou aquele que é um impersonalista ou dado à vida sexual, não pode ser comparado com aqueles que dedicaram suas vidas para o serviço de Krishna. Um devoto puro que está sempre dedicado na Consciência de Krishna pode sacrificar tudo para o serviço do Senhor. Aquele que dedicou sua vida para o serviço do Senhor Chaitanya, Krishna e o mestre espiritual, ou uma pessoa que segue os princípios da vida de casado, e também aquele que segue os princípios da vida renunciada na ordem de Chaitanya Mahaprabhu, é um devoto e não pode ser comparado a pessoas profissionais.

Quando alguém fica livre de todas contaminações materiais, qualquer um dos relacionamentos com Krishna é transcendentalmente saboreável. Infelizmente, aqueles que são inexperientes na ciência transcendental não podem apreciar os diferentes relacionamentos com o Supremo Senhor. Eles acham que todos esses relacionamentos surgem de maya. O Chaitanya Charitamrita afirma que terra, água, fogo, ar e éter (os cinco elementos grosseiros) são desenvolvidos de formas sutis para formas grosseiras. Por exemplo, som é encontrado no éter, mas no ar existe som e tato. Quando fogo é adicionado, existe som, tato e forma também. Quando água é acrescentada, existe som, tato, forma e sabor, e quando terra é acrescentada, existe som, tato, forma, sabor e cheiro. Justamente igual várias características se desenvolvem na progressão de éter abaixo até terra, assim as cinco características da devoção se desenvolvem e são todas encontradas no relacionamento do amor conjugal. Assim o relacionamento com Krishna em amor conjugal é aceito como o estágio de perfeição mais elevado do amor de Deus.

Como afirmado no Srimad Bhagavatam (10.82.44): "Serviço devocional para a Suprema Personalidade de Deus é a vida de todo ser vivo". De fato, o Senhor informou as donzelas de Vraja que o amor delas por Ele era a única causa delas alcançarem a associação Dele. É dito que o Senhor Krishna, em relação com Seus devotos, aceita todos tipos de serviço devocional de acordo com a atitude do devoto. Desse modo, Krishna reciproca para as necessidades do devoto. Se alguém quer um relacionamento com Krishna como senhor e servo, Krishna faz o papel do senhor perfeito. Para aquele que quer Krishna como um filho num relacionamento paternal-maternal, Krishna faz o papel de um filho perfeito. Similarmente, se um devoto quer adorar Krishna em amor conjugal, Krishna faz o papel de um esposo ou amante perfeitamente. Todavia, o Próprio Krishna admitiu que Seu relacionamento amoroso com as donzelas de Vraja em amor conjugal é o estágio de perfeição mais elevado. No Srimad Bhagavatam (10.32.22) Krishna disse para as gopis:

na paraye 'ham niravadya-samyujam
sva-sadhu-krtyam vibudhayusapi vah
ya mabhajan durjaya-geha-srnkhalah
samvrscya tad vah pratiyatu sadhuna

"Seu relacionamento Comigo é completamente transcendental, e não é possível para Mim oferecer nada em troca do seu amor, mesmo depois de muitos nascimentos. Vocês foram capazes de abandonar todo apego por desfrute material, e vocês procuraram por Mim. Porque Eu não sou capaz de retribuir seu amor, vocês têm de ficar satisfeitas com suas próprias atividades".

Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Goswami Maharaja comentou que existe uma classe de pessoas comuns as quais alegam que todos e cada um podem adorar o Supremo Senhor de acordo com seu próprio modo de adoração inventado e mesmo assim atingir a Suprema Personalidade de Deus. Elas alegam que se pode aproximar do Supremo Senhor ou por atividades lucrativas, conhecimento especulativo, meditação ou austeridade e que qualquer um desses métodos será bem sucedido. Elas alegam que se pode aceitar muitos caminhos diferentes e ainda assim chegar ao mesmo lugar, e mantêm que a Verdade Absoluta Suprema pode ser adorada tanto como a Deusa Kali, ou Deusa Durga, ou Senhor Shiva, Ganesha, Rama, Hari, ou Brahma. Em resumo, elas mantêm que não importa como a Verdade Absoluta é chamada, porque todos os nomes são um e o mesmo. Elas dão o exemplo de um homem com muitos nomes; se ele for chamado por qualquer um desses nomes, ele responderá.

Tais pontos de vista podem ser muito satisfatórios para uma pessoa ordinária, mas estão cheios de equívocos. Alguém que adora os semideuses, motivado por luxúria material, não pode atingir a Suprema Personalidade de Deus. Se alguém adora os semideuses, a energia externa do Senhor pode conceder alguns resultados, mas por isso não se pode dizer que alguém pode atingir o Supremo Senhor por tal adoração. De fato, a adoração deles é desencorajada no Bhagavad-gita:

antavat tu phalam tesam
tad bhavaty alpa-medhasam
devan deva-yajo yanti
mad-bhakta yanti mam api

"Pessoas com pouca inteligência adoram os semideuses, e seus frutos são limitados e temporários. Aqueles que adoram os semideuses vão para os planetas dos semideuses, porém Meus devotos alcançam ultimamente Meu planeta supremo" (Bg. 7.23). Assim o Supremo Senhor concede a bênção de Sua associação somente para aqueles que O adoram, e não para aqueles que adoram os semideuses. Não é um fato que todos e cada um podem alcançar a Suprema Personalidade de Deus por adorar semideuses materiais. Portanto é surpreendente que uma pessoa possa imaginar que se tornará perfeita por adorar os semideuses. Os resultados do serviço devocional prestado em Consciência de Krishna plena não podem ser comparados aos resultados da adoração de semideus, atividade lucrativa ou especulação mental. Pelos resultados das atividades lucrativas, a pessoa pode ir tanto para os planetas celestiais quanto os infernais.

      

      

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Trinta

Os Passatempos Transcendentais de Radha e Krishna

A diferença entre executar atividades religiosas ordinárias e serviço devocional é muito grande. Por executar rituais religiosos pode-se obter desenvolvimento econômico, satisfação sensual ou liberação (imergir na existência do Supremo), mas os resultados do serviço devocional transcendental são completamente diferentes desses benefícios temporários. Serviço devocional do Senhor é sempre novo, e é cada vez mais agradável transcendentalmente. Assim existe um abismo de diferença dos resultados derivados do serviço devocional e aqueles derivados de rituais religiosos. A grande energia espiritual conhecida como jadadhisthatri, ou mahamaya, a superintendente do mundo material, e os diretores dos departamentos materiais, os semideuses, e também os produtos da energia externa do Supremo Senhor, são apenas reflexos pervertidos da opulência do Supremo Senhor. Os semideuses na realidade são cumpridores de ordens do Supremo Senhor, e eles ajudam administrar a criação material. No Brahma-samhita está afirmado que as obras da supremamente poderosa superintendente, Durga, são apenas indicações sombrias das obras do Supremo Senhor. O Sol trabalha justamente igual o olho do Supremo Senhor, e Brahma trabalha justamente igual a luz refletida do Supremo Senhor. Assim todos os semideuses e também a própria energia externa também, Durgadevi, e todos os diferentes diretores de departamentos são apenas servos do Supremo Senhor no mundo material.

No mundo espiritual, existe outra energia, a energia espiritual superior, ou energia interna, a qual age sob a direção de yogamaya. Yogamaya é a potência interna do Supremo Senhor; ela também trabalha sob a direção do Senhor, mas ela trabalha no mundo espiritual. Quando o ser vivo se põe sob a direção de yogamaya em vez de mahamaya, gradualmente se torna um devoto de Krishna. Mesmo assim aqueles que estão atrás de opulência material e felicidade material se colocam sob o cuidado da energia material, mahamaya, ou sob o cuidado de semideuses materiais como o Senhor Shiva e outros. No Srimad Bhagavatam é encontrado que quando as gopis de Vrindavana desejaram Krishna como seu esposo, elas oraram para a energia espiritual, yogamaya, para a satisfação de seu desejo. No Sapta-shati encontra-se que o Rei Suratha e um comerciante chamado Samadhi adoraram mahamaya por opulência material. Assim não se deve erroneamente igualar yogamaya e mahamaya.

Porque o Senhor está sobre a plataforma absoluta, não existe diferença entre o santo nome do Senhor e o Supremo Senhor Ele mesmo. Existem diferentes nomes para o Supremo Senhor, e esses nomes diferentes têm propósitos e significados diferentes. Por exemplo, Ele é conhecido como Paramatma, a Superalma, Brahman o Absoluto Supremo, Srishtikarta o criador, Narayana o Senhor transcendental, Rukminiramana o esposo de Rukmini, Gopinatha o desfrutador das gopis, e Krishna. Desse modo o Senhor tem nomes diferentes, e esses nomes indicam funções diferentes. O aspecto do Supremo Senhor como o criador é diferente do aspecto do Senhor como Narayana. Alguns dos nomes do Senhor como o criador são concebidos por pessoas materialistas. Não se pode realizar plenamente a essência da Suprema Personalidade de Deus por entender o nome do criador porque esta criação material é uma função da energia externa do Supremo Senhor. Assim o conceito de Deus como o criador inclui apenas a característica externa. Similarmente, quando chamamos o Supremo Senhor Brahman, não podemos ter nenhuma compreensão das seis opulências do Supremo Senhor. Na realização Brahman, as seis opulências não são realizadas plenamente; portanto realização Brahman não é entendimento completo do Supremo Senhor. Nem é a realização Paramatma, realização da Superalma, realização plena da Suprema Personalidade de Deus, porque a natureza todo-penetrante do Supremo Senhor é apenas uma representação parcial de Sua opulência.

Mesmo o relacionamento transcendental experimentado por um devoto de Narayana em Vaikuntha é incompleto porque não é um relacionamento com Krishna em Goloka Vrindavana. Os devotos de Krishna não saboreiam serviço devocional para Narayana porque serviço devocional para Krishna é tão atraente que os devotos de Krishna não desejam adorar nenhuma outra forma. Assim as gopis de Vrindavana não gostam de ver Krishna como o esposo de Rukmini, nem o chamam de Rukminiramana. Em Vrindavana Krishna é chamado de Radhakrishna, ou Krishna, a propriedade de Radharani. Embora o esposo de Rukmini e Krishna de Radha estejam no mesmo nível no sentido ordinário, ainda assim, no mundo espiritual, os nomes indicam diferentes compreensões dos vários aspectos da personalidade transcendental de Krishna. Se alguém iguala Rukminiramana, Radharamana, Narayana, ou qualquer outro nome do Supremo Senhor, ele comete o erro de sobrepor sabores, que tecnicamente é chamado rasabhasa. Aqueles que são devotos versados não aceitam tais miscigenações que são contra as conclusões do serviço devocional puro.

Embora Sri Krishna, a Suprema Personalidade de Deus, corporifica toda superexcelência e beleza, quando Ele está entre as donzelas de Vraja, Ele é conhecido como Gopijanavallabha. Os devotos não podem saborear a beleza do Supremo Senhor mais do que as donzelas de Vraja. No Srimad Bhagavatam (10.33.7) é confirmado que Krishna, o filho de Devaki, é a última palavra em superexcelência e beleza, quando Ele está entre as gopis parece que Ele é uma jóia sublime incrustrada entre artesanato de ouro. Embora o Senhor Chaitanya aceitasse isso como a realização mais elevada do Supremo Senhor como amante conjugal, Ele entretanto pediu a Ramananda Raya para proceder adiante.

Depois de ouvir esse pedido, Ramananda Raya observou que essa foi a primeira vez que ele foi solicitado para ir adiante além das gopis numa tentativa de entender Krishna. Certamente existe intimidade transcendental entre as donzelas de Vraja e Krishna, Ramananda indicou, mas de todos os relacionamentos, o relacionamento entre Radharani e Krishna em amor conjugal é o mais perfeito. Nenhuma pessoa comum pode entender o êxtase do amor transcendental entre Radharani e Krishna, nem pode entender o êxtase do sabor transcendental do amor transcendental entre Krishna e as gopis. Mesmo assim se alguém tentar seguir os passos das gopis, pode ficar situado no estágio mais elevado do amor transcendental. Assim aquele que quer se elevar para o estágio transcendental de perfeição deve seguir os passos das donzelas de Vraja como uma servente assistente das gopis.

O Senhor Chaitanya exibiu o humor de Srimati Radharani quando Ela foi contactada de Dwaraka por Krishna. Um amor transcendental assim não é possível para nenhuma pessoa comum; por isso não devemos imitar o estágio de perfeição mais elevado exibido por Chaitanya Mahaprabhu. Se, entretanto, alguém desejar estar nessa associação, pode seguir os passos das gopis. No Padma Purana está afirmado que justamente igual Radharani é querida por Krishna, similarmente o kunda conhecido como Radhakunda também é muito querido por Ele. Radharani é a única gopi que é mais querida por Krishna do que as outras gopis. No Srimad Bhagavatam (10.30.28) também está afirmado que Radharani e as gopis prestam o serviço amoroso perfeito mais elevado para o Senhor e que o Senhor é tão satisfeito com elas que Ele não quer deixar a companhia de Srimati Radharani.

Quando o Senhor Chaitanya ouviu Ramananda Raya falar dos casos amorosos entre Krishna e Radharani, Ele disse, "Por favor vá em frente". O Senhor também disse que desfrutava com muito gosto as descrições dos casos amorosos entre Krishna e as gopis. "É como se um rio de néctar fluísse de seus lábios", disse Ele. Ramananda Raya continuou a indicar que quando Krishna dançou entre as gopis Ele pensou, Eu não dei nenhuma atenção especial para Radharani". Porque entre as outras gopis Radharani não era tanto um objeto de amor especial, Krishna A levou da área da dança rasa e mostrou a Ela favor especial. Depois de explicar isso para o Senhor Chaitanya, Ramananda Raya disse, "Agora vamos saborear os casos amorosos transcendentais entre Krishna e Radha. Eles não têm nenhuma comparação neste mundo material".

Ramananda Raya assim continuou suas descrições. Durante uma realização da dança rasa, Radharani subitamente deixou a área, como se Ela estivesse sentida porque nenhuma atenção especial foi dada a Ela. Krishna desejava ver Radharani a fim de cumprir o propósito da dança rasa, mas sem ver Radharani ali, Ele ficou muito triste e saiu à procura Dela. No Gita-govinda há um verso o qual afirma que o inimigo de Kamsa, Krishna, também queria Se envolver em casos amorosos com mulheres e assim simplesmente levou Radharani embora e deixou a companhia das outras donzelas de Vraja. Krishna ficou muito aflito por causa da ausência de Radharani, e assim mentalmente aflito, começou a procurá-La nas margens do Yamuna. Não conseguiu encontrá-La, assim entrou nos bosques de Vrindavana e começou a lamentar. Ramananda Raya destacou que quando alguém discute o significado desses dois versos especiais do Gita-govinda (3.1-2), pode saborear o néctar mais elevado dos casos amorosos de Krishna e Radha. Embora houvesse muitas gopis para dançar com Krishna, Krishna especialmente queria dançar com Radharani. Na dança rasa Krishna Se expandiu e Se colocou entre cada duas gopis, mas Ele estava especialmente presente com Radharani. Entretanto, Radharani não ficou contente com o comportamento de Krishna. Como está descrito no Ujjvala-nilamani: "O caminho dos casos amorosos é justamente igual o movimento de uma serpente. Entre jovens amantes, existem dois tipos de mentalidade - sem causa e casual". Assim quando Radharani deixou a área da dança rasa sentida por não receber tratamento especial, Krishna ficou muito triste de vê-La ausente. A perfeição da dança rasa era considerada completa devido à presença de Radharani, e na ausência Dela, Krishna considerou a dança como interrompida. Por isso que Ele deixou a arena para procurá-La. Quando Ele não conseguiu encontrar Radharani depois de passar por vários lugares, Ele ficou muito aflito. Assim fica entendido que Krishna não podia desfrutar Sua potência de prazer mesmo no meio das gopis. Mas na presença de Radharani, Ele ficava satisfeito.

Quando esse amor transcendental entre Radharani e Krishna foi descrito por Ramananda Raya, o Senhor Chaitanya admitiu, "Eu vim até você para entender os casos amorosos transcendentais entre Krishna e Radha, agora estou muito satisfeito que você os descreveu tão bem. Eu posso entender da sua versão que esse é o estado amoroso mais elevado entre Krishna e Radha". Ainda assim o Senhor Chaitanya pediu a Ramananda Raya para explicar algo mais: "Quais são as características transcendentais de Krishna e Radharani, e quais são as características transcendentais da reciprocidade de Seus sentimentos, e o que é o amor entre Eles? Se você descrever tudo isso para Mim gentilmente, Eu ficarei muito agradecido. Porque além de você, ninguém mais pode descrever essas coisas".

"Eu não sei nada", Ramananda Raya respondeu com toda humildade. "Eu simplesmente digo o que Você me faz dizer. Eu sei que Você é Krishna em Pessoa, e mesmo assim Você aprecia ouvir sobre Krishna de mim. Assim me desculpe por minha expressão deficiente. Eu justamente tento expressar qualquer coisa que Você me faz expressar".

"Eu sou um sannyasi Mayavadi", o Senhor Chaitanya protestou. "Eu não tenho nenhum conhecimento dos aspectos transcendentais do serviço devocional. Pela grandeza de Sarvabhauma Bhattacharya Minha mente ficou clara, e agora Eu tento entender a natureza do serviço devocional para o Senhor Krishna. Bhattacharya recomendou que Eu visse você para entender Krishna. De fato, ele disse que Ramananda Raya é a única pessoa que sabe algo sobre amor de Krishna. Por isso Eu vim até você pela recomendação de Sarvabhauma Bhattacharya. Por favor, então, não hesite em relatar para Mim todos os casos confidenciais entre Radha e Krishna".

Desse modo o Senhor Chaitanya realmente assumiu a posição subordinada perante Ramananda Raya. Isso tem um significado muito grandioso. Se alguém for sério sobre entender a natureza transcendental de Krishna, deve se aproximar de uma pessoa que é realmente enriquecida com Consciência de Krishna. Ninguém deve ser orgulhoso de seu nascimento material, opulência material, educação e beleza materiais e com essas coisas tentar conquistar a mente de um estudante avançado da Consciência de Krishna. Aquele que vai para uma pessoa consciente de Krishna, por achar que será induzido favoravelmente, está iludido sobre esta ciência. Deve-se aproximar de uma pessoa consciente de Krishna com toda humildade e fazer perguntas relevantes a ela. Se alguém for para desafiá-la, uma pessoa consciente de Krishna altamente elevada assim não estará disponível para nenhum serviço. Uma pessoa desafiadora arrogante não pode obter nada de uma pessoa consciente de Krishna; ela simplesmente permanecerá em consciência material. Embora o Senhor Chaitanya nasceu numa família brahmana de alta classe e estava situado no estágio mais elevado de perfeição do sannyasa, Ele mesmo assim mostrou por Seu comportamento que mesmo uma pessoa elevada não hesitaria em tomar lições de Ramananda Raya, apesar de Ramananda Raya ter aparecido como um casado situado num status social abaixo de um brahmana.

Assim o Senhor Chaitanya mostrou claramente que um estudante sincero nunca se importa se seu mestre espiritual nasceu numa família brahmana de alta classe ou família ksatriya, ou se ele é sannyasi, brahmacari ou qualquer outra coisa. Quem quer que possa ensinar alguém sobre a ciência de Krishna deve ser aceito como guru.

      

      

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Trinta e Um

A Perfeição Suprema

Qualquer posição que a pessoa tenha, se ela é plenamente versada na ciência de Krishna, Consciência de Krishna, ela pode se tornar um mestre espiritual fidedigno, iniciador ou professor da ciência. Em outras palavras, alguém pode se tornar um mestre espiritual fidedigno se tiver conhecimento suficiente da ciência de Krishna, Consciência de Krishna. A posição não depende de uma posição particular na sociedade ou do nascimento. Essa é a conclusão do Senhor Chaitanya Mahaprabhu, e está de acordo com as leis Védicas. Sobre o poder dessa conclusão, o Senhor Chaitanya, previamente conhecido como Visvambhara, aceitou um mestre espiritual, Isvara Puri, que era um sannyasi. Similarmente o Senhor Nityananda Prabhu e Sri Adwaita Acharya também aceitaram outro sannyasi como seu mestre espiritual, Madhavendra Puri. Esse Madhavendra Puri também é conhecido como Lakshmipati Tirtha. Similarmente, outro grande acarya, Sri Rasikananda, aceitou Sri Shyamananda como seu mestre espiritual, embora ele não nasceu numa família brahmana. Assim também Ganganarayana Chakravarti aceitou Narottama dasa Thakura como mestre espiritual. Nos tempos antigos havia até mesmo um caçador chamado Dharma, que se tornou um mestre espiritual para muita gente. Existem instruções claras no Mahabharata e Srimad Bhagavatam (7.11.32) as quais afirmam que uma pessoa - seja ela brahmana, ksatriya, vaisya ou sudra - deve ser aceita por suas qualificações pessoais e não por nascimento.

A posição da pessoa deve ser estabelecida pelas qualificações pessoais e não por nascimento. Por exemplo, se um homem nasceu numa família brahmana mas suas qualificações pessoais são as de um sudra, ele deve ser aceito como um sudra. Similarmente, se uma pessoa nasceu numa família sudra mas tem as qualificações de um brahmana, deve ser aceita como um brahmana. Todas as leis dos sastras, e também as versões dos grandes sábios e autoridades, estabelecem que um mestre espiritual fidedigno não é necessariamente um brahmana. A única qualificação é que deve ser versado na ciência de Krishna, Consciência de Krishna. Só isso faz a pessoa elegível para se tornar um mestre espiritual. Essa é a conclusão de Sri Chaitanya Mahaprabhu em Suas discussões com Ramananda Raya.

No Hari-bhakti-vilasa está afirmado que se um mestre espiritual fidedigno nasceu numa família brahmana e outro, que também é qualificado, nasceu numa família sudra, deve-se aceitar aquele que nasceu na família brahmana. Essa declaração serve como um compromisso social, mas não tem nada a ver com entendimento espiritual. Essa determinação é aplicável somente para aqueles que consideram status social mais importante do que status espiritual. Não é para pessoas que são espiritualmente sérias. Uma pessoa séria aceitará a instrução de Chaitanya Mahaprabhu que qualquer um - independentemente de sua posição - versado na ciência de Krishna deve ser aceito como o mestre espiritual. Existem muitas prescrições no Padma Purana as quais afirmam que um devoto avançado do Senhor altamente elevado espiritualmente é sempre um devoto de primeira classe e é portanto um mestre espiritual, mas uma pessoa altamente elevada nascida numa família brahmana não pode ser um mestre espiritual a menos que seja um devoto do Senhor. Uma pessoa nascida numa família brahmana pode ser versada em todos os rituais das escrituras Védicas mas se não for um devoto puro, não pode ser um mestre espiritual. Em todos os sastras a qualificação principal de um mestre espiritual fidedigno é que ele seja versado na ciência de Krishna.

O Senhor Chaitanya assim pediu a Ramananda Raya para ir adiante no seu ensinamento a Ele sem hesitação, sem considerar a posição do Senhor Chaitanya como um sannyasi. Assim o Senhor Chaitanya o estimulou para continuar a falar sobre os passatempos de Radha e Krishna.

"Porque Você me pede para falar dos passatempos de Radha e Krishna", Ramananda Raya se submeteu humildemente, "eu obedecerei Sua ordem. Eu falarei em qualquer modo que Você queira". Assim Ramananda Raya submeteu-se humildemente como uma marionete perante o Senhor Chaitanya, o mestre da marionete. Ele só queria dançar de acordo com o desejo de Chaitanya Mahaprabhu. Ele comparou sua língua a um instrumento de cordas, e disse, "Você é o tocador desse instrumento". Assim à medida que o Senhor Chaitanya tocasse, Ramananda Raya vibraria o som.

Ele disse que o Senhor Krishna é a Suprema Personalidade de Deus, a fonte de todas encarnações e a causa de todas as causas. Existem inumeráveis planetas Vaikuntha, inumeráveis encarnações, expansões do Supremo Senhor, e inumeráveis universos também, e de todas essas existências o Supremo Senhor Krishna é a única fonte. Seu corpo transcendental é composto de eternidade, bem-aventurança e conhecimento, e Ele é conhecido como o filho de Nanda Maharaja e o habitante de Goloka Vrindavana. Ele é pleno em seis opulências - toda riqueza, poder, fama, beleza, conhecimento e renúncia. No Brahma-samhita (5.1) é confirmado que Krishna é o Supremo Senhor, o Senhor de todos senhores, e Seu corpo transcendental é sac-cid-ananda. Ninguém é a fonte de Krishna, mas Krishna é a fonte de tudo. Ele é a causa suprema de todas as causas e o residente de Vrindavana. Ele também é muito atraente, justamente igual Cupido. Pode-se adorá-Lo pelo kama-gayatri mantra.

No Brahma-samhita a terra transcendental de Vrindavana é descrita como sempre espiritual. Essa terra espiritual é povoada por deusas da fortuna, que são conhecidas como gopis. Todas elas são amadas de Krishna, e Krishna é o único amante de todas essas gopis. As árvores dessa terra são kalpa-vrksa, árvores que satisfazem desejos, e pode-se obter qualquer coisa que desejar delas. A terra é feita de pedra filosofal e a água de néctar. Nessa terra toda fala é canção, e todo caminhar é dança, e o companheiro constante de alguém é a flauta. Tudo é auto-iluminado, justamente igual o Sol neste mundo material. A forma humana de vida é destinada ao entendimento dessa terra transcendental de Vrindavana, e quem é afortunado deve cultivar conhecimento de Vrindavana e seus moradores. Nessa morada suprema há vacas surabhi que inundam a terra de leite. Porque lá nenhum momento é mal usado, não existe passado, presente e futuro. Uma expansão dessa Vrindavana, que é a residência suprema de Krishna, também está presente nesta Terra, e devotos superiores a adoram igual a morada suprema. Todavia, ninguém pode apreciar Vrindavana sem estar altamente elevado em conhecimento espiritual, Consciência de Krishna. De acordo com a experiência ordinária, Vrindavana parece ser uma vila ordinária, mas nos olhos de um devoto altamente elevado, é tão boa quanto a Vrindavana original. Um acarya altamente santificado cantou: "Quando minha mente ficará limpa de toda contaminação para que eu possa ser capaz de ver Vrindavana como ela é? E quando eu serei capaz de entender as literaturas deixadas pelos Goswamis para que eu seja capaz de conhecer os passatempos transcendentais de Radha e Krishna"?

Os casos amorosos entre Krishna e as gopis em Vrindavana também são transcendentais. Eles parecem como casos luxuriosos ordinários deste mundo material, mas existe um abismo de diferença. No mundo material pode haver um despertar temporário da luxúria, mas desaparece depois da assim chamada satisfação. No mundo espiritual o amor entre as gopis e Krishna incrementa constantemente. Essa é a diferença entre amor transcendental e luxúria material. A luxúria, ou assim chamado amor, que surge deste corpo é tão temporária quanto o próprio corpo em si, mas o amor que surge da alma eterna no mundo espiritual, está na plataforma espiritual, e esse amor também é eterno. Por isso que Krishna é chamado de Cupido sempre novo.

O Senhor Krishna é adorado no gayatri mantra, e o mantra específico pelo qual Ele é adorado se chama kama-gayatri. As literaturas Védicas explicam que a vibração sonora que pode elevar alguém além da imaginação mental se chama gayatri. O kama-gayatri mantra é composto de 24 e 1/2 sílabas assim:

klim kama-devaya vidmahe
puspa-banaya dhimahi
tanno 'nangah pracodayat

Esse kama-gayatri é recebido do mestre espiritual quando o discípulo é avançado no cantar de Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare. Em outras palavras, esse kama-gayatri mantra e samskara, ou reforma de um brahmana perfeito, são oferecidos pelo mestre espiritual quando ele vê que o discípulo é avançado no conhecimento espiritual. Mesmo assim, o kama-gayatri não é pronunciado sob certas circunstâncias. Em qualquer caso, o cantar de Hare Krishna é suficiente para elevar a pessoa para a plataforma espiritual mais elevada.

No Brahma-samhita uma bela descrição da flauta de Krishna é dada: "Quando Krishna começou a tocar Sua flauta, a vibração sonora entrou no ouvido de Brahma como o mantra Védico om". Esse om é composto de três letras - A, U e M - e cada uma descreve nosso relacionamento com o Supremo Senhor, nossas atividades pelas quais podemos alcançar a perfeição do amor mais elevada e a verdadeira posição do amor na plataforma espiritual. Quando a vibração sonora da flauta de Krishna é expressa através da boca de Brahma, ela se torna o gayatri. Assim por ser influenciado pela vibração sonora da flauta de Krishna, Brahma, a criatura suprema e primeiro ser vivo deste mundo material, foi iniciado como um brahmana. Que Brahma foi iniciado como um brahmana pela flauta de Krishna é confirmado por Srila Jiva Goswami. Quando Brahma foi iluminado pelo gayatri mantra através da flauta de Krishna, ele obteve todo o conhecimento Védico. Em reconhecimento à bênção oferecida a ele por Krishna, ele se tornou o mestre espiritual original de todos os seres vivos.

A palavra klim adicionada ao gayatri-mantra é explicada no Brahma-samhita como a semente transcendental do amor do Supremo, ou semente do kama-gayatri. O objeto é Krishna, que é o Cupido sempre jovem, e pela pronúncia do mantra klim Krishna é adorado. Também está afirmado no Gopala-tapani Upanishad que quando Krishna é falado como Cupido, não se deve pensar Nele como o Cupido deste mundo material. Como já foi explicado, Vrindavana é a morada espiritual de Krishna, e a palavra Cupido também é espiritual e transcendental. Não se deve aceitar o Cupido material e Krishna como no mesmo nível. O Cupido material representa a atração da carne e corpo externos, mas o Cupido espiritual é a atração pela qual a Superalma atrai a alma individual. Na realidade luxúria e sexo existem na vida espiritual, mas quando a alma espiritual está corporificada em elementos materiais, esse impulso espiritual é expressado através do corpo material e por isso é refletido pervertidamente. Quando alguém se torna realmente versado na ciência da Consciência de Krishna, pode entender que esse desejo material por sexo é abominável, enquanto sexo espiritual é desejável.

Sexo espiritual é de dois tipos: um é de acordo com a posição constitucional do eu e o outro de acordo com o objeto. Quando alguém entende a verdade sobre esta vida mas não está completamente limpo da contaminação material, não está realmente situado na morada transcendental, Vrindavana, embora possa entender vida espiritual. Quando, todavia, ele se torna livre dos impulsos sexuais do corpo material, pode realmente atingir a morada suprema de Vrindavana. Quando a pessoa está assim situada, pode pronunciar o kama-gayatri e kama-bija mantra.

Ramananda Raya então explicou que Krishna é atraente tanto para homens quanto para mulheres, para móveis e imóveis - de fato, para todos seres vivos. Por esse motivo Ele é chamado Cupido transcendental. Ramananda Raya citou um verso do Srimad Bhagavatam (10.32.2) o qual afirma que quando o Senhor apareceu perante as donzelas de Vraja sorrindo e tocando Sua flauta, Ele parecia igual Cupido.

Existem diferentes tipos de devotos que têm diferentes atitudes e relacionamentos com o Supremo Senhor. Qualquer relacionamento com o Senhor é tão bom quanto qualquer outro porque o ponto central é Krishna. Como está afirmado no Bhakti-rasamrita-sindhu: "Krishna é o reservatório de todos prazeres, e Ele sempre atrai as gopis pelo brilho espiritual do Seu corpo. Ele especialmente atrai Taraka, Pali, Shyama, e Lalita. Krishna é muito querido por Radharani, a gopi principal". Igual Krishna, as gopis são glorificadas pelos passatempos de Krishna. Existem vários relacionamentos diferentes com Krishna, e qualquer um que esteja atraído a Krishna por um relacionamento particular é glorificado.

Krishna é tão belo, transcendental e atraente que às vezes Ele atrai até mesmo Si próprio. O seguinte verso aparece no Gita-govinda (1.11):

visvesam anurañjanena janayann anandam indivara-
sreni-syamala-komalair upanayann angair anangotsavam
svacchandam vraja-sundaribhir abhitah pratyangam alingitah
srngarah sakhi murtiman iva madhau mugdho harih kridati

"Minha querida amiga, justamente veja como Krishna desfruta Seus passatempos transcendentais na primavera por expandir a beleza de Seu corpo pessoal. Suas pernas e mãos macias, exatamente iguais à mais bela lua, são usadas nos corpos das gopis. Quando Ele abraça diferentes partes dos corpos delas, Ele é tão belo. Krishna é tão belo que Ele atrai até mesmo Narayana, e também a deusa da fortuna que se associa com Narayana".

No Srimad Bhagavatam (10.89.58) o Bhuma-purusha (Maha-Vishnu) disse para Krishna, "Meu querido Krishna e Arjuna, Eu peguei os filhos do brahmana justamente para ver Vocês". Arjuna tentou salvar alguns jovenzinhos que morreram prematuramente em Dwaraka, e quando ele falhou em salvá-los, Krishna o levou até o Bhuma-purusha, e quando o Bhuma-purusha apresentou aqueles corpos mortos como seres vivos, Ele disse, "Vocês dois aparecem para preservar os princípios religiosos no mundo e para aniquilar os demônios". Em outras palavras, o Bhuma-purusha também estava atraído pela beleza de Krishna, e Ele planejou esse passatempo justamente como um pretexto para ver Krishna. Está registrado no Srimad Bhagavatam (10.16.36) que depois da serpente Kaliya ser punida por Krishna, uma das esposas de Kaliya disse a Krishna, "Querido Senhor, nós não podemos entender como essa serpente caída teve a oportunidade de ser chutada pelos Seus pés de lótus quando até mesmo a deusa da fortuna se submeteu a austeridades por muitos anos justamente para vê-Lo".

Como Krishna é atraído pela Sua própria beleza é descrito no Lalita-madhava (8.34). Depois de ver Seu próprio quadro, Krishna lamentou, "Quão glorioso é esse quadro! Ele Me atrai justamente igual atrai Radharani".

Depois de dar um resumo da beleza de Krishna, Ramananda Raya começou a falar da energia espiritual de Krishna, que é liderada por Srimati Radharani. Krishna possui expansões energéticas imensas. Três energias são proeminentes: a energia interna, energia externa e energia marginal. Isso é confirmado no Sexto Capítulo do Vishnu Purana onde está dito que Vishnu possui uma energia, que se chama energia espiritual, e é manifestada de três modos. Quando a energia espiritual é encoberta por ignorância, ela se chama energia marginal. A respeito da energia espiritual em si, ela é exibida em três formas porque Krishna é uma combinação de eternidade, bem-aventurança e conhecimento. No que diz respeito à Sua bem-aventurança, Sua energia espiritual é manifestada como a potência que dá prazer. Sua eternidade é manifestada como energia, e Seu conhecimento é manifestado como perfeição espiritual. Como confirmado no Vishnu Purana (1.12.69): "A potência de prazer de Krishna dá Seu prazer e bem-aventurança transcendentais". Assim quando Krishna quer desfrutar prazer, Ele exibe Sua própria potência espiritual conhecida como hladini.

Na Sua forma espiritual, Krishna desfruta Sua energia espiritual, e isso é a soma e substância dos passatempos Radha-Krishna. Esses passatempos só podem ser entendidos por devotos elevados. Não se deve tentar entender as potências e passatempos de Radha-Krishna da plataforma mundana. Geralmente pessoas as mal entendem como materiais.

Quando a potência de prazer é mais condensada, é chamada mahabhava. Srimati Radharani, a consorte eterna de Krishna, é a personificação desse mahabhava. Sobre isso, no Ujjvala-nilamani (4.3) Rupa Goswami afirma que existem duas competidoras em amor com Krishna, Radharani e Chandravali. Quando elas são comparadas, revela-se que Radharani é superior, porque Ela possui mahabhava-svarupa. Mahabhava-svarupa, a personificação de mahabhava, é aplicável para Radharani somente. Mahabhava é pleno da potência de prazer, e é uma exibição do amor mais elevado de Krishna. Radharani portanto é conhecida no mundo inteiro como a mais bem amada de Krishna, e Seu nome é sempre associado ao nome de Krishna como Radha-Krishna.

O Brahma-samhita (5.37) também confirma que Krishna Se expande por Sua potência de prazer no mundo espiritual e que essas potências não são diferentes de Krishna. Embora Krishna sempre desfruta a companhia das expansões da Sua potência de prazer, Ele é todo-penetrante. Por isso que Brahma oferece suas respeitosas reverências a Govinda, a causa de todas as causas.

Do mesmo modo que Krishna é o emblema mais elevado de perfeição espiritual, assim também Radharani é o emblema mais elevado dessa potência de prazer espiritual pela qual Krishna fica satisfeito. Porque Krishna é ilimitado, a fim de satisfazê-Lo Radharani também é ilimitada. Krishna fica satisfeito simplesmente por ver Radharani, mas Radharani Se expande de tal forma que Krishna deseja desfrutá-La mais e mais. Porque Krishna era incapaz de estimar a potência de prazer de Radharani, Ele decidiu aceitar o papel de Radharani, e essa combinação é Sri Chaitanya Mahaprabhu.

Ramananda Raya então começou a explicar Radharani como o emblema supremo da potência de prazer de Krishna. Radharani Se expande em diferentes formas, conhecidas como Lalita, Vishaka e Suas outras associadas confidenciais. No seu livro Ujjvala-nilamani, Rupa Goswami explica as características de Srimati Radharani. Ele destaca que o corpo de Radharani é em si uma evolução real do prazer transcendental. Esse corpo é decorado com flores e aromas fragrantes e é completo com amor transcendental por Krishna. Assim é a personificação de Sua potência de prazer. Esse corpo transcendental toma banho três vezes: primeiro na água da misericórdia, segundo na água da beleza jovem, e terceiro na água do brilho juvenil. Depois de tomar três banhos dessa forma, Seu corpo é coberto com roupas brilhantes e decorado com a beleza pessoal de Krishna, que é comparada a cosméticos. Assim Seu corpo constitui a arte mais elevada. Seu corpo está decorado com os ornamentos do êxtase espiritual - lágrimas trêmulas, petrificação, transpiração, choque, cessação de todas funções corpóreas devido ao prazer transcendental, tropeço, pressão sangüínea alta e loucura.

A potência de prazer transcendental decorativa manifesta nove sintomas. Cinco desses são manifestados pela expansão de Sua beleza pessoal, que é adornada com colares de flores. Sua calma paciente é comparada com uma coberta de lençóis que foram lavados com cânfora. Sua agonia confidencial por Krishna é o nó em Seu cabelo, e a marca de tilaka na Sua testa é Sua fortuna. O sentido da audição de Radharani está eternamente fixo no nome e fama de Krishna. Os lábios ficam vermelhos quando se masca noz de bétel. Similarmente, as bordas dos olhos de Radharani são escurecidas devido ao Seu completo apego por Krishna. Esse tom escuro pode ser comparado a uma pomada usada pela natureza quando a natureza brinca com Radha e Krishna. O sorriso de Radharani é justamente igual o sabor da cânfora. O colar de flores da separação move no corpo Dela e Ela deita na cama do orgulho dentro do quarto do aroma. Pela afeição extática por Krishna, Seu seio é coberto pela blusa da raiva. Com a reputação de ser a melhor das namoradas de Krishna, Ela toca um instrumento de cordas. Quando Krishna está em pé na Sua postura juvenil, Ela põe Sua mão no ombro Dele. Embora Ela possua tantas qualidades transcendentais, Ela está sempre dedicada no serviço de Krishna.

Srimati Radharani é decorada com emoções suddipta-sattvika, que às vezes inclui tribulação e às vezes pacificação. Todos os êxtases transcendentais são manifestados no corpo de Srimati Radharani. Emoções suddipta-sattvika são manifestadas quando um amante está dominado por certos sentimentos que ele ou ela não pode impedir. Radharani tem outra emoção chamada kilakincita, que é manifestada em vinte modos diferentes. Essas emoções são manifestadas parcialmente devido ao corpo, mente e hábito. No que diz respeito às emoções corpóreas, elas são manifestadas em postura e movimento. No que diz respeito às emoções da mente, elas são manifestadas como beleza, brilho, tonalidade, sabor, fala, magnanimidade e paciência. No que diz respeito às emoções habituais, elas são manifestadas como passatempos, desfrute, preparação e esquecimento.

A tilaka da fortuna está na testa de Srimati Radharani, e Ela também tem um medalhão de prema-vaicittya, prema-vaicittya é manifestada quando um amante e amada se encontram e temem separação.

Srimati Radharani é quinze dias mais nova que Krishna. Ela sempre mantém Sua mão nos ombros de Suas amigas, e Ela sempre fala e pensa nos passatempos com Krishna. Ela sempre oferece a Krishna um tipo de intoxicação por Suas falas doces, e Ela está sempre preparada para satisfazer os desejos Dele. Em outras palavras, Ela supre todas demandas de Sri Krishna, e Ela possui qualidades únicas e incomuns para a satisfação de Krishna.

No Govinda-lilamrita há um verso que afirma: "Quem é o campo fértil para a afeição de Krishna? A resposta é que é somente Srimati Radhika. Qual o objeto mais amado por Krishna? A resposta é que é somente Srimati Radhika e ninguém mais". Lustre no cabelo, umidade nos olhos e firmeza nos seios são todas qualidades presentes em Srimati Radhika. Somente Srimati Radhika é capaz de satisfazer todos os desejos de Krishna. Ninguém mais pode fazer isso.

Satyabhama é outra competidora de Krishna, mas ela sempre deseja chegar ao padrão de Srimati Radharani. Radharani é tão especialista em todos os assuntos que todas as donzelas de Vraja aprenderam artes Dela. Ela é tão extraordinariamente bela que mesmo a deusa da fortuna e Parvati, a esposa do Senhor Shiva, desejam elevação para Seu padrão de beleza. Arundhati, que é conhecida como a dama mais casta do universo, deseja aprender o padrão da castidade de Srimati Radharani. Porque mesmo o Senhor Krishna não pode estimar as qualidades transcendentais altamente elevadas de Radharani, não é possível para um ser humano ordinário estimá-las.

Depois de ouvir Ramananda Raya falar das qualidades de Radha Krishna, o Senhor Chaitanya desejou ouvir dele sobre a reciprocidade do amor entre Eles. Ramananda Raya descreveu Krishna como dhira-lalita, uma palavra que descreve uma pessoa que é muito hábil e jovial, que é perito em brincadeiras, que é sem ansiedade e que é sempre subserviente à sua namorada. Krishna está sempre entretido em casos amorosos com Radharani, e Ele entra nos bosques de Vrindavana para desfrutar atividades luxuriosas com Ela. Assim Ele realiza bem sucedido Seus instintos luxuriosos. No Bhakti-rasamrita-sindhu está afirmado: "Com Suas falas despudoradas e ousadas sobre intercurso sexual, Krishna obrigou Radharani a fechar os Seus olhos, aproveitou-Se disso, e Krishna pintou vários quadros nos seios Dela. Esses quadros serviram como assunto para as amigas de Radharani fazerem piadas sobre Ela. Assim Krishna está sempre entretido em atividades luxuriosas, assim Ele tornou Sua vida juvenil bem sucedida".

Depois de ouvir sobre essas atividades transcendentais, o Senhor Chaitanya disse, "Meu querido Ramananda, o que você explicou sobre os passatempos de Sri Radha e Krishna é perfeitamente correto, ainda assim existe algo mais que Eu gostaria de ouvir de Você".

"É muito difícil para mim expressar qualquer coisa além disso", Ramananda Raya respondeu. "Eu só posso dizer que existe uma atividade emocional chamada prema-vilasa-vivarta, que eu posso tentar explicar mas não sei se Você ficará feliz em ouvir isso". Em prema-vilasa existem dois tipos de atividades emocionais - separação e encontro. Essa separação transcendental é tão aguda que é na realidade mais extática do que encontro. Ramananda Raya era perito em entender esses relacionamentos altamente elevados entre Radha e Krishna, e ele compôs uma bela canção a qual narrou para o Senhor. O significado da canção é que o amante e a amada, antes de se encontrarem, geram um tipo de emoção pelo intercâmbio de suas atividades transcendentais. Essa emoção é chamada raga, ou atração. Srimati Radharani expressou Sua disposição para que "essa atração e afeição entre Nós cresça até a extensão mais alta", mas a causa dessa atração é Radharani Ela mesma. "Qualquer que seja a causa", Radharani disse, "essa afeição entre Você e Eu nos misturou em unidade. Agora é a hora da separação, Eu não posso ver a história da evolução deste amor. Não houve causa ou meditação em Nosso amor, salvo Nosso encontro em si e o intercâmbio visionário de sentimentos".

Esse intercâmbio de sentimentos entre Krishna e Radharani é muito difícil de entender a menos que a pessoa se eleve para a plataforma da bondade pura. Tal reciprocidade transcendental não é nem mesmo possível de ser entendida da plataforma da bondade material. A pessoa tem que realmente transcender bondade material a fim de entender. Isso é porque o intercâmbio de sentimentos entre Radha e Krishna não é um assunto deste mundo material. Mesmo o maior especulador mental não pode entender isso, diretamente ou indiretamente. Atividades materiais são manifestadas tanto pelo corpo grosseiro ou a mente sutil, mas esse intercâmbio de sentimentos entre Radha e Krishna está além dessas manifestações e além da especulação mental intelectual. Só pode ser entendida pelos sentidos purificados livres de todas as designações do mundo material. Aqueles que têm sentidos purificados podem entender essas características e intercâmbios transcendentais, mas aqueles que são impersonalistas e que não têm conhecimento sobre os sentidos espirituais só podem discriminar dentro do escopo dos sentidos materiais e por isso não podem entender intercâmbios espirituais ou atividades sensuais-espirituais. Aqueles que são elevados em virtude do conhecimento experimental só podem satisfazer seus sentidos materiais cegos tanto com atividades do corpo grosseiro ou por especulação mental. Tudo gerado pelo corpo ou a mente é sempre imperfeito e perecível, mas atividades espirituais são sempre brilhantes e maravilhosas. Amor puro na plataforma transcendental é o paradigma da pureza desprovida de afeição material e completamente espiritual. Afeição por matéria é perecível, como indicado pela embriaguez do sexo no mundo material, mas não existe tal embriaguez no mundo espiritual. Obstáculos no caminho da satisfação sensual causam sofrimento material, mas não se pode comparar isso com separação espiritual. Na separação espiritual não existe embriaguez nem ineficácia, como se encontra na separação material.

O Senhor Chaitanya admitiu que isso é a posição mais elevada de reciprocidade amorosa transcendental, e Ele disse a Ramananda Raya, "Por sua graça somente Eu fui capaz de entender uma posição transcendental tão elevada. Essa posição não pode ser atingida sem a realização de atividades transcendentais. Por isso gentilmente Me explique como posso Me elevar para essa plataforma"?

"É similarmente difícil para mim fazê-Lo entender", Ramananda respondeu. "No que diz respeito a mim, eu só posso falar aquilo que Você deseja que eu fale. Ninguém pode escapar de Sua vontade suprema. De fato, não existe ninguém no mundo que pode superar Sua vontade suprema, e embora pareça que eu estou falando, eu não sou o orador na realidade. Você que fala. Portanto Você é ambos o orador e a audiência. Assim deixe-me falar somente como Você deseja que eu fale sobre a realização requerida para alcançar a posição transcendental mais elevada".

Ramananda Raya então começou a relatar as atividades transcendentais de Radha e Krishna. Essas atividades não podem ser entendidas no relacionamento emocional com o Supremo Senhor como senhor e servo, amigo e amigo ou materno paterno e filho. Esse assunto confidencial só pode ser entendido na associação das donzelas de Vraja, porque as atividades confidenciais surgiram dos sentimentos e emoções dessas donzelas. Sem a associação das donzelas de Vraja, ninguém pode nutrir ou estimar tal entendimento transcendental. Em outras palavras, esses passatempos confidenciais de Radha e Krishna se expandiram pela misericórdia das donzelas. Sem a misericórdia delas, eles não podem ser entendidos. Deve-se seguir os passos das donzelas de Vraja a fim de entender.

Quando alguém está realmente situado nesse entendimento, torna-se elegível para entrar nos passatempos confidenciais de Radha e Krishna. Não existe alternativa para entender Seus passatempos confidenciais. Isso é confirmado no Govinda-lilamrita (10.17): "Embora manifestados, felizes, expandidos e ilimitados, os intercâmbios emocionais entre Radha e Krishna só podem ser entendidos pelas donzelas de Vraja ou por seus seguidores". Justamente como ninguém pode entender a expansão da energia espiritual do Supremo Senhor sem Sua misericórdia sem causa, ninguém pode entender a vida sexual transcendental entre Radha e Krishna sem seguir os passos das donzelas de Vraja. As associadas pessoais de Radharani são chamadas sakhis, e Suas assistentes íntimas são chamadas mañjaris. É muito difícil expressar o comportamento delas com Krishna porque elas não têm desejo de se misturar com Krishna ou de desfrutá-Lo pessoalmente. Ao invés, elas estão sempre prontas para ajudar Radharani Se associar com Krishna. A afeição delas por Krishna e Radharani é tão pura que elas ficam satisfeitas simplesmente quando Radha e Krishna estão juntos. De fato, seu prazer transcendental é em ver Radha e Krishna unidos. A forma real de Radharani é justamente igual um arbusto que abraça a árvore de Krishna, e as donzelas de Vraja, as associadas de Radharani, são justamente iguais às folhas e flores desse arbusto. Quando um arbusto abraça uma árvore, as folhas e flores e também o arbusto automaticamente a abraçam. O Govinda-lilamrita (10.16) confirma que Radharani é a expansão da potência de prazer de Krishna e é comparada a um arbusto, e Suas associadas, as donzelas de Vraja, são comparadas a flores e folhas desse arbusto. Quando Radharani e Krishna desfrutam Eles mesmos, as donzelas de Vraja saboreiam o prazer mais do que a Própria Radharani.

Embora as associadas de Radharani não esperem nenhuma atenção pessoal de Krishna, Radharani fica tão satisfeita com elas que Ela arranja encontros individuais entre Krishna e as donzelas de Vraja. De fato, Radharani tenta combinar ou unir Suas associadas com Krishna com muitas manobras transcendentais, e Ela tem mais prazer nesses encontros do que em Seus próprios encontros com Ele. Quando Krishna vê que tanto Radharani quanto Suas associadas estão satisfeitas pela Sua associação, Ele fica mais satisfeito. Tal associação e reciprocidade amorosa não têm nada a ver com luxúria material, embora pareça com a união material entre homem e mulher. É somente porque essa similaridade existe que essa reciprocidade às vezes é chamada, em linguagem transcendental, luxúria transcendental. Como explicado no Gautamiya-tantra (Bhakti-rasamrita-sindhu 1.2.285): "Luxúria significa apego pela própria satisfação sensual. No que diz respeito a Radharani e Suas associadas, elas não desejam satisfação sensual pessoal. Elas só querem satisfazer Krishna". Isso é mais explicado no Srimad Bhagavatam (10.31.19) em uma das falas das gopis:

yat te sujata-caranamburuham stanesu
bhitah sanaih priya dadhimahi karkasesu
tenatavim atasi tad vyathate na kim svit
kurpadibhir bhramati dhir bhavad-ayusam nah

"Meu querido Krishna, agora Você está andando na floresta com Seus pés descalços, que Você às vezes põe em nossos seios. Quando Seus pés estão em nossos seios, nós pensamos que nossos seios são muito duros para Seus pés macios. Agora Você passeia pela floresta e anda sobre pedras, e nós não sabemos como Você Se sente. Porque Você é nossa vida e alma, o desgosto que Você se submete em andar sobre pedras duras nos causa muita aflição". Esses sentimentos expressados pelas donzelas de Vraja constituem as emoções da Consciência de Krishna mais elevadas. Qualquer um que realmente se torna cativado pela Consciência de Krishna aprova esse nível das gopis. Existem sessenta e quatro categorias de serviço devocional por cuja realização pode-se elevar para o estágio das gopis de devoção incondicional. Afeição por Krishna no nível das gopis se chama raganuga, amor espontâneo. Quando alguém entra num caso amoroso espontâneo com Krishna, não há necessidade de seguir regras e regulamentos Védicos.

Existem vários tipos de devotos pessoais do Senhor Krishna na morada transcendental. Por exemplo, existem servos de Krishna tais quais Raktaka e Patraka e amigos de Krishna tais quais Sridama e Sudama. Há também os pais de Krishna, tais quais Nanda e Yashoda, que também estão dedicados no serviço de Krishna de acordo com suas respectivas emoções transcendentais. Aquele que deseja entrar dentro da morada suprema de Krishna pode se abrigar em um desses servidores transcendentais. Então, por meio da execução do serviço amoroso, pode-se atingir afeição transcendental por Krishna. Em outras palavras, o devoto dentro deste mundo material que executa serviço amoroso em seguimento das atividades desses associados eternos com Krishna também atinge o mesmo posto quando for perfeito.

Os sábios mencionados nos Upanishads e no sruti também desejam o posto das gopis, e eles também seguem os passos das gopis a fim de atingir o objetivo da vida mais elevado. Isso é confirmado no Srimad Bhagavatam (10.87.23) onde está dito que os sábios praticam pranayama (transe) por controlar o processo respiratório, mente e sentidos por meio da prática do yoga místico. Assim eles tentam imergir dentro do Brahman Supremo. Esse mesmo objetivo é atingido por ateístas que negam a existência de Deus. Se esses ateístas forem mortos por uma encarnação da Suprema Personalidade de Deus, eles também imergem dentro da existência Brahman do Supremo Senhor. Todavia, quando as donzelas de Vrindavana adoram Sri Krishna, é como se elas foram picadas por uma serpente, porque o corpo de Krishna é comparado ao corpo de uma serpente. Um corpo de serpente nunca é reto; é sempre ondulado. Similarmente, Krishna muitas vezes fica em pé numa postura curvada em três, e Ele picou as gopis com amor transcendental. As gopis com certeza estão mais bem situadas que todos yogis místicos e outros que desejam imergir no Brahman Supremo. Os sábios de Dandakaranya também seguem os passos das donzelas de Vraja a fim de atingirem uma posição similar. Não se pode atingir essa posição simplesmente por seguir princípios reguladores. Ao invés, deve-se seguir seriamente os princípios das gopis. Isso é confirmado no Srimad Bhagavatam (10.9.21) onde está afirmado que o Senhor Sri Krishna, o filho de Srimati Yashoda, não é facilmente disponível para aqueles que seguem os princípios da especulação mental mas é facilmente disponível para todos os tipos de seres vivos que seguem o caminho do serviço devocional.

Existem muitos pseudo-devotos, que alegam pertencer à seita de Sri Chaitanya Mahaprabhu, e que artificialmente se vestem como as donzelas de Vraja, e isso não é aprovado por espiritualistas avançados ou estudantes avançados do serviço devocional. Essas pessoas vestem o corpo material externo porque confundem estupidamente o corpo com a alma. Eles estão enganados quando pensam que os corpos espirituais de Krishna, Radharani e Suas associadas, donzelas de Vraja, são compostos de natureza material. Deve-se saber perfeitamente bem que essas manifestações são expansões da bem-aventurança e conhecimento eternos no mundo transcendental. Elas não têm nada a ver com estes corpos, assim os corpos, roupas, decorações e atividades das donzelas de Vrindavana não são desta manifestação cósmica. As donzelas de Vrindavana não são um sujeito para a atração daqueles dentro do mundo material; elas são atrações transcendentais para o todo-atrativo Krishna. Porque o Senhor é todo-atrativo, Ele é chamado Krishna, mas as donzelas de Vrindavana são atraentes até mesmo para Krishna. Portanto elas não são deste mundo material.

Se alguém pensar erroneamente que o corpo material é tão perfeito quanto o corpo espiritual e começar a imitar as donzelas de Vrindavana, ele ficará infestado com a filosofia impersonalista Mayavadi. Os impersonalistas recomendam um processo de aham grahopasana pelo qual a pessoa adora o seu próprio corpo como o Supremo. Por pensar dessa forma, esses pseudo-transcendentalistas se vestem igual às donzelas de Vraja. Essas atividades não são aceitáveis no serviço devocional. Mesmo Srila Jiva Goswami, o acarya que é a maior autoridade no Gaudiya sampradaya, condenou esses imitadores. O processo da realização transcendental é seguir os passos dos associados do Supremo Senhor; por isso se alguém se acha um dos associados do Supremo Senhor, está condenado. De acordo com os princípios Vaishnava autorizados, deve-se seguir um devoto particular, e não pensar em si mesmo como associado de Krishna.

Desse modo Ramananda Raya explicou que se deve aceitar o ânimo das donzelas de Vraja. No Chaitanya Charitamrita é dito claramente que se deve aceitar as atividades emocionais e não imitar a roupa dos associados de Krishna. Também se deve meditar sempre nos romances entre Radha e Krishna no mundo transcendental. Deve-se pensar em Radha e Krishna vinte e quatro horas por dia e se dedicar eternamente no serviço Deles. Não é preciso mudar sua roupa externamente. Por seguir o humor das associadas e amigas de Radharani, pode-se ultimamente alcançar o estágio de perfeição e ser transferido a Goloka Vrindavana, a morada transcendental de Krishna.

O ânimo da perseguição emocional das gopis é chamado siddha-deha. Essa palavra indica o corpo espiritual puro que está além dos sentidos, mente e inteligência. Siddha-deha é a alma purificada que é justamente capaz de servir o Supremo Senhor. Ninguém pode servir o Supremo Senhor como Seu associado sem estar situado na sua identidade espiritual pura. Essa identidade é completamente livre de toda contaminação material. Como está afirmado no Bhagavad-gita, uma pessoa contaminada materialmente transmigra para outro corpo pela consciência material. Na hora da morte ela pensa materialmente e é assim transferida para dentro de outro corpo material. Similarmente, quando a pessoa está situada na sua identidade espiritual pura e pensa no serviço amoroso espiritual prestado ao Supremo Senhor, ela é transferida para o reino espiritual para entrar na associação de Krishna. Em outras palavras, por alcançar sua própria identidade espiritual e pensar nos associados de Krishna, a pessoa fica qualificada para se transferir para o reino espiritual. Ninguém pode contemplar ou pensar nas atividades do reino espiritual sem estar situado em sua identidade espiritual pura (siddha). Assim Ramananda Raya disse que sem atingir siddha-deha, ninguém pode nem se tornar uma associada das donzelas nem prestar serviço diretamente para a Personalidade de Deus, Krishna, e Sua consorte eterna Radharani. A esse respeito, Ramananda citou Srimad Bhagavatam (10.47.60):

nayam sriyo 'nga u nitantarateh prasadah
svar-yositam nalina-gandha-rucam kuto 'nyah
rasotsave 'sya bhujadanda-grhita-kantha-
labdhasisam ya udagad vraja-vallavinam

"Nem a deusa da fortuna, Lakshmi, nem mesmo as donzelas do reino celestial podem atingir as facilidades das donzelas de Vrajabhumi - e o que dizer de outras".

O Senhor Chaitanya ficou muito satisfeito por ouvir essas declarações de Ramananda Raya, e Ele o abraçou. Então os dois começaram a chorar no êxtase da realização transcendental. Assim o Senhor e Ramananda Raya discutiram os passatempos transcendentais de Radha e Krishna a noite inteira, e na manhã eles se separaram. Ramananda foi para sua casa, e o Senhor foi tomar Seu banho.

Na hora da separação, Ramananda caiu aos pés do Senhor Chaitanya e orou: "Meu querido Senhor, Você veio justamente para me libertar deste lamaçal de ignorância. Por isso eu peço a Você que fique aqui por pelo menos mais dez dias para purificar minha mente desta contaminação material. Não existe ninguém mais que possa entregar tal amor transcendental de Deus".

"Eu vim para Me purificar por ouvir de você os passatempos transcendentais de Radha e Krishna", o Senhor respondeu. "Eu sou muito afortunado, porque você é o único professor desses passatempos transcendentais. Eu não consigo encontrar ninguém mais no mundo que pode realizar a reciprocidade amorosa transcendental entre Radha e Krishna. Você Me pediu para ficar aqui por mais dez dias, mas Eu acho que quero ficar com você o resto da Minha vida. Por favor venha para Jagannatha Puri, Meu quartel general, e nós ficaremos juntos o resto de nossas vidas. Assim Eu posso passar Meus dias restantes no entendimento de Radha e Krishna por sua associação".

Sriman Ramananda Raya veio novamente ver o Senhor na próxima noite, e aconteceram mais discursos sobre esse assunto transcendental.

"Qual é o mais alto padrão de educação"? O Senhor Chaitanya começou Seu questionário, e Ramananda Raya imediatamente respondeu que o mais alto padrão de educação é conhecimento da ciência de Krishna. O padrão da educação material é satisfação sensual, mas o mais alto padrão de educação espiritual é conhecimento da ciência de Krishna. No Srimad Bhagavatam (4.29.50) está afirmado que o trabalho que satisfaz a Suprema Personalidade de Deus é o trabalho mais elevado, e aquela ciência ou conhecimento que coloca a pessoa em Consciência de Krishna plena é o conhecimento mais elevado. Similarmente, Prahlada Maharaja, enquanto instruía seus colegas na escola, também afirmou que ouvir do Senhor, cantar, lembrar, adorar, louvar, servir, fazer amizade com Krishna, e oferecer tudo para Ele constitui o conhecimento espiritual mais elevado.

"E qual a mais grandiosa reputação que alguém pode ter"? O Senhor Chaitanya perguntou a Ramananda Raya, e Ramananda respondeu imediatamente que uma pessoa que tem a reputação de ser consciente de Krishna é o ser humano mais famoso do mundo.

     

      

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

 

"Ensinamentos do Senhor Chaitanya"
(Original Sem "Correções")
de
Sua Divina Graça
Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Prabhupada
Paramahamsa Thakura Mahashaya
(2ª Impressão de 1975 - 1ª Edição 1968)

Capítulo Trinta e Dois

Conclusão

Aquele que é famoso como uma pessoa consciente de Krishna desfruta fama eterna. No mundo material, todos se esforçam por três coisas: ele quer que seu nome seja perpetuado, ele quer que sua fama seja propagada por todo o mundo, e ele quer algum lucro de suas atividades materiais. Mas ninguém sabe que todo esse nome, fama e lucro pertencem ao corpo material temporário e logo que o corpo é finalizado, todo nome, fama e lucro são finalizados também. É somente devido à ignorância que todos se esforçam por nome, fama e lucro que estão conectados com o corpo. É deplorável ficar famoso com base no corpo ou ficar conhecido como uma pessoa de consciência espiritualmente desenvolvida sem conhecer o espírito supremo, Vishnu. Fama real só pode ser obtida se a pessoa alcançar Consciência de Krishna.

De acordo com o Srimad Bhagavatam, existem doze autoridades, e todos eles são famosos porque são grandes devotos do Senhor. Essas autoridades são Brahma, Narada, Senhor Shiva, Manu, Kapila, Prahlada, Janaka, Bhisma, Shukadeva Goswami, Bali, Yamaraja e os Kumaras. Essas personalidades ainda são lembradas porque todos são grandes devotos elevados do Senhor. No Garuda Purana é dito ser mais raro ser um devoto famoso do Supremo Senhor na era de Kali do que ser um semideus tais quais Brahma e Senhor Shiva. A respeito das conversas entre Narada e Pundarika, Yudhisthira disse, "Ele é o mais famoso e pode libertar todos os outros aquele que, depois de muitos, muitos nascimentos, vem a entender que é servo de Vasudeva". similarmente no Bhagavad-gita (7.19) Krishna diz para Arjuna:

bahunam janmanam ante
jnanavan mam prapadyate
vasudevah sarvam iti
sa mahatma su-durlabhah

"Depois de muitos nascimentos e mortes, aquele que está realmente em conhecimento se rende a Mim, pois sabe que Eu sou a causa de todas as causas e de tudo que existe. Tal grande alma é muito rara". No Adi Purana está dito que liberação e vida transcendental seguem todos os devotos de Deus. No Brihan-naradiya Purana está afirmado que mesmo personalidades como Brahma e outros semideuses não conhecem o valor de um devoto da Suprema Personalidade de Deus. O Garuda Purana destaca que entre muitos milhares de brahmanas, algum pode ser perito em executar sacrifícios, e entre milhares desses brahmanas peritos, um brahmana pode ser perito no conhecimento do Vedanta-sutra, e entre muitos, muitos milhares de tais Vedantistas, pode ser que haja uma pessoa que é famosa como um devoto do Senhor Vishnu. Existem muitos devotos do Senhor Vishnu, e entre eles, aquele que é inabalável em sua devoção é elegível para entrar no reino de Deus. No Srimad Bhagavatam (3.13.4) também está afirmado que existem muitos estudantes dos Vedas, mas aquele que constantemente pensa na Suprema Personalidade de Deus dentro de seu coração é o melhor estudante de todos. Nas preces do Narayana-vyuha-stava está dito que mesmo se o grande Brahma não for um devoto do Senhor, ele é o mais insignificante, enquanto se um micróbio for um devoto do Senhor, ele é o mais famoso.

O Senhor Chaitanya em seguida perguntou a Ramananda Raya, "Qual é a coisa mais valiosa no mundo"? Ramananda Raya respondeu aquele que tem amor por Radha-Krishna possui a jóia mais preciosa e a riqueza mais grandiosa. Aquele que é apegado a satisfação sensual material ou riqueza material não é realmente considerado rico. Quando alguém chega à plataforma espiritual ou Consciência de Krishna, pode entender que não existe riqueza mais valiosa do que o amor por Radha-Krishna. Está registrado no Srimad Bhagavatam que Maharaja Dhruva procurou o Supremo Senhor porque ele queria obter alguma terra, mas quando ele viu Krishna finalmente, ele disse, "Eu estou tão satisfeito, eu não quero nada". No Bhagavad-gita também está afirmado que se alguém se abrigar na Suprema Personalidade de Deus ou estar elevado no estado supremo do amor do Supremo, não tem nada mais a aspirar. Embora esses devotos possam obter qualquer coisa que desejarem do Senhor, eles não pedem nada a Ele.

Quando o Senhor Chaitanya perguntou a Ramananda Raya qual é considerada a mais dolorosa existência, Ramananda Raya respondeu que separação de um devoto puro constitui a existência mais dolorosa. Em outras palavras, quando não existe nenhum devoto do Senhor presente, há um grande sofrimento na sociedade, e associação com outras pessoas se torna dolorosa. No Srimad Bhagavatam (3.30.7) está afirmado que se alguém que fica desprovido da associação de um devoto puro tenta ser feliz através de sociedade, amizade e amor desprovidos de Consciência de Krishna, deve ser considerado na condição mais sofredora. No Quinto Canto do Brihad-bhagavatamrita (5.44) está afirmado que a associação de um devoto puro é mais desejável do que a própria vida em si e que em separação dele não se pode nem mesmo passar um segundo felizmente.

O Senhor Chaitanya então perguntou a Ramananda Raya, "Entre muitas assim chamadas almas liberadas, quem é realmente liberada"? Ramananda respondeu aquela que está realmente completamente saturada com amor devocional por Radha e Krishna deve ser considerada a melhor de todas pessoas liberadas. Está afirmado no Srimad Bhagavatam (6.14.4) que um devoto de Narayana é tão raro que só se pode encontrá-lo entre milhões e milhões de pessoas.

"E de todas canções, qual canção você acha que é a melhor de todas"? Chaitanya Mahaprabhu perguntou. E Ramananda respondeu que qualquer canção que descreve os passatempos de Radha e Krishna é a melhor canção. Na vida condicionada, a alma é cativada por sexo. Todas ficções - dramas e novelas - e canções materiais descrevem amor entre homem e mulher. Porque as pessoas são tão atraídas a esse tipo de literatura, Krishna apareceu neste mundo material e exibiu romances amorosos transcendentais com as gopis. Existe uma literatura imensa que trata das transações entre as gopis e Krishna, e qualquer um que se abriga nesta literatura ou as histórias sobre Radha e Krishna pode desfrutar verdadeira felicidade. No Srimad Bhagavatam (10.33.36) é dito que o Senhor exibiu Seus passatempos em Vrindavana a fim de revelar Sua vida real. Qualquer pessoa inteligente que tenta entender os passatempos de Radha e Krishna é a mais afortunada. As canções que contam esses passatempos são as mais grandiosas canções no mundo.

O Senhor Chaitanya então inquiriu: "Qual a coisa mais lucrativa no mundo, a essência de todos eventos lucrativos"? Ramananda Raya respondeu que não existe nada mais lucrativo do que a associação de devotos puros.

"E o que você recomenda para uma pessoa pensar em"? O Senhor Chaitanya perguntou. Ramananda respondeu que se deve sempre pensar nos passatempos de Krishna. Isso é Consciência de Krishna. Krishna tem atividades múltiplas, e elas são descritas em muitas escrituras Védicas. Deve-se sempre pensar nesses passatempos, essa é a melhor meditação e o êxtase mais elevado. No Srimad Bhagavatam (2.2.36) Shukadeva Goswami confirma que se deve sempre pensar na Suprema Personalidade de Deus - não somente pensar Nele, mas se deve também ouvir e cantar Seu nome, fama e glórias.

"E qual é o melhor tipo de meditação"? O Senhor Chaitanya inquiriu.

"Aquele que medita nos pés de lótus de Radha e Krishna é o melhor meditador", Ramananda Raya respondeu. Isso também está confirmado no Srimad Bhagavatam (1.2.14): "É a Suprema Personalidade de Deus somente que é o mestre de todos devotos, cujo nome se deve sempre cantar e que deve ser sempre meditado e adorado regularmente".

"Onde deve uma pessoa viver, por abandonar todos outros prazeres"? O Senhor Chaitanya inquiriu depois. Ramananda respondeu que se deve abandonar todos outros prazeres e deve viver em Vrindavana onde o Senhor Krishna teve tantos passatempos. No Srimad Bhagavatam (10.47.61) Uddhava diz que é melhor viver em Vrindavana mesmo se tiver que viver como uma planta ou arbusto. Foi em Vrindavana que o Supremo Senhor viveu e foi lá que as gopis adoraram o Supremo Senhor, o objetivo último de todo conhecimento Védico.

"E qual o melhor assunto para ouvir"? Chaitanya Mahaprabhu perguntou em seguida.

"Os passatempos de Radha e Krishna", Ramananda Raya respondeu. Na realidade quando os passatempos de Radha e Krishna são ouvidos da fonte certa, a pessoa imediatamente alcança liberação. Infelizmente às vezes acontece que pessoas não ouvem esses passatempos de uma pessoa que é uma alma auto-realizada. Assim pessoas às vezes são mal orientadas. É dito no Srimad Bhagavatam (10.33.39) aquele que ouve os passatempos de Krishna com as gopis alcançará a plataforma mais elevada do serviço devocional e ficará livre da luxúria material a qual oprime o coração de todos no mundo material. Em outras palavras, por ouvir os passatempos de Radha e Krishna, a pessoa pode se livrar de toda luxúria material. Se a pessoa não se tornar livre da luxúria material desse modo, então não deve se empenhar em ouvir os passatempos de Radha e Krishna. A menos que a pessoa ouça da fonte certa, ela interpretará errado os passatempos de Radha e Krishna, por considerá-los casos ordinários entre homem e mulher. Desse modo a pessoa pode ser desviada.

"E quem é a Deidade mais adorável"? Chaitanya Mahaprabhu perguntou em seguida. Ramananda Raya imediatamente respondeu que o casal transcendental, Sri Radha e Krishna, é o objeto último de adoração. Existem muitos objetos de adoração - os impersonalistas adoram o brahmajyoti, por exemplo - mas por adorar outros objetos que não são Radha e Krishna, a pessoa fica desprovida dos sintomas de vida e se torna justamente igual uma árvore ou outra entidade não móvel. Aqueles que adoram o assim chamado vazio também alcançam esses resultados. Aqueles que estão atrás de desfrute material (bhukti) adoram os semideuses e alcançam os planetas deles e assim desfrutam felicidade material. O Senhor Chaitanya depois perguntou sobre aqueles que estão atrás da felicidade material e liberação do cativeiro material. "Para onde eles vão ultimamente"? Ele perguntou. Ramananda Raya respondeu que ultimamente alguns viram árvores e outros atingem os planetas celestiais onde desfrutam felicidade material.

Ramananda Raya continuou para dizer aqueles que não têm gosto pela Consciência de Krishna ou vida espiritual são justamente iguais corvos que sentem prazer em comer a fruta amarga nimba. É o cuco poético que come as sementes da manga. Os transcendentalistas desafortunados simplesmente especulam sobre filosofia seca, enquanto os transcendentalistas que estão em amor com Radha e Krishna desfrutam a fruta justamente igual o cuco. Assim aqueles que são devotos de Radha e Krishna são os mais afortunados. A fruta nimba amarga não é nenhum pouco comestível; é simplesmente cheia de especulação seca e é adequada somente a filósofos do tipo corvo. Sementes de manga, todavia, são muito saborosas, e aqueles no serviço devocional de Radha e Krishna as desfrutam.

Assim Ramananda Raya e Chaitanya Mahaprabhu conversaram a noite inteira. Algumas vezes eles dançavam, algumas vezes cantavam e algumas vezes choravam. Depois de passar a noite dessa forma, na alvorada Ramananda Raya retornou para sua casa. Na noite seguinte ele retornou para ver Chaitanya Mahaprabhu. Depois de discutirem Krishna por algum tempo, Ramananda Raya caiu aos pés do Senhor e disse, "Meu querido Senhor, Você é tão bondoso comigo que Você me falou sobre a ciência de Krishna e Radharani e Seus romances amorosos, os casos da dança rasa e Seus passatempos. Eu nunca pensei que eu fosse capaz de falar sobre esse assunto. Você me ensinou como Você ensinou antigamente os Vedas para Brahma".

Esse é o sistema de receber instruções da Superalma. Externamente Ele não é para ser visto, mas internamente Ele fala com o devoto. Isso é confirmado no Bhagavad-gita - o Senhor dita internamente para aquele que está sinceramente dedicado em Seu serviço, e o Senhor age de tal forma que essa pessoa pode ultimamente atingir o objetivo supremo da vida. Quando Brahma nasceu, não havia ninguém para instruí-lo; por isso o Senhor em Pessoa instruiu Brahma no conhecimento Védico através do coração de Brahma. No Srimad Bhagavatam (2.4.22) Shukadeva Goswami confirma que o gayatri mantra foi primeiro transmitido dentro do coração de Brahma pelo Supremo. Shukadeva Goswami orou para o Senhor ajudá-lo a falar o Srimad Bhagavatam perante Maharaja Parikshit.

O primeiro verso do Primeiro Canto do Srimad Bhagavatam descreve a Verdade Absoluta Suprema como Aquele que instruiu Brahma através do coração. Vyasadeva, o autor do Srimad Bhagavatam, afirma: "Deixe-me oferecer minhas respeitosas reverências a Sri Krishna, a Suprema Personalidade de Deus, que é a causa da manifestação cósmica e sua manutenção e dissolução também". Se nós tentarmos entender minuciosamente a verdade suprema, podemos entender que Ele conhece tudo diretamente e indiretamente. Ele é a única Suprema Personalidade, e é somente Ele que é plenamente independente. Ele somente instruiu Brahma como a Superalma dentro dele. Mesmo os maiores intelectuais ficam confusos em tentar entender a verdade suprema porque a manifestação cósmica inteira perceptível está situada dentro Dele. Apesar desta manifestação material ser um subproduto de fogo, água e terra, mesmo assim parece ser real. Todavia, é dentro Dele somente que as manifestações espiritual e material e também os seres vivos repousam. Por isso Ele é a verdade suprema.

Ramananda Raya continuou a falar para o Senhor Chaitanya: "Primeiro eu O vi como um sannyasi, e depois eu O vi como um menino pastor de vacas. Eu vejo na frente de Você uma boneca de ouro, e devido à presença dela Sua tonalidade se tornou dourada. Mesmo assim eu vejo que Sua tonalidade é escura, como um menino pastor de vacas. Por favor me explique por que O vejo desse modo? Por favor me diga sem reserva".

"É a natureza de devotos altamente elevados verem Krishna em tudo", o Senhor Chaitanya respondeu. "Sempre que eles vêem qualquer coisa, eles não vêem a forma daquela coisa em particular. Eles vêem Krishna". Isso é confirmado no Srimad Bhagavatam (11.2.45):

sarva-bhutesu yah pasyed
bhagavad-bhavam atmanah
bhutani bhagavaty atmany
esa bhagavatottamah

"Aquele que é altamente elevado em serviço devocional vê a Superalma, Krishna, que é a Alma de todas as almas individuais". Uma passagem similar é encontrada no Décimo Canto (10.35.9) onde está afirmado que todos arbustos, plantas e árvores, carregadas de flores e frutas, estavam curvadas em êxtase de amor por Krishna, porque Krishna era a Alma de suas almas. Depois que Krishna as deixou, essas árvores e plantas se tornaram espinhosas.

"Você tem a concepção mais elevada dos passatempos de Radha e Krishna", o Senhor Chaitanya continuou. "Por isso que você vê Radha-Krishna em toda parte".

Ramananda Raya respondeu: "Eu peço que Você não tente Se esconder. Eu entendo que Você aceitou a tonalidade e ânimo de pensar de Srimati Radharani e que Você tenta entender Você mesmo do ponto de vista de Radharani. Você adveio realmente para tomar esse ponto de vista. Embora Você encarnou principalmente para entender Seu próprio eu, Você ao mesmo tempo distribui amor de Krishna para o mundo. Agora Você veio aqui pessoalmente para me libertar. Por favor não tente me enganar, eu imploro a Você. Isso não é bom para Você".

Por estar muito satisfeito, o Senhor Chaitanya sorriu e mostrou para Ramananda Sua forma real como a combinação de Sri Radha e Krishna. Assim o Senhor Chaitanya era Sri Krishna em Pessoa com as características externas de Srimati Radharani. Sua habilidade transcendental de Se tornar dois e depois Se tornar um novamente foi revelada para Ramananda Raya. Aqueles que são afortunados o bastante para entenderem o Senhor Chaitanya e assim também os passatempos de Vrindavana de Radha e Krishna podem ser capazes, pela misericórdia de Sri Rupa Goswami, de conhecer a identidade real de Sri Krishna Chaitanya Mahaprabhu.

Depois de ver essa característica única do Senhor Chaitanya, Ramananda Raya desmaiou e caiu no chão. O Senhor Chaitanya então tocou nele, e ele voltou a si. Ramananda Raya então ficou surpreso de ver o Senhor Chaitanya novamente em Sua roupa de mendigo. O Senhor Chaitanya o abraçou e o acalmou e o informou que ele foi o único que viu essa forma. "Porque você entendeu o propósito da Minha encarnação, você foi privilegiado por ter visto essa característica particular da Minha personalidade", o Senhor disse. "Meu querido Ramananda, Eu não sou uma pessoa diferente com uma bela tonalidade conhecido como Gaurapurusha. Eu sou o mesmo Krishna o filho de Maharaja Nanda, e devido ao contato com o corpo de Srimati Radharani agora Eu assumi esta forma. Srimati Radharani não toca em ninguém além de Krishna; por isso Ela Me influenciou com Sua tonalidade, mente e palavras. Desse modo Eu justamente tento entender o sabor transcendental do relacionamento Dela com Krishna".

O fato é que tanto Krishna quanto o Senhor Chaitanya são a Personalidade de Deus original. Ninguém deve tentar eliminar o Senhor Chaitanya de Sri Krishna. Em Sua forma de Sri Krishna, Ele é o desfrutador supremo, e na Sua forma do Senhor Chaitanya, Ele é o desfrutado supremo. Ninguém pode ser mais superexcelente atraente do que Sri Krishna, e além de Sri Krishna, ninguém pode desfrutar da forma suprema da devoção, Srimati Radharani. Além de Sri Krishna, todas as formas Vishnu carecem dessa habilidade. Isso é explicado na descrição de Govinda no Chaitanya Charitamrita. Lá está dito que Srimati Radharani é a única personalidade que pode inspirar Sri Krishna com prazer transcendental. Por isso Srimati Radharani é a principal donzela de Vrindavana em amor com Govinda, a Suprema Personalidade de Deus, Sri Krishna.

"Por favor descanse seguramente que Eu não tenho nada para esconder de você", o Senhor Chaitanya disse para Ramananda. "Mesmo se Eu tentar esconder de você, você é um devoto tão avançado que pode entender todos Meus segredos. Eu peço que você por favor mantenha isto como um segredo e não revele para ninguém. Se for revelado, todo mundo Me considerará como um homem louco. Os fatos que Eu revelei a você não podem ser entendidos por pessoas materialistas. Quando elas ouvirem isto simplesmente rirão de Mim. Você pode entender isto só você mesmo e guarde isto para você mesmo. Do ponto de vista materialista, um devoto se torna louco no seu êxtase de amor por Krishna. Tanto você quanto Eu somos justamente iguais homens loucos. Por isso faça o favor de não revelar estes fatos para pessoas ordinárias. Se você fizer isso, elas com certeza rirão de Mim".

O Senhor Chaitanya então passou dez noites com Ramananda Raya, apreciando a companhia dele e discutiram os passatempos de Radha e Krishna. As discussões entre eles estava no mais alto nível do amor de Krishna. Algumas dessas conversas estão descritas, mas a maioria delas não pôde ser descrita. No Chaitanya Charitamrita isto foi comparado a exame metalúrgico. Os metais comparados são discutidos na seguinte seqüência: primeiro cobre, depois bronze, depois prata, ouro, e por último pedra filosofal. As discussões preliminares entre o Senhor Chaitanya e Ramananda Raya são considerados como cobre, e as discussões mais elevadas são consideradas como ouro. A quinta dimensão das discussões deles, todavia, é considerada como a pedra filosofal. Se alguém está ávido para alcançar o entendimento mais elevado, deve começar com uma inquisição dentro das diferenças entre cobre e bronze, depois prata e ouro e assim por diante.

No dia seguinte o Senhor Chaitanya pediu que Ramananda Raya permitisse que Ele voltasse para Jagannatha Puri. "Nós podemos passar o resto de nossas vidas em Jagannatha Puri e passar nosso tempo a discutir Krishna". O Senhor Chaitanya então abraçou Ramananda Raya e o mandou de volta para sua casa. Na manhã o Senhor começou Sua jornada. Ele encontrou Ramananda Raya no templo de Hanuman na margem do rio. Depois de visitar o templo de Hanuman, Ele partiu. Enquanto o Senhor Chaitanya permaneceu em Karpura, todos os tipos de pessoas se encontraram com Ele, e pela graça Dele todos se tornaram um devoto do Supremo Senhor.

Depois da partida do Senhor Chaitanya, Ramananda Raya ficou dominado devido à sua separação do Senhor, e imediatamente ele decidiu se aposentar do serviço e encontrar o Senhor novamente em Jagannatha Puri. As discussões entre Ramananda Raya e o Senhor Chaitanya tratam da forma mais concentrada de serviço devocional. Por ouvir estas discussões pode-se entender os passatempos de Sri Radha e Krishna e assim também o papel confidencial representado pelo Senhor Chaitanya. Se alguém for afortunado o bastante para ter fé nestas discussões, pode entrar na associação transcendental de Radha e Krishna.

      

          

Todas as Glórias a Sri Guru e Sri Gauranga

Nitai Gaura Hari Bol

Todas as glórias à Sua Divina Graça Visvavarenya Om Vishnupada Paramahamsa Parivrajakacarya Ashttotara-shata Sri Srimad Bhaktivedanta Swami Maharaj Srila Prabhupada Thakur Mahashaya, aquele que escancarou as Portas do Tesouro Sublime de Krishna Prema de Sriman Mahaprabhu para todos no mundo inteiro, aquele que nos concedeu o Néctar Divino do Magnífico Abrigo aos pés de lótus dos Devotos Puros de Sriman Mahaprabhu, como nosso amado Srila Guru Maharaj Prabhupada

 

 

Nitai Gaura Hari Bol

 

 

 

 

 

     

Param Vijayate Sri Krishna Sankirtanam

     

 

 

 

Pela Divina Graça de Srila Prabhupada, Srila Guru Maharaj Prabhupada e todos os nossos Mestres Divinos da Família do Senhor Chaitanya Mahaprabhu

Insignificante Digitador
Visvavandya Dasa
(Guerreiro do Senhor Chaitanya pela Graça Divina de Prabhupada, Guru Maharaj Prabhupada, e meu amado Irmão Sri Srimad Avadhuta Maharaj)

Fim da Tradução:
São Paulo, domingo, 19 de dezembro de 2021

     

Param Vijayate Sri Krishna Sankirtanam

     

     

       

Índice do Bhagavad-gita

Índice de Livros

     

Desde 18/julho/2000

(Última Edição: 19-dez-2021 )

home